Michel Temer teve uma de suas piores semanas desde que assumiu o Planalto por causa dos primeiros vazamentos da Odebrecht. Perdeu um auxiliar importante (José Yunes), não saiu das manchetes negativas nem da defensiva. Nem a cerimônia de Natal no Planalto rendeu as imagens positivas que o Governo tanto precisava. Mas, num ponto crucial, apoio de deputados e senadores, Temer se diferencia de sua antecessora em matéria de crise. Enquanto o presidente amargava momentos ruins, sua base de apoio no Legislativo corria para fechar o ano mais produtiva do que nunca. Em três dias, o Congresso Nacional brasileiro imprimiu um ritmo de votação quase cinco vezes maior do que costumou fazer em 2016. Na semana que passou, os deputados e senadores votaram 62 projetos de lei, vetos presidenciais, requerimentos e propostas de emenda constitucional. Uma média de 20,6 projetos por dia de trabalho. Em média, nos outros dias deste ano os parlamentares votavam 4,3 propostas – foram 541 ao todo. As votações ocorrem nas sessões ordinárias e extraordinárias, geralmente, de terça a quinta-feira. Mas houve longos períodos em que nem a Câmara nem o Senado analisaram um mísero requerimento sequer.
Entre os dias 14 e 29 de setembro, por exemplo, os deputados federais não votaram absolutamente nada nas sete sessões realizadas no período. Por conta das eleições municipais eles se fizeram uma espécie de recesso branco com o objetivo de fazerem campanhas em suas bases. No Senado, a seca de votações ocorreu também em setembro, de 21 a 29, quando ocorreram cinco sessões.
A análise do processo de impeachment de Dilma Rousseff(PT) nas duas casas e a votação da cassação de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e suas consequências, como a eleição para o presidente da Câmara, colaboraram para a redução de ritmo em boa parte do ano.
Nos últimos meses, outros dois fatores interferiram na celeridade em analisar algumas propostas. O conflito institucional incentivado pelo presidente do Senado Renan Calheiros (PMDB-AL) com o Judiciário fez com que dois dias de votação fossem perdidos na Câmara Alta brasileira. Assim, para a última semana de trabalho, restaram mais de três dezenas de projetos para serem votados, entre eles a polêmica PEC 55 (ou 241 na Câmara) que criou o Teto de Gastos Públicos e será a progenitora de todas as reformas impopulares que a gestão Michel Temer quer aprovar no próximo ano.
Essa PEC, aliás, teve o rito de votação acelerado. Sua aprovação resultou nos mais duros protestos contra a gestão Temer até o momento, principalmente em Brasília e São Paulo. Apesar de ter tido um amplo apoio da Câmara e do Senado, quando foi promulgada pelos senadores, apenas nove parlamentares participaram da sessão. A marca dela foi um protesto promovido por duas parlamentares opositoras de Temer que levantaram cartazes apelidando a nova lei de PEC da Morte.
Na reta final do ano legislativo, que se encerra oficialmente só no dia 22, mas já foi antecipado pelos senadores, outros projetos polêmicos também foram aprovados pelos congressistas. Entre eles, a reforma do ensino médio, a extinção dos supersalários do funcionalismo público, a autorização para que países estrangeiros possam produzir o dinheiro brasileiro e parte da reforma política que pretende criar uma cláusula de barreira que extinguirá pequenos partidos. Todas essas proposições passaram em primeiros turnos em apenas uma das casas legislativas, ainda terão de ser analisados pela outra.
Como ainda não decretaram suas férias, os deputados ainda deverão votar na semana que vem uma das medidas de renegociação de dívidas dos Estados que podem beneficiar as três unidades da federação que estão com as contas em situação mais catastróficas, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Os senadores aprovaram essas medidas nesta semana, mas não houve acordo para votação na Câmara.
Novo comando e disputa na base
Para o próximo ano, o Congresso deverá se debruçar sobre a reforma da Previdência, que já passou pela primeira etapa da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, e sobre o projeto do abuso de autoridade. Apesar de reduzida, há uma chance de que haja uma autoconvocação do Legislativo para que a reforma comece a tramitar nos primeiros dias de 2017. O recesso, conforme a legislação, encerra-se no dia 2 de fevereiro, mas nada impede que os legisladores voltem a trabalhar antes.
Ao menos nos bastidores os parlamentares já começarão a se articular. Isso porque na primeira semana de fevereiro serão eleitas as Mesas Diretoras da Câmara e do Senado. Essa definição, aliás, será fundamental para marcar as próximas votações dos projetos de interesse do Executivo nas Casas. Na Câmara haverá um possível racha entre o Centrão e outros aliados. No Senado, a tendência é que o PMDB se mantenha no posto de presidente. Em última instância, a nova configuração do Legislativo vai marcar a continuidade ou não de uma blindagem central para o Planalto: deixar afastado qualquer risco de impeachment.
TEMER TENTA AFASTAR CRISE INSTITUCIONAL DE SEU GOVERNO
Diante da crise institucional que se intensificou nos últimos dias, com o presidente do Senado recusando-se a cumprir decisão judicial e com uma segunda decisão do Judiciário considerada como interferência no Legislativo, o presidente Michel Temer (PMDB) tem tentado atuar como um bombeiro. Nesta quinta-feira, ele se reuniu com alguns dos envolvidos nessa celeuma e pediu que todos tentassem agir mais com a razão do que com a emoção. Sua preocupação é de que o acirramento nos ânimos possa interferir na sua gestão.
O peemedebista fez ao menos três encontros que não estavam previstos em sua agenda e nem foram divulgados por sua assessoria. Nas reuniões, Temer pediu a compreensão das autoridades para a gravidade do momento. As audiências ocorreram com os ministros do Supremo Gilmar Mendes e Luiz Fux e com os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).
Na quarta-feira, Fux concedeu uma liminar determinando que o pacote anticorrupção que fora desvirtuado pelos deputados, quando o aprovaram, voltasse a tramitar na Casa. Sua decisão foi vista como uma nova fagulha no embate entre os poderes. As reações foram das mais diversas. Gilmar Mendes, o ministro do STF que mais tece comentários sobre decisão dos colegas, atacou Fux. Em um evento no Tribunal Superior Eleitoral ele disse que o Judiciário está passando por um “surto decisório”. “Estamos vivendo momentos esquisitos. Toda hora um surto decisório que não corresponde às nossas tradições”. Depois, emendou: “Não sei se é a água que estamos bebendo no tribunal ou seja lá o que for, mas estamos vivendo momentos estranhos. Temos que ter muito cuidado”.
Créditos: El País