Cientistas do Japão identificam proteína envolvida no crescimento do tumor de mama triplo negativo, conhecido por se espalhar pelo corpo das pacientes. O resultado poderá ajudar na criação de medicamentos mais eficazes
O câncer de mama triplo negativo é um dos mais difíceis de se tratar. Falta um biomarcador, ou seja, um alvo que facilite o desenvolvimento e a ação de medicamentos. Dessa forma, as células doentes se espalham pelo corpo com mais facilidade. Uma pesquisa publicada na última edição da revista Science Signaling lança esperança para o combate mais eficaz dessa doença. Pesquisadores japoneses identificaram uma proteína ligada ao crescimento dessas células cancerígenas. Ao ser desativada, o tamanho dos tumores diminuiu.
Por enquanto, o efeito foi observado em ratos. Se confirmado em humanos, poderá resultar em medicamentos com ações específicas contra esse carcinoma. “Como não há marcadores padrões, não existem fármacos de direcionamento molecular para tratar essa malignidade altamente agressiva. Além disso, o câncer de mama triplo negativo frequentemente se espalha para outros órgãos, e esse potencial altamente metastático é uma das razões pelas quais são necessárias terapias específicas”, detalha ao Correio Mitsuyasu Kato, um dos autores do estudo e pesquisador da Universidade de Tsukuba, no Japão.
No experimento, os cientistas induziram o câncer de mama triplo negativo em ratos. Ao observar as células dos animais, descobriram um gene, o MAFK, que induz a produção da proteína chamada glicoproteína nmb (GPNMB). A GPNMB torna as células cancerígenas mais fortes, num processo chamado transição epitelial mesenquimal (EMT, pela sigla em inglês). “O EMT é responsável por tornar as células cancerígenas mais agressivas e promove o crescimento diferenciado do tumor, em que as células cancerosas ganham propriedades migratórias e invasivas, o que contribui também para a metástase”, explica Kato.
Após descobrir a ligação do MAFK com a GPNMB, os pesquisadores resolveram silenciar o gene nos ratos. Depois da intervenção, os tumores reduziram consideravelmente de tamanho.
Segundo a equipe, os resultados mostram como o gene e a proteína podem se tornar potenciais alvos para a criação de medicamentos mais eficazes no tratamento do câncer de mama triplo negativo. “Acreditamos que, com esses dados, possa ser possível criar uma abordagem viável de terapias para combater esse câncer agressivo e, dessa forma, interferir em seu desenvolvimento. Já estamos pesquisando moléculas que possam agir com esse efeito, que se encaixem nesse objetivo farmacológico”, adianta Mitsuyasu Kato.
Motivação científica
Daniele Assad, médico no Centro de Oncologia do Hospital Sírio-Libanês, unidade de Brasília, diz que o estudo japonês se soma a outras iniciativas científicas de busca por alvos moleculares para tratar o câncer de mama triplo negativo. Os resultados, porém, são bem iniciais, avalia a oncologista. “É uma descoberta que pode, sim, ajudar nesse objetivo, assim como outros trabalhos nessa linha, mas ainda é a ponta do iceberg. É uma investigação que chamamos de modelo xenográfico, feito em animais. Uma pesquisa maior ainda é necessária, com testes em mais animais e também em humanos”, destaca.
A oncologista acredita que outros obstáculos surgirão em um possível desenvolvimento do remédio. “O desafio será desenvolver um medicamento que possa bloquear o efeito dessa proteína. Nos ratos, eles conseguiram isso silenciando o gene envolvido, mas essa estratégia não pode ser usada em humanos. É necessário encontrar um medicamento que possa bloquear o efeito dessa proteína, que também está presente em células normais, o que torna esse processo mais complicado”, explica.
Os autores darão continuidade à pesquisa e concordam que muito ainda precisa ser estudado até que os achados cheguem à clínica. “Existem alguns mecanismos reguladores conhecidos como GPNMB, especialmente nos cancros, que consideramos valer a pena examinar. Planejamos investigar suas vias de sinalização a fim de encontrar novos candidatos para terapias moleculares direcionadas para esse tipo de tumor”, adianta Mitsuyasu Kato.
Palavra de especialista
Diagnóstico também é desafio
“Hoje, para o tratamento do câncer de mama triplo negativo, o principal recurso utilizado é a quimioterapia. A imunoterapia também vem sendo testada, só que os experimentos iniciais ainda não trouxeram resultados positivos. Os especialistas que conseguirem encontrar medicamentos mais eficazes farão um grande avanço, mas também não podemos deixar de ressaltar o problema da detecção dessa doença. Esse tipo de câncer é muito pouco rastreado, pela dificuldade de ser identificado. A mamografia nem sempre consegue apontar a existência dele. É comum casos de pacientes com essa doença que são diagnosticados apenas quando encontram o nódulo e vão ao ginecologista para saber do que se trata. Encontrar maneiras de identificar o câncer de mama triplo negativo com mais eficácia também é um grande desafio que temos pela frente.”
Fonte: Correio Braziliense