A professora do ensino infantil Taris de Souza, 38 anos, e o auxiliar de produção Frank Teixeira, 27, terão uma menina, Antonella, em setembro. Mas quem está “grávido” é ele. Tirando esse fator, o que será lido abaixo é a história de uma família que vive em Itapira, a 166 quilômetros de São Paulo, e que vai ao encontro de tantas outras que se amam e se respeitam.
Taris conheceu Frank na academia, há seis anos, quando ele ainda se identificava com o gênero feminino, usava cabelão e sainha, conforme descreve sua parceira. Até então, a professora nunca havia se relacionado com uma mulher, mas “foi uma coisa sem explicação”, ela afirma.
Após dois anos de relacionamento, Frank decidiu passar pela transição de gênero. Começou a tomar hormônio masculino e marcou a mastectomia. Mas não levou adiante o procedimento. Teve medo da cirurgia.
Taris diz que apesar do choque inicial da família dele com a transição, para ela, foi um processo normal. “Só me preocupava com a sua saúde, por causa do hormônio”, conta.
Desejo pela maternidade
O desejo dela pela maternidade começou cedo. Taris perdeu a mãe aos 5 anos, vítima de um aneurisma cerebral, e sempre quis ter uma criança. A vontade aumentou após conhecer Frank, mas dada a configuração familiar, pensou ser impossível.
Foi quando o casal buscou informações para entrar na fila da adoção, mas desistiu: o Frank ficou receoso de a criança querer conhecer os pais biológicos e não ter estrutura emocional para lidar com a situação. Em nenhum momento, frisa o casal, houve medo da rejeição pela sua transexualidade.
O próximo passo: Frank passou meses pesquisando sobre inseminação caseira. A ideia era que Taris passasse pelo procedimento. Na sua primeira tentativa, o ginecologista dela quem ajudou, mas foi incômodo, doeu, sangrou. Não quis mais. Frank então optou por ele mesmo fazer o processo em casa. O doador passou a ir à residência da dupla. Ele depositava o material naqueles potes utilizados em exame de urina e Frank colocava nela com a ajuda de uma seringa. Foram 11 tentativas, entre agosto e novembro:
Chegamos a repetir o processo quatro vezes em um mês para ‘encurralar’ os óvulos de todas as formas, mas não dava certo e isso começou a me desgastar emocionalmente. Me sentia inútil, então desisti
Ao perceber o sofrimento da mulher — e sem nem acreditar muito que poderia dar certo — Frank testou nele mesmo a inseminação.
Havia seis meses ele não tomava suas ampolas de testosterona, então menstruava normalmente. E na primeira e única tentativa, deu certo. Só faltava contar à Taris.
“Fiquei sem reação e preocupada com o psicólogo dele. Mas o Frank justificou que queria realizar o nosso maior sonho, e só isso importava. Chorei, nos abraçamos e fomos fazer os exames, porque ele só me contou depois de três semanas”, ri, agora tranquila.
Ansioso e com medo do parto, Frank teve a mesma preocupação da mulher quanto ao seu corpo, mas minimiza a situação.
“São apenas nove meses, e passa rápido. Voltarei a tomar hormônio depois que parar de amamentar. Essa não é uma grande questão para mim”, explica Frank. Na reta final da gravidez, ele diz quase não sair de casa tampouco se olha no espelho. Afirma não se sentir confortável com a aparência.
“Papai do ano”
No posto de saúde onde comprovou a gravidez, o casal foi atendido por uma médica “de 20 e poucos anos”. Ela riu da situação mas tratou os dois com respeito. O pré-natal é feito pelo ginecologista de Taris, também sem olhares constrangedores, garantem. A família do Frank já “está apaixonada” por Antonella.
A empatia se repete no trabalho dos dois: na escola municipal onde Taris trabalhava como diretora, as mães das crianças e algumas professoras levaram presentes para a menina. Na creche atual, onde atua como professora, todas as colegas de trabalho perguntam a todo instante da criança. Na empresa onde Frank atua, lhe conferiram o título de papai do ano.
Talvez pela aceitação, a dupla diz não estar preocupada com mais explicações para Antonella sobre a configuração familiar. Ele avisa:
Quando ela estiver em uma idade em que entenderá mais as coisas, vamos explicar. Mas o tempo passa e as pessoas vão ficando mais evoluídas. Ainda assim, estamos preparados para o preconceito
O parto
Antonella, que significa “digna de apreço”, deve nascer de cesariana, no dia 19 de setembro. Segundo o casal, ela já é ansiosamente aguardada pelos 74,3 mil habitantes de Itapira.
“Um monte de gente nos procura para saber como fizemos, querendo orientações. Antonella é esperada por todo mundo”, conta Taris.
Na certidão, a menina terá o nome de duas mulheres, até Frank mudar seus documentos. Ela também será amamentada pelo casal.
“O médico acha impossível que eu não consiga amamentar com tanto amor envolvido”, diz Taris.
Fonte: UOL
Créditos: Universa