A proposta de cortar R$ 10 bilhões do orçamento 2016 do programa Bolsa Família não só desencadeou uma série de reações negativas de líderes políticos, como causou receio a beneficiários de cidades pobres do Nordeste, que temem conviver novamente com a fome.
Na terça-feira (20), o deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), relator da lei orçamentária 2016, sugeriu o corte de R$ 10 bilhões no orçamento de R$ 28,8 bilhões do programa. Atualmente, o Bolsa Família atende a 13,9 milhões de famílias beneficiadas -metade delas são do Nordeste. Segundo Barros, o corte atingiria apenas aos beneficiários que têm outra renda. Já o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome diz que que os recursos estão “inteiramente preservados”.
Entre os moradores de cidades em que a maioria da população depende do benefício, o clima é de apreensão. Nessa quarta-feira (21), o UOL visitou duas cidades pobres em Alagoas e percebeu que a proposta de corte foi o assunto principal do dia.
‘Vai ter muita fome de novo’
Em Santa Luzia do Norte (a 46 km de Maceió), Sônia Alves, 31, passou o dia preocupada e conversando com as amigas sobre a proposta –ela soube pela TV. “Essa ideia foi uma coisa muito errada. Imagine como será a vida minha e de meu marido, que está desempregado? É pouco o valor, mas é importante pra gente, senão passava fome”, afirmou ela, que ganha R$ 180 por mês de benefício.
Ao lado dela, a amiga Maria José Costa, 47, endossa o argumento, mas em tom de tristeza: “E a gente vai fazer o quê? Não podemos fazer nada. Mas Deus vai dar um jeito”, disse a beneficiário de R$ 147 mensais. “Vai ter muita fome de novo, né? Muita gente vive disso, não tem como se sustentar sem esse dinheiro”, completou Fernanda dos Santos, 30.
Revolta com a proposta
Já Gazi Batista da Silva, 43, revolta-se contra a possibilidade de perder os R$ 147 mensais que serve para seu sustento e de seus dois filhos. “Achei um horror! Dói na alma só de imaginar. Muitas famílias vão sofrer se isso ocorrer. Não deveriam cortar, nem reduzir, porque já é pouco”, afirmou.
Com três filhos e mulher para sustentar, o desempregado Cícero da Silva, 36, recebe R$ 230 e diz que está com muito medo. “Quem não ficaria? O dinheiro nem dá para pagar todas as despesas, minha sogra ajuda. Espero realmente que não cortem porque é um benefício social muito importante. Quem falou em cortar não sabe o que é sofrer sem dinheiro”, desabafou.
No município vizinho de Coqueiro Seco (a 47 km de Maceió), a apreensão é a mesma. Com R$ 260 por mês para criar três netos, Marilene Francisco, 55, afirma que um corte no benefício seria uma “tragédia” para o município. “Não tenho o que fazer, não está nas minhas mãos. Mas sei que se ocorrer, muita gente vai sofrer”, afirmou.
A ameaça de corte assusta também que está tentando ingressar na lista de beneficiários. Grávida e com um filho de três anos, a jovem Carla Vanessa, 16, conta que vai dar entrada nos próximos dias com o pedido. “Espero que não neguem porque será muito importante. Hoje vivo aqui na casa da minha tia, que também depende do Bolsa Família. Sei como é importante para ela nos manter”, explicou.
Para os comerciantes, um eventual corte do Bolsa Família significaria queda nas vendas. “Boa parte dos meus clientes são do Bolsa Família, se cortarem, vai cair muito. Sem contar que não vão ter como comprar comida”, disse a dona de mercearia Maria José Costa, 47.
UOL