Drogas, sementes, números de cartões roubados, informações de celebridades… E até assassinatos. Tudo isso à venda on-line –mas bem longe da “internet de superfície”.
Estudiosos da vida digital ainda se surpreendem com os desdobramentos da “deep web” e de seu lado mais sombrio, a “dark web” (veja mais abaixo).
“Monitoramos o setor há dez anos e algumas coisas se mantêm: o tráfico de drogas é sempre a transação mais comum, diz Fernando Mêrces, pesquisador da empresa de segurança Trend Micro.
Mas o último relatório da companhia, publicado em junho, observou ofertas novas: assassinatos (US$ 45 mil), estupros (US$ 7.000) e até surras para deixar uma pessoa paralisada (US$ 30 mil).
“Também soubemos de um site brasileiro que oferecia assassinatos por R$ 2.000 –mas era falso, ao contrário dos americanos”, diz Mêrces.
Segundo ele, os crimes eletrônicos no Brasil ainda acontecem mais na internet tradicional, como as redes sociais.
O estudo da Trend Micro mostrou que o português é o sétimo idioma da “deep web”, usado em 1,9% das transações –bem atrás dos líderes, inglês (62,4% ) e russo (6,6%).
Outro levantamento, sobre o uso de drogas, publicado neste ano, colocou o Brasil no 22º lugar entre 23 países no volume de compras de entorpecentes na internet “profunda”.
O arquiteto João (nome fictício), 30, chegou a comprar maconha no Silk Road, mais famoso mercado da “deep web”, fechado em 2013 –seu fundador, Ross Ulbricht, foi condenado em maio à prisão perpétua nos EUA.
“Às vezes a entrega demorava ou era apreendida, mas alguns vendedores até ressarciam a compra”, diz. Com o fechamento do site, ele parou de usar a “deep web”, por medo da falta de credibilidade.
VAQUINHAS VIRTUAIS
A Folha acessou, pelo navegador Tor, o site Agora, um dos substitutos do Silk Road.
Há poucas referências ao Brasil na plataforma. Um vendedor holandês de anfetaminas coloca o país em uma lista de destinos para os quais a droga é enviada pelo correio, sem garantias de devolução de dinheiro em caso de apreensão da encomenda.
Mas pode-se achar ofertas de redes virtuais privadas, usadas em ataques eletrônicos, da cidade de São Paulo. Hackers brasileiros têm se aproveitado do anonimato para os crimes eletrônicos da internet “de superfície”, principalmente fraudes bancárias.
“Como aqui não há cultura de desenvolvimento de ferramentas, fraudadores também têm unido fundos para comprar softwares”, afirma Domingo Montanaro, diretor de inteligência da NS Prevention.
Segundo ele, essa espécie de “crowdfunding” é outro fenômeno recente da “deep web”; o site DeepDotWeb, especializado no comércio ilegal da internet, chegou a divulgar que estava em curso um financiamento coletivo para um site de pedofilia.
Para o presidente do Instituto Brasileiro de Direito Digital, Frederico Meinberg Ceroy, o maior problema da “deep web” é a apuração dos crimes. “As transações não são rastreáveis, como na internet tradicional; a investigação depende de agentes comprarem produtos para tentar ligar o criminoso ao envio”, diz.
*
OS MAIS VENDIDOS NA ‘DEEP WEB’
Maconha: 31,6%
Medicamentos: 21,1%
MDMA: 10,5%
LSD, Metanfetamina, Cogumelos, Heroína, Sementes e Videogames: 5,3% (cada um)
Fonte: relatório ‘Below the Surface: Exploring the Deep Web’, da empresa Trend Micro.
*
O QUE É A ‘DEEP WEB’
É uma parte da internet não detectada por buscadores como o Google, porque não tem links direcionados a ela; também pode ‘esconder’ intencionalmente sites que preservam o anonimato dos participantes –a “dark web”. Elas não são acessadas por navegadores tradicionais.
Folha de S. Paulo