O volume de doações de pessoas físicas recebidas por partidos como o Novo e Podemos causou incômodo em siglas mais tradicionais – e, proporcionalmente, mais dependentes de recursos públicos. A avaliação é de que, com o fim das doações empresariais, os partidos tradicionais ficaram “distantes” de parte do bolo que tem alimentado novos candidatos.
O líder do PL na Câmara, deputado Wellington Roberto (PB), não concorda com essa medida. “Não é justo ter candidato que ganha bolsa durante um ano para disputar eleição e outro que está limitado ao dinheiro do fundo eleitoral no período da disputa”, afirmou Wellington.
As legendas tradicionais ameaçam com a votação de um projeto já apelidado de “anti-Novo“. A proposta, ainda em discussão, pode limitar as doações feitas a até dez salários mínimos por pessoa.
Na terça-feira, um grupo de líderes partidários liderado pelo Centrão (bloco político informal composto por DEM, PP, PL, Republicanos e Solidariedade) vai debater três textos preparados pela assessoria jurídica do Solidariedade, com o objetivo de refazer as regras para a eleição de 2022. Entre as propostas, está o limite de doações de pessoas físicas a partidos fora do período eleitoral.
A maioria defende um teto de dez salários mínimos, mas há outros que querem doações de até R$ 50 mil. Em princípio, não há limites para as contribuições como pessoa física, mas os partidos só podem transferir para campanhas o equivalente a 10% dos rendimentos brutos de cada doador.
Os líderes também vão debater o fim das “bolsas” para novos políticos. Os deputados querem acabar ou limitar o repasse de recursos de partidos e movimentos políticos que propõem uma “renovação da política” a possíveis candidatos, como ocorreu na última disputa.
Por iniciativa de um grupo de empresários – entre eles, o apresentador Luciano Huck -, o movimento RenovaBr, por exemplo, concedeu bolsas de estudo entre R$ 5 mil e R$ 12 mil mensais em um programa de jovens lideranças para disputar a eleição do ano passado. “Essa é uma distorção que tem de acabar”, afirmou o presidente do Solidariedade, Paulinho da Força (SP).
‘Ricos’
Na semana passada, num discurso feito na tribuna da Câmara, o líder do Novo, deputado Marcel Van Hattem (RS), criticou o atual modelo baseado na distribuição de recursos públicos por meio do fundo partidário e do fundo eleitoral.
O parlamentar disse que os seus gastos de campanha foram bancados por doações de pessoas físicas e que cada voto conquistado teve um custo final de R$ 2 – ante R$ 10, em média, no caso dos candidatos que fizeram sua campanha baseados apenas no fundo eleitoral.
“E somos nós, os deputados do Novo, os que gastam milhões, os candidatos dos ricos? Pelo contrário. A distorção se dá na divisão do fundo partidário também. Eu sei que muitos deputados aqui concordam com isso porque foram eleitos, apesar de o fundo partidário eleitoral ter ido para líderes ou para aqueles que tinham mais acesso ao poder”, afirmou o líder do Novo.
O ataque levou parte do plenário a vaiar o discurso e irritou líderes do Centrão. “É fácil fazer demagogia quando tem empresário doando milhões”, afirmou Paulinho da Força.
No ano passado, o Novo, sozinho, arrecadou R$ 17 milhões por meio de doações diretas de pessoas físicas, R$ 4,6 milhões a mais do que a soma arrecadada pelos cinco partidos que formam o núcleo do Centrão.
Apelos
Paralelamente à proposta, os caciques do Centrão pediram ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que exclua os deputados do Novo de relatorias importantes para “diminuir o cartaz” do grupo. Maia ainda não respondeu aos apelos dos aliados.
Na avaliação do cientista político Marco Antonio Teixeira, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), as contribuições feitas por pessoas físicas têm como principal componente a identificação entre o ideário dos partidos e a ideologia dos doadores.
“São grupos ou pessoas que querem ter participação ativa na política e buscam espaço ou querem defender suas propostas”, disse Teixeira. “Nos dois extremos, o PT e o Novo se parecem. Os doadores se identificam com as causas e as defesas das bandeiras de cada legenda.”
O professor observou que, embora os escândalos de corrupção da última década tenham envolvido atividades partidárias, não se deve incorrer num discurso que criminalize as siglas. “Os partidos são cruciais e fundamentais à democracia e têm papel na representação social.”
O advogado Henrique Neves, ex-ministro do TSE, disse que deveria haver uma limitação às contribuições, tanto aos partidos quanto diretamente às campanhas, de forma a tornar a participação mais homogênea, independentemente da capacidade financeira do doador. “No quadro atual, as pessoas que auferem altos rendimentos podem doar muito dinheiro e a maioria da população, com baixa renda, não pode realizar doação numericamente significativa”, afirmou ele.
Fonte: Terra
Créditos: Terra