Ao rejeitar pedido da defesa do ex-presidente Lula, que pretendia barrar liminarmente os inquéritos do Ministério Público do Estado de São Paulo e do Ministério Público Federal sobre propriedades imóveis atribuídas ao petista, a ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), destacou: “O que passa a interessar, aqui, são elementos de convicção dentro de um amplo espectro investigativo incidente sobre supostos conluios, em torno de possíveis interesses escusos, de agentes públicos e empresas privadas.” “Trata-se de investigações de grande porte, envolvendo quantidade considerável de pessoas e uma multiplicidade de fatos de intrincada ramificação.”
Os promotores de São Paulo investigam o apartamento triplex do Condomínio Solaris, no Guarujá – empreendimento da Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo (Bancoop) assumido pela empreiteira OAS.
Os procuradores federais que integram a força-tarefa da Operação Lava-Jato investigam o sítio Santa Bárbara, localizado no município de Atibaia.
Os investigadores trabalham com a suspeita de que Lula seria o verdadeiro dono dos imóveis, que passaram por obras milionárias de reforma e melhorias a cargo da OAS e da Odebrecht – empreiteiras que formaram o cartel da corrupção na Petrobras e despontam como algumas das maiores doadoras ou pagadoras do Instituto Lula e da LILS Eventos e Palestras, do ex-presidente.
Os advogados de Lula negam que ele seja dono dos bens. Perante a Corte máxima, eles alegaram existência de duplicidade de investigações sobre um mesmo fato e suscitaram conflito positivo de atribuições entre o Ministério Público Federal e o Ministério Público de São Paulo. “A afirmação teórica de que bastaria identificar similitude entre dois fatos para reconhecer a duplicidade de investigações pode ser válida em determinadas situações, mas não garantem, por si, o resultado pretendido em toda e qualquer hipótese”, anotou Rosa Weber.
Compartilhamento de dados A ministra destaca que o compartilhamento de dados é um caminho dos procedimentos estadual e federal. “A investigação federal trabalha, basicamente, sob o enfoque relativo a suspeitas de corrupção ativa e passiva, no âmbito de ofensas alegadamente praticadas em desfavor da União. Note-se o importante deslocamento ocorrido; não se trata mais de investigar prejuízos sofridos pelos cooperados da Bancoop, e suas circunstâncias. O que passa a interessar, aqui, são elementos de convicção dentro de um amplo espectro investigativo incidente sobre supostos conluios, em torno de possíveis interesses escusos, de agentes públicos e empresas privadas. Se, a partir de evidências iniciais, alguma coincidência circunstancial puder ser vislumbrada, entre sujeitos e modi operandi, parece natural que isso desperte interesse mútuo. O compartilhamento de informações iniciais, portanto, não aparenta ser medida desarrazoada. O compartilhamento parece estar focado em circunstâncias que, genericamente, têm potencial para vir a dizer sobre o ‘como’, e não propriamente sobre o ‘quem’ ou sobre ‘o que’.”
A ministra argumenta, ainda que “Levando-se em conta o estágio ainda prematuro das investigações, é preciso dar sentido efetivo à possibilidade de que os dois Ministérios Públicos envolvidos estejam trabalhando a mesma realidade em perspectivas diferentes. Embora por demais óbvio, não custa lembrar que o Ministério Público Federal, atuando perante a Justiça Federal, é o dominus litis de ações penais relacionadas a crimes de competência atribuída a esta Justiça; e com o Ministério Público Estadual ocorre exatamente o mesmo, em vista dos crimes atribuídos à Justiça penal comum. Um conflito de atribuição típico entre MPF e MP estadual, a rigor, envolve também, em segundo grau, uma definição sobre competências. Vista a questão sob perspectiva temporal, do tempo do processo, conflitos de atribuições assim delineados são semelhantes à instauração prematura de conflitos de competência. Portanto, é possível recolocar o problema a partir de outra questão: no momento, diante dos dados consolidados, é possível assegurar que os fatos, sejam quais forem, estão plenamente identificados como referentes, ou relevantes em alguma medida, tão somente a crimes tipificados como de competência de apenas uma das Justiças às quais se ligam os Ministérios Públicos?”
A ministra observa que os próprios órgãos investigadores não reconhecem a existência do conflito de atribuição, e o entendimento do Supremo é no sentido de que não cabe à eventual parte interessada provocar a competência da Corte para que “decida sobre suposto conflito suscitado arbitrariamente”.
Na avaliação de Rosa Weber, os fatos em apuração no procedimento instaurado pelo MPF “aparentemente não se confundem com o objeto da investigação do Ministério Público de São Paulo”.
“Ainda que no curso das investigações tenham surgido questões relativas aos mesmos imóveis, os objetivos seriam distintos. Concluir, com exatidão, em um ou em outro sentido, é tarefa somente passível de se realizar encerradas as investigações.”
Fonte: Agência Estado