O relatório da Polícia Federal assegura que ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é a mesma pessoa do codinome “amigo” em planilhas que a empreiteira Odebrecht usava para escamotear personagens que recebiam propinas. Para o “amigo”, foram direcionados R$ 8 milhões. Ontem, (24) os policiais indiciaram o ex-ministro da Fazenda e da Casa Civil Antônio Palocci Filho; o presidente afastado da construtora, Marcelo Odebrecht; os marqueteiros do PT João Santana e Mônica Moura; e os ex-assessores Branislav Kontic e Juscelino Dourado.
De acordo com a PF, planilhas e mensagens apreendidas nos endereços, nos servidores de e-mail e nos telefones celulares ligados à empreiteira permitem concluir que o ex-presidente é chamado, por Marcelo Odebrecht, de “amigo de meu pai” e “amigo de EO”, referência a Emílio Odebrecht, pai do empresário. Palocci, Branislav e Dourado foram indiciados por corrupção passiva. Marcelo Odebrecht, por corrupção ativa. João e Mônica Santana, por lavagem de dinheiro.
A polícia calculou que os pagamentos ao codinome se acumularam entre o fim de 2012 e o ano de 2013. Esses repasses “foram coordenados por Marcelo Bahia Odebrecht junto a Antonio Palocci Filho”, afirma o delegado Filipe Hile Pace no relatório. Os arquivos com as planilhas são intitulados de “Posição Italiano”, com uma versão de 31 julho de 2012 e outra atualização datada de 22 de outubro de 2013. Para os investigadores, o “Italiano” era Palocci, cuja função era distribuir propinas para petistas, inclusive Lula, e ficar com uma parte delas.
Os subornos, assegura a PF, faziam parte de um caixa formado por valores devidos por taxas de corrupção a serem pagas devido a contratos com a Petrobras e outras estatais. Ao fim e ao cabo, a Lava-Jato afirma que há um sistema de financiamento partidário ilegal e comissionamento ilícito de altos funcionários públicos a partir de grandes fornecedores do Estado.
De acordo com Pace, os R$ 8 milhões para Lula “foram debitados do ‘saldo’ da ‘conta-corrente da propina’ que correspondia ao agente identificado pelo codinome de amigo”. Para ele, existe “respaldo probatório e coerência investigativa em se considerar que o ‘amigo’ das planilhas (…) faça referência a Luiz Inácio Lula da Silva”. Ele lembrou que a apuração se restringe a Palocci e a seus supostos negócios com a empreiteira. O caso de Lula é tratado pelo delegado Márcio Anselmo em outro inquérito, que já foi informado das revelações. Ambos fazem parte do grupo de trabalho da Lava-Jato na PF em Curitiba.
“Lawfare”
Os advogados do ex-presidente Cristiano Zanin e Roberto Teixeira desqualificaram as conclusões da polícia. “A Lava-Jato não apresentou qualquer prova que possa dar sustentação às acusações formuladas contra Luiz Inácio Lula da Silva, mesmo após ter promovido devassa em relação ao ex-presidente, seus familiares, colaboradores, ao Instituto Lula e à empresa de palestras Lils”, disseram, em nota.
“São, por isso, sem exceção, acusações frívolas, típicas do lawfare, ou seja, da manipulação das leis e dos procedimentos jurídicos para fins de perseguição política.” Segundo a dupla, o relatório de Filipe Pace não pode sequer “ser tratado como oficial”, porque representaria apenas “indevida e inconsequente opinião” de um delegado “sem elemento algum para autorizar a conclusão de que Lula recebeu qualquer vantagem indevida”. “Todas as contas de Lula já foram analisadas pela Polícia Federal e nenhum valor ilegal foi identificado.”
Parte dos pagamentos de propina foi destinado à tentativa de compra de um terreno novo para o Instituto Lula, suspeita a PF. Para isso, listam repasses de R$ 219 mil para a DAG Construtora, ligada à Odebrecht, e para o advogado Roberto Teixeira.
Mas, segundo o defensor, esses pagamentos se referem a honorários de serviços que ele prestou. “Assessorei juridicamente um cliente — que não é o Instituto Lula — na aquisição de um imóvel na Vila Clementino, em São Paulo (SP)”, afirmou em nota. “Posteriormente, solucionadas as intrincadas pendências jurídicas, assessorei o mesmo cliente na revenda do referido imóvel para a DAG.”
O advogado de Palocci, Guilherme Batochio, desqualificou o relatório da polícia. “Nada se acrescentou”, afirmou ele ao Correio. “Tudo continua como dantes: uma miríade de suposições e presunções sem qualquer lastro na realidade.” A defesa de Palocci sustenta que ele não é o “Italiano” das planilhas e que o ex-ministro não pode ser responsabilizado por documentos internos da Odebrecht. A empreiteira não tem prestado esclarecimentos. A reportagem não localizou ontem as defesas do casal Santana, de Branislav e Dourado.
Fonte: Correio Braziliense