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Igreja católica procura exorcistas no Brasil: SAIBA MAIS

De acordo com o Código de Direito Canônico, o conjunto de leis que regula a Igreja Católica, um padre precisa se destacar em quatro áreas para poder expulsar Satã do corpo dos desavisados

Padres especializados em expulsar o diabo dos fiéis estão em falta no País. Mas o que faz um exorcista católico? Por que há tão poucos em atividade?

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Curitiba, maio de 2014. Deveria ter sido um dia de gravação como outro qualquer. O padre Reginaldo Manzotti carregava o ostensório com o Santíssimo Sacramento pelo auditório do programa Evangelizar é Preciso quando percebeu algo errado com uma menina de uns 15 anos. Terminada a benção, pediu que a levassem até a capela.

Lá, longe das câmeras, deparou-se com o demônio. “A menina tinha uma força descomunal e, apesar de sermos quatro pessoas, não conseguimos acalmá-la”, diz. A certa altura, a garota virou-se para o padre e, com uma voz grave, ordenou: “Pare com essas deprecações”. Na mesma hora, o sacerdote se deu conta de que estava lidando com “algo maior do que imaginava”. Não bastasse, a possessa foi além: “Você não é exorcista! Não tem poder sobre mim!”.

E, de fato, não tinha. Aturdido, padre Manzotti pediu uma trégua a Lúcifer e encaminhou a garota a um exorcista profissional, o padre Jorge Morkis, hoje aposentado, que libertou a menina do coisa-ruim. “Com o tempo, apuramos que, sem dinheiro, ela tinha feito um pacto para ir ao show do Justin Bieber”, diz Manzotti. O trabalho foi tão bem-feito que, hoje em dia, a menina é coroinha na capital paranaense.

Padres exorcistas, como Morkis, são raros no Brasil. Segundo dados da Associação Internacional de Exorcistas, apenas sete dos mais de 300 membros são brasileiros. A arquidiocese de São Paulo, a maior do País, por exemplo, não tem nenhum. “O ideal é que cada diocese tivesse o seu, mas há déficit de exorcistas no Brasil”, diz Dom Pedro Cipollini, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que lançou no ano passado o documento Exorcismos: Reflexões Teológicas e Orientações Pastorais. O Brasil tem 215 dioceses e estima-se que existam apenas 30 especialistas em possessões por aqui. “A falta de padres é um problema crônico no Brasil. Por isso, o exorcismo está longe de ser uma prioridade”, diz o sociólogo Francisco Borba Ribeiro Neto, coordenador do Núcleo Fé e Cultura da PUC-SP.

Quem é que pode?

De acordo com o Código de Direito Canônico, o conjunto de leis que regula a Igreja Católica, um padre precisa se destacar em quatro áreas para poder expulsar Satã do corpo dos desavisados. É preciso ter piedade, integridade, prudência e sabedoria (doutorado em teologia, por exemplo, é desejável). Outras virtudes bem-vindas são coragem, paciência e tenacidade. Na prática, um padre só se torna exorcista se for indicado pelo seu bispo – freiras e leigos não podem ser ordenados, por exemplo.

De acordo com a Igreja Católica, exorcismos não podem ser agendados ou registrados em vídeo. Também é proibido cobrar por eles

Mas, se o processo parece ser simples, por que há tão poucos exorcistas na Igreja Católica? “Possessões demoníacas existem, mas são raras. O que vemos por aí é puro sensacionalismo”, diz Dom Pedro Cipollini. Ao contrário do que acontece nas igrejas neopentecostais, as sessões de expurgo na tradição católica são encaradas como última opção de tratamento – antes de começar, por exemplo, é preciso eliminar a possibilidade de doenças mentais ou físicas. O processo pode demorar vários meses – um dos trabalhos do padre Armoth durou 22 anos – e os acontecimentos não costumam ser espetaculares, como é comum encontrar nos canais de TV madrugada adentro. Por isso, é difícil encontrar um exorcista católico por aí.

As sessões de descarrego neopentecostais, por outro lado, têm um roteiro midiático. Um obreiro escolhe um membro da assembleia supostamente possuído por um espírito e o leva até o púlpito. Lá, diante das câmeras de TV, o pastor começa a interrogá-lo. Palavras de ordem são comuns: “Sai desse corpo que não te pertence!” ou “Está amarrado em nome de Jesus!”. A vítima, então, é agarrada pelos braços ou jogada ao chão. Ao final de tudo, o capiroto é derrotado. “O rito da expulsão de espíritos malignos virou o ápice da pregação de alguns líderes neopentecostais”, diz Luiz Henrique Rodrigues Paiva, professor da Universidade Católica de Pernambuco. “Em vez de levar a palavra de Deus aos fiéis, esses pastores se tornaram reféns de uma teologia construída em função do Diabo”, opina.

A cartilha da CNBB diz que, uma vez comprovada a autenticidade da possessão e autorizado o exorcismo pelo bispo da diocese, o ritual não pode ser alvo de publicidade, muito menos transformado em espetáculo. Divulgá-lo com antecedência? Fora de cogitação. Gravar, filmar ou registrar o ato? Nem pensar. Cobrar pelo trabalho? Proibidíssimo. Quanto mais discreto, melhor. “Se aparecer algum padre dizendo que faz exorcismo na frente dos fiéis, com direito a plateia e filmagem, pode ter certeza: não é um dos nossos”, diz o padre João Cláudio do Nascimento, reitor da capela de Nossa Senhora de Fátima, em Niterói.

Padre João Cláudio sabe do que fala. Ele foi um dos 280 participantes da 11ª edição do curso Exorcismo e Oração de Libertação, realizado em abril de 2016, em Roma. O curso é anual, custa 300 euros e inclui palestras como Identificando a ação extraordinária do demônio ou O aspecto psicológico da manipulação mental. A ideia é combater a carência de exorcistas católicos no mundo. Qualquer pessoa pode seque inscrever: membros da Igreja e leigos, como historiadores, psicólogos e jornalistas. As aulas, porém, são todas teóricas.

Fonte: Super interessante
Créditos: Super interessante