Minutos antes de tomar a palavra no comício da noite de sábado, que lotou o Ponto dos Cem Réis, no centro de João Pessoa, o governador Ricardo Coutinho deu uma entrevista ao 247. Duas vezes prefeito da capital, no segundo mandato como governador da Paraíba, Coutinho é um personagem estratégico na resistência. Em 2016, teve uma atuação firme na denúncia do golpe sem crime de responsabilidade. Na semana passada, nos dias anteriores à chegada da caravana de Lula pelo Estado, no sábado, o governador travou e venceu uma luta política e simbólica para decretar o fim do racionamento d’ água em Campina Grande, segunda maior cidade paraibana.
Com os reservatórios reforçados pela chegada das águas trazidas pela transposição do São Francisco, Coutinho assinou decreto que dava um fim a um transtorno que se tornara desnecessário na rotina das famílias da região, quando as torneiras secavam regularmente às terças e quintas. O problema é que, por decisão de uma juíza de primeira instância, que alegou que o nível das águas não permitia a volta à normalidade, a decisão foi revogada. Mas Coutinho recorreu ao Tribunal, e, com apoio da área técnica, derrubou a decisão inicial. Ponto para a caravana de Lula que, ao lado de Dilma, foi um dos responsáveis pela transposição do São Francisco, obra que chegou a ser cogitada pelo imperador Pedro II e só foi inaugurada em abril de 2017, numa festa que estudiosos da política paraibana definem como a maior mobilização popular da história do Estado. A entrevista de Coutinho ao 247:
247 – Existia algum fundamento técnico na decisão judicial que tentava prorrogar o racionamento?
COUTINHO – Nenhum. Tudo era um jogo político. O que se queria era impedir que a população tivesse acesso a um direito histórico, que é o acesso à agua.
247 – Mas se alega que o nível de água continua baixo…
COUTINHO – A rigor, nossa decisão foi prudente. Eu poderia ter encerrado o racionamento há um mês, quando fui autorizado pela área técnica, pelo DNOCS e pela Agencia Executiva das Águas do Estado. Mas resolvi aguardar para que houvesse uma nova melhora e os reservatórios saíssem do volume morto.
247 – Mesmo assim o nível dos reservatórios se encontra em 8,2%…
COUTINHO – O importante é que o nível da água está subindo. Hoje está mais baixo do que no início do racionamento. Mas naquele momento o nível estava caindo. Agora está subindo. Essa é a diferença.
247 – A mobilização em torno da caravana de Lula tornou-se um elemento importante da situação política do país. Qual o significado disso?
COUTINHO – A caravana está mostrando que a ficha caiu. E é por isso que em João Pessoa assistimos, numa noite de sábado como esta, a mobilização de milhares de pessoas que saíram de de casa no fim de semana para lotar este lugar, um centro de comércio, onde os edifícios e ruas sempre ficam vazios, no fim de semana. O Brasil se descobre. Nessa situação a resistência que Lula demonstra é um fator muito importante.
247 – Qual a importância de se defender a candidatura de Lula?
COUTINHO – Não se trata de defender uma candidatura de qualquer maneira. Como o próprio Lula tem dito e repetido, o problema é anterior e envolve uma questão jurídica. Antes de saber se ele será candidato ou não, é essencial reconhecer que não há nenhuma prova para que seja condenado. Este é o mais importante. Seus direitos estão sendo atingidos e isso é errado com qualquer pessoa, candidata ou não à presidência da República. Não há uma prova que poderia levar a uma condenação e impedir Lula gozar da liberdade que é um direito de qualquer pessoa. A situação seria muito diferente se surgisse uma prova concreta de responsabilidade num ato criminoso. Não há.
247 – Mesmo assim as pressões são grandes. Por que?
COUTINHO – Vivemos uma conjuntura muito mais complexa do que se poderia imaginar. Há uma desilusão, uma descrença, que é resultado da criminalização da política. Não estou falando de investigar e condenar quem pode e deve ser acusado. Mas da criminalização da própria atividade política. Depois de assistir à queda de uma presidente eleita, o povo vê que a corrupção não diminuiu enquanto o desemprego aumentou. Temos hoje em Brasília, governo que não tem o menor interesse pelas necessidades da maioria. A capital federal, hoje, é uma cidade onde não há lugar para os trabalhadores, nem para os indígenas, ou para qualquer outro brasileiro necessitado. Não há espaço para eles. Apenas para aqueles que querem fazer negócios. É sintomático que, numa crise como esta que o país está vivendo, seja possível discutir se é correto ou não cortar 10 reais do salário mínimo.
Créditos: Brasil 247