Uma pesquisa no buscador Google com a pergunta, em inglês, “o Facebook está nos escutando?” dá mais de 70 milhões de resultados e diversos tutoriais sobre desligar microfones e evitar vigilância. Quando a pergunta muda para “o Google está nos escutando?”, 58 milhões de resultados. Os números mostram uma das maiores inquietações de usuários de internet mundo afora: a sensação de que as maiores empresas de tecnologia do planeta estão bisbilhotando nossas conversas e empurrando propaganda com base no que falamos com amigos e parentes.
A pesquisa no Google também dá como resultado uma infindável série de relatos de pessoas que afirmam que nunca pesquisaram, curtiram ou visitaram páginas relacionadas a um assunto e, após conversar com alguém sobre o tema, começaram a ser bombardeadas com publicidade. O site especializado em publicidade Brainstorm9 até criou um termo para classificar a suposta audição do Facebook, o Cumbucagate — um “escândalo” que teria acontecido após um dos apresentadores do podcast Braincast ter recebido propagandas de cumbucas no Instagram (plataforma que pertence ao Facebook) após falar sobre cumbucas em sua casa.
Afinal, o aplicativo do Facebook e os sistemas operacionais do Google estão nos ouvindo? Ou é apenas lenda urbana?
Google e Facebook têm estimados 50% de todo o mercado de publicidade digital no mundo, com nenhum outro player passando de 5% da fatia de mercado. Em um universo onde a informação sobre o usuário é diretamente ligada à capacidade de direcionar a publicidade correta, e faturar em cima disso, converter as conversas das pessoas em informação publicitária de maneira bem sucedida seria extremamente lucrativo.
Mas nos escutar exigiria um pressuposto tecnológico: a existência de capacidade técnica para ouvir, interpretar, filtrar palavras-chave, classificar e enviar as conversas pela rede (o que inclui usar o pacote de dados de celular ou a rede Wi-Fi). Tudo isso com as cerca de 2 bilhões de pessoas que compõem a plataforma do Facebook ou os 2 bilhões que têm o sistema operacional Android, do Google. O algoritmo de audição ainda teria de entender português, uma língua falada por não mais de 300 de milhões de pessoas.
Fatemeh Khatibloo, analista da companhia de pesquisas digitais Forrester, uma das mais respeitadas dos Estados Unidos, realizou um estudo sobre o caso depois de ouvir de mais de 20 colegas que conversas feitas na vida real — em inglês — aparentavam gerar anúncios no Facebook. A conclusão certamente não é a esperada dos adeptos de teorias conspiratórias. “O processo de filtrar linguagem natural já é difícil na melhor das circunstâncias; adicionando limitações de dados e barulho de fundo, isso se torna material para ficção científica”, escreveu ela em artigo na revista Forbes.
Khatibloo levanta outro empecilho para que aplicativos e aparelhos nos ouçam secretamente. Cerca de 24% da população adulta americana já baixou um bloqueador de propaganda em seus navegadores de internet e a descoberta de escutas ilegais colocaria o mercado de publicidade digital em risco, segundo Khatibloo: “O ambiente de marketing digital só pode aguentar um determinado número de violações de privacidade antes de entrar em colapso”.