Ciro Gomes e Rui Falcão, ex-presidente do PT, avisaram que em suas plataformas está a convocação de um plebiscito ou de um referendo para ratificar suas propostas caso vençam as eleições de outubro. Ciro defendeu a convocação desse mecanismo para decidir o destino de um projeto de reforma da Previdência. Dias depois, Falcão falou em “reverter as reformas desastradas do Temer por plebiscito ou referendo”. (Num plebiscito os cidadãos escolhem uma entre várias alternativas. Num referendo, aprova-se ou rejeita-se uma proposta.)
Quando deputado, o petista José Dirceu apresentou um projeto propondo que os acordos para o pagamento da dívida externa fossem submetidos a um referendo popular. Diante da perspectiva de poder, o comissariado fez a “Carta aos Brasileiros” e mudou de assunto. Desde 2001 Ciro Gomes defende a realização de plebiscitos, inclusive para decidir a questão previdenciária. Ele chamava essa girafa de “terceiro turno”.
A ideia de uma consulta popular direta logo depois de uma eleição presidencial é um golpe demagógico. Seu objetivo é o emparedamento do Congresso. Esse truque fez o gosto de Hugo Chávez na Venezuela e deu no que deu. No Brasil de 2018 o pescoço da girafa cresce quando se vê que os candidatos estão costurando alianças com partidos devastados pela Lava-Jato.
Trata-se de um jogo de “perde-perde” para o regime democrático, pois ao seu final haverá um presidente imperial esmagando um Parlamento cuja “caciquia” Ciro Gomes cortejou em busca de tempo de televisão. Uma pessoa disposta a votar em Ciro pode achar a ideia boa. E se o poste de Lula ganhar a eleição?
Se um candidato tem o que oferecer, poderá fazê-lo durante a campanha que começa daqui a pouco. Se der, deu. Se não der, não deu.
As vivandeiras querem Bolsonaro
Um pedaço do andar de cima que desfila na tropa de Jair Bolsonaro não quer escolher um presidente da República. Quer um golpe parecido com o de 1964, aquele que colocou cinco generais na Presidência da República. Em 1984, quando a ditadura agonizava, quase todas as vivandeiras que aplaudiram as extravagâncias do poder militar aderiram à campanha de Tancredo Neves e varreram para os quartéis o entulho do regime.
A plateia que ouviu Bolsonaro na Confederação Nacional da Indústria durante uma hora viu que estava diante de um candidato compreensivelmente nervoso e incompreensivelmente desconexo. Vago ao expor sua plataforma econômica, o candidato citou o evangelista João — “conhecereis a verdade e ela vos guiará” — e, em seguida, guiou a audiência para a questão ambiental de Roraima. Adiante, informou: “Estamos entregando a mina de nióbio ao chinês.” Referia-se à mina da Anglo American de Catalão (GO). (Em fevereiro, em Hamamatsu, Bolsonaro prometeu trabalhar em parceria com japoneses para a exploração do nióbio brasileiro.)
Reforma trabalhista? “É remendo novo em calça velha”. Não se pode saber o que isso significa, mas a plateia não reagiu.
Num breve momento o candidato deu uma pista. Mencionando que ele temeu um eventual crescimento da esquerda, disse: “Aí acabou qualquer esperança de mudarmos o Brasil pelas vias democráticas, que tem que ser.”
Desde 1985 o Brasil está numa via democrática e Bolsonaro, com seus sete mandatos, é uma prova disso. O candidato de hoje não repete o deputado que há dez anos, diante de uma manifestação hostil, disse que o “grande erro” da ditadura “foi torturar e não matar”. O Brasil deve ao marechal Castelo Branco a exposição das “vivandeiras alvoroçadas” que, desde 1930, rondam quartéis. Elas ainda estão por aí.
Lula e Pertence
O advogado Sepúlveda Pertence pode ser um ícone da advocacia nacional, mas perdeu o passo quando tentou tirar Lula do regime fechado em que vive, pedindo que lhe dessem o refresco da prisão domiciliar.
Para polir sua estratégia de vitimização, Lula até que gostaria de ser fotografado com as algemas que a Polícia Federal pôs em Sérgio Cabral.
Na mesma linha, a esdrúxula ordem de soltura dada pelo desembargador Favreto foi brindada pela caótica movimentação do desembargador Gebran e do juiz Sergio Moro, que estava de férias.
Madame Claude
Saiu nos Estados Unidos o livro “Madame Claude – Her Secret World of Pleasure, Privilege and Power”. É mais uma tentativa de exposição do “mundo de prazer, privilégio e poder” da famosa cafetina francesa. Entre 1957 e 1977, enquanto ela operou em Paris, seu telefone era um dos maiores símbolos de status da elite internacional.
O magano ficava no hotel Ritz, fazia suas compras na Hermès, jantava no Maxim’s e ligava para Claude.
O autor do livro, William Stadiem, já revirou os lençóis de Marilyn Monroe e Frank Sinatra. Ele conversou longamente com Fernande Grudet (o verdadeiro nome de Claude) quando ela abandonou o negócio, apanhada pelo fisco. Da narrativa de Stadiem resultam os suspeitos de sempre: o bilionário Gianni (Fiat) Agnelli, o barão Elie Rothschild e os dois maridos de Jacqueline Bouvier (John Kennedy e Aristoteles Onassis). O xá do Irã era atendido por uma ponte aérea que fazia a rota Paris-Teerã.
A clientela brasileira de Claude escapou da grelha de Stadiem.
Alckmin e o MDB
Pelo andar da carruagem, depois de conseguir o apoio do centrão (com todas as suas obras e todas as suas pompas), Geraldo Alckmin vai buscar a desistência de Henrique Meirelles, do MDB.
Madame Natasha oferece uma licença para criar sindicato a quem souber o que significa “centrão”.
Gatos por lebres
Paulo Francis desconfiou de Daniel Ortega quando soube que ele comprava óculos de grife. Parecia preconceito com o jovem guerrilheiro sandinista que derrubou a ditadura da família Somoza na Nicarágua. Passaram-se 40 anos e, sem óculos, o septuagenário Ortega, eleito três vezes para o cargo, reprime manifestações populares durante as quais já morreram 300 pessoas. Sua mulher é a vice-presidente, um de seus filhos dirige uma estatal, e outros três controlam canais de televisão.
No centenário do nascimento de Nelson Mandela, o estadista sul-africano, sua lembrança é um refrigério para as gerações que se encantaram por líderes românticos. Quem comprou os barbudos cubanos herdou a ditadura dos irmãos Castro. Na geração seguinte, o aiatolá Khomeini capturou a imaginação de quem detestava o xá do Irã. No seu lugar, instalou-se um regime muito pior. Isso, para não se falar no Zimbábue de Robert Mugabe, nem na cleptocracia do MPLA de Angola.
Hoje, noves fora a dinastia dos Ortega, está aí a frágil e doce Aung San Suu Kyi, atual presidente de Mianmar. Depois de 15 anos de prisão domiciliar imposta pelos militares, ela ganhou o prêmio Nobel da Paz e assumiu o governo do país. Deu em quase nada. Os militares continuam mandando, e foi negada a cidadania à minoria étnica dos muçulmanos rohingya. Setecentas mil pessoas já fugiram do país.
Fonte: O Globo
Créditos: O Globo