A Copa do Mundo de futebol da Rússia, que começa em um mês, vai ser um divisor de águas na política nacional. Até o seu início em 14 de junho, quando os donos da casa enfrentam a Arábia Saudita, é provável que a atividade do Congresso aprove propostas patrocinadas pelo governo, de interesse econômico e, eventualmente, social, além de outras de iniciativa parlamentar. O Brasil estreia no dia 17 de junho contra a Suíça.
Depois da partida final da Copa, em 15 de julho, as eleições vão entrar na ordem do dia e o Legislativo vai passar por um esvaziamento que só começará a ser superado após 7 de outubro, quando só não estarão em disputa os cargos municipais de prefeito e vereador. Desde 1994, eleições “gerais” e copas ocorrem em anos coincidentes. Em 1989, a eleição presidencial “solteira” foi um ponto fora da curva.
A influência da Copa do Mundo no processo político se limita a seu peso no calendário, como se observa desde 1958, quando Wagner Maugeri, Lauro Müller, Maugeri Sobrinho e Victor Dag, todos publicitários, compuseram a marcha “A taça do mundo é nossa”, para as comemorações pela primeira conquista de um campeonato mundial pela seleção brasileira.
Em 1958, quando a seleção triunfou na Suécia, o Brasil era presidido por Juscelino Kubitscheck. Nas eleições de 1960, se JK, de olho no retorno ao poder, não se empenhou para eleger o candidato lançado pelo seu partido, o marechal Henrique Teixeira Lott (PSD), ele nada ganhou com a vitória de Jânio Quadros (PTN). A rigor, não houve ganhadores. Jânio assumiu o governo em 31 de janeiro e renunciou em 25 de agosto.
Na última conquista da seleção brasileira, em 2002, na Copa sediada na Coreia do Sul e no Japão, o Brasil pentacampeão era presidido por Fernando Henrique Cardoso, do PSDB. Nas eleições de outubro, Luiz Inácio Lula da Silva recebeu a faixa e levou o PT à chefia do Executivo, inaugurando um ciclo de 13 anos no poder.
A Copa é o maior evento esportivo do mundo e o espetáculo de maior audiência da televisão na face da Terra. A Copa de 2014 foi assistida por 3,2 bilhões de telespectadores, correspondentes à metade da população do planeta. Em 2018, com universalização da internet, a audiência será espetacular.
Realizada pela primeira vez no Uruguai em 1930, com 12 países convidados, além do anfitrião, o evento foi suspenso em razão da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) e nos anos subsequentes, voltando a ser disputada, sempre a cada quatro anos, em 1950, no Brasil.
Em 1954, na Suíça, com 16 países participantes, a Copa foi televisionada pela primeira vez, exclusivamente para países europeus. A partir de 1998, passou a contar com a participação de 32 países dos cinco continentes e a realizar 64 jogos. Em 2026, a FIFA, dona do evento, quer reunir 48 países no campeonato, que seria disputado nos mesmos 32 dias da atualidade. A ampliação deste megaevento esportivo, que envolve cifras astronômicas, lança justificadas suspeitas sobre uma entidade que tem traços de Império e de organização criminosa.
Jogo no Congresso
Até o início da Copa tem “jogo” no Congresso. Vale dizer que, mesmo com um ritmo cadenciado, para o qual vêm contribuindo a obstrução dos partidos de oposição, liderados pelo PT, e o desinteresse dos partidos da base governista, a Câmara deve produzir alguns resultados neste período de atividade. Os deputados estão perto de concluir a apreciação do projeto que reestrutura o cadastro positivo (o projeto aprovado em 2003 não vingou), com vistas a reduzir o custo do crédito, e rolar a bola para o Senado, onde teve início a tramitação do projeto original.
A discussão sobre a desestatização da Eletrobrás avança na Câmara, na MP 814/17, que reestrutura o setor elétrico, e no Projeto de Lei 9.483/18, que prevê a capitalização da empresa, por meio da oferta pública de ações ordinárias, diluindo-se a participação da União até que deixe de ser majoritária.
As medidas despertam uma disputa entre os que atestam a incapacidade de o Estado fazer os investimentos necessários na holding (estimativa de R$ 14 bilhões/ano) e aqueles que atacam o governo por dilapidar patrimônio. Podem passar na Câmara ainda neste semestre, a um custo elevado, mas o Senado também vai dar trabalho, só devendo decidir o assunto após as eleições. Parte significativa da representação dos estados não admite a privatização de empresas do grupo, como Furnas e Chesf.
Além das medidas provisórias, que são os aviões de carreira das sessões legislativas, é pouco provável que o governo venha a ter outros avanços no Congresso até o final da Copa, salvando, talvez, um (criação da duplicata eletrônica) ou outro projeto (fortalecimento das agências reguladoras) dentre as 15 medidas anunciadas para fazer o Brasil crescer. Depois de admitir não ter força para reformar a Previdência, o governo consolidou essa bobagem, para o mercado financeiro ver e não crer.
Depois disso o Congresso pode programar semanas intercaladas de reuniões, que geralmente têm resultados pífios, já que falta às correntes políticas em disputa serenidade para firmar o chamado acordo de procedimento – mínimo de entendimento necessário ao trabalho legislativo.
O mais provável é que, depois das eleições, dependendo de quem for eleito, o Congresso se empenhe em viabilizar uma agenda de pavimentação do terreno onde vai pisar o futuro governo, que não pode prescindir da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e do Projeto de Lei Orçamentaria Anual (PLOA).
Intervalo
Antes que o mal cresça, é importante ressaltar que este calendário aqui sugerido, entrecortado pela Copa do Mundo, não abrange os processos em curso no Judiciário, das primeiras instâncias aos tribunais superiores, bem como as investigações de políticos suspeitos de corrupção e o surgimento de revelações pesadas sobre quem puser a cabeça de fora. A Lava Jato completou quatro anos em março e a tendência é andar a passos maio largos, até mesmo no Supremo Tribunal Federal, onde ministros como Celso de Mello prometem levar logo a julgamento alguns processos envolvendo parlamentares.
Segundo Tempo/Eleições
Depois da Copa, é provável que a população comece a perceber sinais em seu radar e a dar atenção para as eleições de outubro. A movimentação política com vistas ao pleito é inegável e as reuniões em “petit comité” se intensificam. São louváveis as iniciativas de setores da mídia de fazer entrevistas e debates virtuais com os pré-candidatos a presidente da República. Agentes econômicos procuram ouvir os nomes que pretendem participar da disputa e a CNI já programou um evento “Diálogo da Indústria com os candidatos a presidente da República”. Vai ser em 4 de julho, um dia de folga no torneio da Rússia.
As convenções deverão ser realizadas no período de 20 de julho a 5 de agosto, como determina a lei, provavelmente aprovando algumas coligações entre partidos que lançaram pré-candidatura enxugado esse grupamento de 18 aspirantes. O prazo de registro de nomes termina em 15 de agosto. Teremos, então, candidatos de fato e de direito. A propaganda eleitoral começa em 31 de agosto, levando a campanha para a casa das pessoas.
O ideal seria que a disputa eleitoral ocorresse em um ambiente no qual prevalecesse o interesse em superar a crise política, que é anterior às eleições de 2014, quando Dilma Rousseff derrotou Aécio Neves no segundo turno. Assim como em 1960, com a eleição de Jânio Quadros, ninguém venceu.
Seria fundamental que o Brasil vencesse as eleições, tirando o melhor proveito possível das oportunidades que o pleito abre.
Não se deve descartar, porém, que a campanha descambe para a pancadaria, o denuncismo e a incriminação. Existe uma leitura tão difundida quanto discutível de que é disso que o povo gosta.
Lembrando a marchinha sexagenária, composta para comemorar a vitória da seleção na Copa da Suécia, e dando a ela uma conotação radicalmente antiesportiva, “com brasileiro, não há quem possa”.
Fonte: os divergentes
Créditos: os divergentes