Reforma seis por doze
Segundo qualificado servidor do Estado, a ‘reforma’ anunciada anteontem com toda pompa e circunstância pelo governador não foi uma troca de seis por meia dúzia, conforme assinalei na coluna de ontem. “Na verdade, se compararmos o que foi extinto, fundido ou remanejado com o que foi criado, veremos que não haverá apenas um acréscimo de cargos a serem preenchidos no primeiro escalão. Haverá, sobretudo, um aumento razoável de despesa com a remuneração dos ocupantes de tais cargos”, disse o funcionário em mensagem encaminhada via ‘rede social’ (que não vou dizer qual).
Para embasar sua afirmação, lembrou que cargos de direção na administração indireta (empresas, autarquias, fundações etc.) são remunerados por valores que em alguns casos não chegam à metade daqueles pagos no primeiro escalão da administração direta (secretarias de Estado). Na possivelmente extinta Fundação de Ação Comunitária (Fac), por exemplo, os diretores recebiam no máximo R$ 3.800. Já os titulares das novas secretarias executivas, duas das quais sucedâneas da Fac, ganharão R$ 7.800.
“Ou seja, Rubens, não foi uma troca de seis por meia dúzia, mas uma troca de seis por doze”, acrescenta o remetente, incorporando-se a outros leitores e colaboradores que receberam o anúncio da tal reforma como rasteira manobra diversionista, do tipo que não respeita a inteligência alheia. “A reforma não passa de remanejamento de caixinhas no organograma do Estado”, falou-me um desses críticos, para quem as medidas anunciadas em entrevista coletiva no Palácio da Redenção “passaram nitidamente a ideia de que vieram a público para fazer o povo esquecer das aijes (ações de investigação judicial eleitoral) contra o governador”.
Já o Professor Menezes produziu para a coluna o comentário que transcrevo no tópico seguinte. O texto está recheado de ironias, mas o mestre não teme retaliações contra a sua pessoa por parte de quem está poder. Primeiro, porque não depende de emprego ou aspone do Estado. Segundo, porque há muito se aposentou do magistério público estadual, no qual ingressou por mérito, aprovado que foi em primeiro lugar num concurso público de provas e títulos. Nunca na vida deveu nem deve, portanto, sequer um bom dia a qualquer político.
“Pra boi dormir”
Caro amigo, amanheci o dia com um nó apertando minha cabeça e consumindo mais alguns dos poucos neurônios que me restam, provocado pelo noticiário difundido desde ontem sobre essa reforma administrativa do Império Girassoláico. Não consegui entender como é que de repente, não mais que de repente, um governante que sucede a si próprio recebe uma iluminação que o faz compreender ou intuir uma nova forma de administrar, sem reconhecer que a sua fórmula anterior era tão ineficaz que se fez necessário substituí-la. Amanheci me perguntando se estava no mundo da lua, pois não consegui entender a lógica imperial que presidiu esses ajustes. Procurei explicações nas mais diversas fontes (não consegui link para o Exu Sete Lanças) e não encontrei explicação que se sintonizasse com a minha frequência cerebral, que, a considerar os aplausos, deve estar fora de padrão, necessitando uma recalibração que me permita captar a profundidade dos procedimentos da realeza. Enquanto isso, só me resta pensar se isto é uma história ou estória para boi dormir, mas o danado é que estamos em área urbana onde não se vê bovinos com facilidade, para lhes contar esse conto, esperando que não durmam.
Como se fosse pouco…
Faltou abordar na coluna de ontem sobre a ‘reforma’ na administração estadual um detalhe que reforçaria mais ainda o caráter pirotécnico das mudanças anunciadas: o corte de 300 cargos comissionados. Ora, se o próprio governador disse em sua coletiva que o Estado tem mais de 14 mil cargos comissionados e ele preencheu ‘apenas’ 9 mil, a eliminação desses 300 e nada seriam a mesma coisa. Ou, no máximo, como diziam antigamente lá em Bananeiras, “um risco n’água”.
Combate aos ‘debocis’
Coronel Severino, meu compadre, chama ‘debocil’ quem estoura os ouvidos e o juízo dos outros com o alto volume dos paredões. Inventor de neologismos, quando me falou do debocil logo associei a decibel, unidade que mede a intensidade do som. “Nada a ver. Debocil é a fusão do demente com o boçal e imbecil”, explicou-me. Ao ouvir aquilo, de início lamentei o que seria uma ‘crueldade’ da parte dele.
Mas a sua reação, no ato, na lata, deixou-me sem reação. “Você diz isso porque não perdeu mais da metade da audição, como eu perdi, no tempo em que fui, também, um debocil”, contou. Para meu espanto, revelou que na juventude também ‘curtia’ ir à praia, praça, bares ou calçadinha e lá “se amostrar” exibindo a potência da usina de barulho que instalara na sua Belina.
“Meu porta-malas era todo ocupado com caixas de som e twitters, fora os que havia no interior das portas e no painel”, recordou, acrescentando que depois de três anos perturbando por aí com seu micro trio elétrico começou a perceber dificuldades para conversar sem gritar. Foi ao médico, fez os testes e o resultado… Perda auditiva considerável e irrecuperável!
Mas essa história do Coronel é um convite à coluna de amanhã. Cuidarei da campanha de combate à poluição sonora que o Ministério Público Estadual vai liderar em toda a Paraíba, com apoio das Polícias Militar, Civil e órgãos de proteção ambiental. Uma elogiável iniciativa que merece registro e toda a divulgação possível.
Que reforma é essa?
É coisa para acompanhar, conferir e torcer para que dê certo, e não comemorar antecipadamente, bajulatoriamente, a reforma administrativa anunciada ontem pelo governador Ricardo Coutinho para o seu próximo mandato. Até por que não há como garantir que os serviços públicos vão melhorar simplesmente porque um governante resolveu extinguir ou fundir órgãos. Ainda mais quando a gente sabe que alguns desses órgãos perderam técnicos, verbas, projetos, escritórios e até o sentido, graças ao esvaziamento, desprestígio ou sucateamento que experimentaram no atual governo. Caso típico da Emater e da Emepa, ‘empresas’ de assistência e extensão rural e de pesquisa agropecuária com as quais antigamente o Estado dava suporte técnico ao homem do campo e desenvolvia projetos que melhoravam o rendimento e a resistência às pragas de determinadas culturas agrícolas.
Caso também da Fac, a Fundação de Ação Comunitária que no início do atual governo distribuía mais de 120 mil litros de leite a famílias pobres da Paraíba e hoje entrega menos de 20 mil. E não me venha com a história de que o programa do leite desmantelou-se porque a Polícia Federal descobriu desvios que viriam de gestões passadas. O desmantelo agravou-se quando o governo cortou míseros R$ 100 que fiscais recebiam por mês para atestar a qualidade e a quantidade do que seria fornecido.Igual fez com a defesa agropecuária, onde ocorreu a suspensão da merreca que recebiam os fiscais do serviço, algo que chegou a comprometer seriamente a sanidade do rebanho bovino no mesmo período. Nunca antes na história da Pequenina o seu gado ficara tão vulnerável à aftosa. Desmantelados ficaram ainda os parques de exposição de animais, que sob o atual governo não conseguiram fazer uma única feira para movimentar o comércio e o melhoramento genético do segmento produtivo que acolhiam em suas dependências.
Agora, olhando para o conjunto da obra divulgada, não há como resistir a um cotejo entre fusões e extinções de órgãos velhos com a criação de órgãos novos. Se entendi direito, da fusão das secretarias de Planejamento e Finanças surgirão três novas secretarias executivas: Planejamento e Gestão, Orçamento Democrático e Finanças. Sei não, mas me parece aquela troca do seis por meia dúzia. Na mesma linha, é o que penso da extinção da Fac, que reencarnará no papel de duas novas secretarias executivas(Desenvolvimento Humano e Trabalho e Segurança Alimentar e Economia Solidária, ambas na Secretaria de Desenvolvimento Humano).Outra: muda alguma coisa acabar com a Fundação Casa do Estudante para transformá-la em ‘Diretoria Executiva de Desenvolvimento Estudantil’ na Secretaria de Educação, que, por sua vez, vai parir mais duas secretarias executivas (Gestão Pedagógica e Logística)?
Que economia é essa?
O governo diz que pretende economizar R$ 25,6 milhões por ano com as mudanças anunciadas nessa segunda. Sinceramente, dá pra acreditar que uma reforma assim vai economizar essa fortunapara o contribuinte se, pelo visto, mais cria do que extingue e funde? Sem contar que em alguns casos a compreensão do governo sobre processo de fusão talvez signifique remanejar ou juntar um monte de órgãos sob uma mesma secretaria. Porque é isso o que vai acontecer com a ‘fusão’ das secretarias de Infraestrutura e de Recursos Hídricos, Meio Ambiente, Ciência e Tecnologia. Sob a nova denominação – e apenas para efeito de vínculo formal – estarão autarquias e empresas responsáveis por obras (DER, Suplan e Cehap) e serviços (Cagepa, PBGás e Docas), entre outras. E qual a economia virá, também por exemplo, da transformação de um Escritório de Representação como o de Brasília em uma nova secretaria, a de ‘Representação Institucional’, e de uma secretaria executiva de Articulação Política em uma secretaria de verdade (de Estado, como dizem), com o mesmo nome e a mesma finalidade? Quer saber? Isso leva o maior jeito de pirotecnia, de perfumaria ou, como diz um amigo meu lá do Vale do Piancó, “não passa de coreografia”.
É pra esquecer as aijes?
Pois bem, tirando a criação da Secretaria de Agricultura Familiar e Desenvolvimento do Semiárido, em substituição a um balcão de empregos e aspones chamado Secretaria de Interiorização, o resto dessa reforma ainda carece de uma justificativa mais convincente. Não ‘comprei’ ainda a ideia de que a mudança veio realmente para mudar e mudar para melhor, que é o mais importante. E se a mudança para melhor não acontecer, muitos poderão inclusive autenticar como procedentes as suspeitas de que o anúncio de ontem foi pensado e executado para preencher um vácuo no noticiário político e fazer o povo esquecer um pouco que desde a semana passada vive sob um governo ameaçado de não terminar.
A ameaça está contida em uma, algumas ou em todas as 14 ações de investigação judicial eleitoral (aijes) ajuizadas contra o governador, acusado de cometer abusosde poder político e econômico e diversas condutas vedadas durante a campanha que o reelegeu. Duas dessas aijes, nunca é demais lembrar, foram impetradas pelo Ministério Público Eleitoral (MPE). Que, para além da competência com que formula e instrui suas ações, não é adversário do reeleito. O MPE é, antes de tudo, um aliado do eleitor livre, independente e consciente. Vale dizer, da cidadania, da democracia, de eleições limpas e nos conformes da lei, enfim. Eleições que exigem paridade de armas entre os concorrentes. Eleições sem a instrumentalização da máquina pública para desequilibrar a disputa em favor do candidato à reeleição.
O povo quer saber?
Além do mais, que economia é essa que não corta um centavo da milionária propaganda de governo nem das mordomias da Granja Santana?