247 – O Instituto Teotônio Vilela, órgão formulador de políticas públicas para o PSDB, partido comandado pelo senador Aécio Neves (PSDB-MG), divulgou estudo neste domingo em que aponta um suposto colapso do setor elétrico e um Brasil ‘sem energia para crescer’. Leia abaixo:
“Sem energia para crescer”, análise do ITV
O apagão que deixou pelo menos 11 estados e o Distrito Federal no escuro no último dia 19 coroa os fiascos de um modelo imposto ao setor elétrico brasileiro por Dilma Rousseff. Desde que ocupou o ministério de Minas e Energia, passando pela Casa Civil e, especialmente, já como presidente da República, ela esmerou-se em não deixar pedra sobre pedra no nosso sistema de produção de energia. As consequências, só a escuridão que deixou milhões de brasileiros sem luz não deixa ver: o Brasil não dispõe hoje de energia suficiente para crescer. Desde 2013, ocorreram 142 apagões no país
O episódio foi apresentado na versão oficial como um “corte preventivo” para evitar um apagão de proporções gigantescas. Ou seja, o sistema apresenta problemas evidentes para fazer frente ao consumo em alta, ao mesmo tempo em que a geração a partir de fontes hidráulicas está estrangulada pela falta de chuvas, por restrições ambientais, pela má gestão e pelo mau planejamento do prazo de entrada em operação das usinas em construção. A produção com base na queima de combustíveis fósseis está no limite e as obras de expansão do parque nacional acumulam frustrações, com seguidos atrasos de cronograma.
Mesmo com a série crise hídrica que o país enfrenta desde o ano passado, o governo petista sempre negou os riscos de apagões e, principalmente, de racionamento – que só acontecem como fruto de “barbeiragens”, segundo ensinava Dilma ainda como ministra-chefe da Casa Civil. Mas a perspectiva é de que, com reservatórios em níveis baixíssimos e um consumo ainda indomado, a população passe a conviver com constantes contratempos de falta de energia. Segundo os modelos oficiais, a chance é de 4,9%, no limite do aceitável, mas cálculos privados estimam risco bem maior, em torno de 40%.
Um modelo fracassado
Em setembro de 2012, na véspera do Dia da Independência, Dilma convocou rede nacional de rádio e televisão e transformou a ocasião em palanque eleitoral. Dedicou seu longo pronunciamento a anunciar “a mais forte redução de tarifa elétrica já vista neste país”. Em média, as contas para o consumidor seriam reduzidas em 18%. Ocorre que, já naquela época, os reservatórios estavam baixando rapidamente, projetos de geração de hidrelétricas e térmicas já estavam atrasados e o país começava a flertar com a escassez de energia – o que, definitivamente, não combina com preço em queda.
A redução das tarifas foi obtida à custa da renovação forçada de contratos de concessão, em condições muito desvantajosas para as empresas, que ficariam sem recursos para investir. As estatais federais foram obrigadas a aceitar e apenas as geradoras controladas pelos governos de Minas Gerais, São Paulo e Paraná disseram “não”, para evitar que seus negócios fossem tragados pelas cláusulas draconianas impostas pela intervenção intempestiva do governo. Vale registrar que, juntas, essas empresas haviam sido responsáveis por cerca de 70% de toda a capacidade de geração e transmissão no país desde 1999.
A estrutura de subsídios e tributos incluídos nas contas de luz também foi revista. Desde então, o setor elétrico entrou numa espiral de problemas. Empresas geradoras, transmissoras e distribuidoras viram suas receitas minguarem, seus balanços se desequilibrarem e foram forçadas a pisar no freio dos investimentos. O setor entrou em marcha lenta, enquanto a Eletrobrás mergulhou numa crise sem precedentes. A estatal de energia abriu plano para desligar 25% de sua mão de obra e vender parte de seus ativos, mas nem isso impediu que acumulasse prejuízo de R$ 13 bilhões nos últimos dois anos. As mudanças comprometeram a capacidade da empresa de investir no sistema por muitos e muitos anos, já com reflexo nos leilões de 2013 e 2014, cuja capacidade leiloada caiu 60%.
Energia negociada em leilões (em mil GWh)
Além de minar a capacidade de investimento das principais empresas do setor, a intervenção saiu custosa. O governo foi obrigado a fazer seguidos aportes de recursos para cobrir rombos que as empresas acumulavam ao comprar energia mais cara no mercado para honrar contratos de fornecimento firmados com consumidores. Os subsídios concedidos por meio da Conta de Desenvolvimento Energético somaram R$ 31,4 bilhões – deste valor, R$ 19,5 bilhões referem-se a desembolsos feitos pelo Tesouro. Os custos totais da barbeiragem superam R$ 114 bilhões.
Pior é que nem as tarifas baratinhas resistiram. No ano passado, segundo o IBGE, os preços de energia tiveram alta média de 17% (chegando, em alguns casos, a 36%), eliminando quaisquer resquícios da redução forçada de 2013. Neste 2015, a pancada será ainda mais forte. O governo decidiu que não irá mais cobrir os rombos dos desequilíbrios gerados pelo modelo criado por Dilma e passará a repassá-los integralmente para as contas de luz. Com o novo sistema de formação de preços, estima-se que os reajustes neste ano fiquem, em média, em 40%. A intervenção petista está doendo no bolso dos brasileiros.
Sinais contraditórios
Enquanto durou, a energia mais barata gerou um incentivo perverso num país cujo insumo era cada vez menos disponível. Prevista para o início do ano passado, a adoção de bandeiras tarifárias – que indicariam escassez e o consequente aumento nos custos de geração – foi adiada por 12 meses. O consumidor não obtinha do governo nenhuma sinalização de que o país já estava andando no fio da navalha em termos de produção de energia. Pelo contrário, o discurso foi sempre tão otimista quanto irresponsável. Resultado: nos últimos dois anos, mesmo com a economia parada, o consumo aumentou 7,5%, segundo o ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico). O planejamento também tem falhado: em 2014, o parque gerador cresceu 30% menos que o estimado no início de 2013.
Com menos chuvas, a geração hidrelétrica foi comprometida e o país se viu obrigado a acionar continuamente todas as usinas térmicas disponíveis para que não faltasse energia. A matriz energética brasileira – país que tem a maior disponibilidade de recursos hídricos para produção de energia do planeta – foi ficando cada vez mais suja: desde 2008, a participação das termelétricas subiu de 22,3% para os atuais 28,2%, segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e a Aneel. Ou seja, algo que deveria ser temporário, emergencial, tornou-se permanente para suprir a explosão de consumo incentivada pelo governo petista. Andamos, assim, na contramão dos esforços globais pela redução das emissões de gases de efeito estufa.
Os desequilíbrios criados a partir da edição da medida provisória n° 579, convertida em lei em janeiro de 2013, também acabaram por desestimular a expansão da oferta de energia no país. Há, hoje, uma extensa lista de obras à espera de conclusão ou, pior ainda, que sequer saíram do papel. Mais grave, o setor também convive com o descasamento entre os cronogramas de construção de usinas (em geral, mais adiantadas) e o da instalação de linhas (59% dos projetos de transmissão estão atrasados).
Obras prioritárias para garantir segurança no suprimento de energia não são realizadas. O ONS lista 310 projetos de transmissão e geração classificados como essenciais para assegurar o abastecimento no país até 2017, mas 104 deles já foram cobrados anteriormente dos planejadores oficiais e não andaram, nem têm previsão de licitação – como é o caso de 10,2 mil km de linhas de transmissão. Há atrasos de até quatro anos em obras fundamentais, como a construção da usina nuclear de Angra 3. Dezenas de parques eólicos no Nordeste estão sem gerar energia porque não dispõem de linhas de transmissão para interligá-los ao sistema nacional. Na prática, o planejamento do setor transformou-se numa grande colcha de retalhos, com péssima governança expressa nos erros da EPE e na inapetência do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico.
*Fonte: Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE).
No fio da navalha
Hoje o país anda no fio da navalha em termos de oferta e consumo. O recomendado para um sistema equilibrado é que a reserva de energia equivalha a 5% da demanda, o que, no caso brasileiro, significaria 4,3 mil MW. Mas, quando aconteceu o apagão de 19 de janeiro, a sobra era de apenas 600 MW, ou seja, menos de 1%. Para evitar problemas, a operação do sistema está apelando a grandes consumidores para que alterem horários de produção ou simplesmente parem de produzir. Desempregar será, certamente, o passo seguinte. Até recorrer ao socorro da energia gerada na Argentina tem sido necessário.
O que o Brasil está vivendo hoje é decorrência da opção equivocada da gestão petista em favor do populismo tarifário, em detrimento da segurança energética. A presidente quis transformar energia em tema de campanha e tornou o país uma economia que não dispõe de condições para voltar a crescer. A repetição dos apagões no período de calor e os possíveis racionamentos previstos para a época da seca tendem a nos empurrar definitivamente para uma recessão neste ano.
Capacidade instalada de geração elétrica no Brasil (em MW)
O mais grave é que o Brasil está agora na contramão do resto do mundo. Quando lá fora a energia estava cara, aqui tínhamos artificialmente energia barata para garantir a eleição de Dilma. Agora que o mundo terá energia barata em função da queda do barril de petróleo (até agora os preços caíram pela metade), o país terá a energia mais cara do planeta, retirando ainda mais competitividade de nossas empresas.
Um exemplo emblemático: os brasileiros pagam hoje 69% mais pela gasolina do que no resto do mundo. Isso ocorre pelo fato de o governo estar diante de uma armadilha: se reduzir o preço dos combustíveis, mantém a Petrobras na situação crítica que a levou a tornar-se, nos últimos quatro anos, a companhia mais endividada do mundo ao mesmo tempo em que mantinha um desconto médio de 20% no combustível que vendia aos brasileiros em relação ao preço que pagava no exterior. A estatal precisa agora quitar essa conta.
Sem luz no fim do túnel
O primeiro passo para o país sair da crise e fazer surgir alguma luz no fim do túnel é o governo reconhecer os erros cometidos nos últimos anos. É crucial apresentar um plano de uso eficiente de energia, descentralizar a política energética, diversificar a matriz e incentivar a microgeração, a geração distribuída e o maior uso de gás natural. Para recuperar o avariado setor elétrico nacional, também será necessário abandonar o populismo tarifário e a política de intervenções no mercado, e, com isso, restaurar a estabilidade regulatória e a segurança jurídica, sem as quais os principais investidores em energia se afastaram do país.
A crise energética no qual a presidente da República nos meteu precisa ser enfrentada com honestidade e realismo. Hoje o que temos são mistificações, tarifaço, apagões e um racionamento no horizonte. Medidas de racionalização do consumo são cada vez mais necessárias – é certo que, com maior transparência por parte do governo, a população brasileira certamente estaria colaborando para diminuir a demanda, como, aliás, já fez no passado.
É simplesmente inaceitável que um país com a diversidade energética do Brasil esteja neste momento vivendo seguidos apagões e discutindo a possibilidade de racionamento. O grande desafio é transformar a riqueza energética que a natureza nos deu em vantagem competitiva – o que não nos libera para negar as dificuldades, o momento de escassez e simplesmente apelar para a intervenção divina, como fez o ministro de Minas e Energia. O PT criou o problema e gerou uma conta que agora os brasileiros estão sendo chamados a pagar. É mais um estelionato eleitoral da lavra de Dilma Rousseff e mais uma das muitas barbeiragens decorrentes das equivocadas políticas petistas.
*Fonte: Empresa de Pesquisa Energética (EPE).