Quatro quadrilhas que, juntas, teriam recebido R$ 3.317.820.268,28 em propinas. Essa é a soma de tudo o que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, indicou nas quatro denúncias contra 34 políticos enviadas ao Supremo Tribunal Federal (STF) este mês. Janot pede que os envolvidos devolvam aos cofres públicos um total de R$ 8,7 bilhões, sendo a maior parte devida pela quadrilha do PT no valor de R$ 6,8 bilhões.
O valor inclui o que o Ministério Público Federal diz ser resultado de crimes de corrupção cometidos pelas assim nomeadas organizações criminosas do PT, do PMDB da Câmara, do PMDB do Senado, e PP. O PT, que esteve no comando da Presidência da República de 2003 a 2016, responde pela maior cifra: R$ 1,485 bilhão. Em seguida aparece a suposta quadrilha do PMDB do Senado, com R$ 864,526 milhões. Em terceiro, o grupo comandado pelo atual presidente da República Michel Temer, com propinas na casa dos R$ 587,1 milhões, seguida da organização do PP, aliado de todas essas gestões.
O valor atribuído à legenda tem uma discrepância: na denúncia contra o partido está registrado o valor de 380,9 milhões, enquanto na denúncia contra o PT, a referência é de R$ 390,8 milhões. Nas quatro denúncias, Janot cita ainda um valor calculado pelo Tribunal de Contas da União (TCU), como o tamanho do prejuízo causado principalmente à Petrobras, estatal que foi dividida pelos três partidos e alvo de acordos que envolviam pagamentos irregularidades por fornecedores aos núcleos políticos dos três partidos ‘Quadrilha’ Valor desviado:
PT R$ 1,485 bilhão
PMDB do Senado R$ 864,526 milhões
PMDB da Câmara R$ 587,1 milhões
PP R$ 380,9 milhões
Na segunda flechada contra Michel Temer, apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF) na quinta-feira, 14, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot descreve a atuação do presidente e de seus aliados mais próximos no ‘quadrilhão do PMDB’.
A acusação é de organização criminosa.
São acusados o presidente da República, Michel Temer; Eduardo Cunha, Henrique Alves, Geddel Vieira Lima, Rodrigo Rocha Loures, Eliseu Padilha e Moreira Franco. Segundo a denúncia, eles praticaram ações ilícitas em troca de propina por meio da utilização de diversos órgãos públicos, como Petrobras, Furnas, Caixa Econômica, Ministério da Integração Nacional e Câmara dos Deputados. Michel Temer é acusado de ter atuado como líder da organização criminosa desde maio de 2016.
Para Janot, o presidente era o líder do quadrilhão do PMDB. O procurador aponta que Temer “dava a necessária estabilidade e segurança ao aparato criminoso, figurando ao mesmo tempo como cúpula e alicerce da organização”.
“O núcleo empresarial agia nesse pressuposto, de que poderia contar com a discrição e, principalmente, a orientação de Michel Temer”, escreveu Janot.
Segundo o procurador-geral, Padilha, Geddel, Moreira, Henrique Alves e Rodrigo Loures têm uma relação próxima e antiga com Temer e, por isso, falam diretamente com ele. Janot considera que há um “escudo” ao redor de Temer: os aliados negociavam repasses ilícitos enquanto Temer tinha papel de articular com seu grupo político os cargos que ficariam sob sua área de influência. O presidente é, segundo Janot, “o único do grupo que tinha alguma espécie de ascensão sobre todos”. “O papel de negociar os cargos junto aos demais membros do núcleo político da organização criminosa, no caso do subnúcleo do ‘PMDB da Câmara’, era desempenhado por Michel Temer de forma mais estável, por ter sido ele o grande articulador para a unificação do Partido em torno do governo Lula”, escreveu Janot.
O procurador-geral aponta que Temer “certas vezes” também atuava de forma direta, sem interlocutores e cita como exemplo o suposto pagamento de propina feito por Joesley Batista a pedido direto de Temer. Segundo o dono da J&F, Temer pediu e ele efetuou pagamento de uma mesada de R$ 100 mil a Wagner Rossi e de R$ 20 mil a Milton Hortolan, quando ambos ficaram contrariados ao serem dispensados do Ministério da Agricultura.
EDUARDO CUNHA
“No que tange a Eduardo Cunha, apesar de ser um político influente no Rio de Janeiro, apenas teve seu primeiro mandato como deputado federal em 2003, mas então deixou o PP e passou a integrar o PMDB. Na época, ele comandava, com a ajuda do operador Lúcio Funaro, um esquema ilícito no âmbito da Prece Fundo de Previdência Complementar da Companhia de Água e Esgoto do Rio de Janeiro (CEDAE) que gerou um prejuízo de R$ 300 milhões ao Fundo e um caixa de propina a Lúcio Punam e Eduardo Cunha, utilizado, em parte para comprar o apoio de outros parlamentares, inclusive de Michel Temer e Henrique Eduardo Alves. Assim, à medida que foi distribuindo cada vez mais dinheiro obtido de forma ilícita especialmente para ajudar nas campanhas de deputados do Rio de Janeiro e Minas Gerais, Eduardo Cunha foi se tornando uma liderança no âmbito da Câmara em razão do seu crescente número de aliados, que não se restringiam a parlamentares do PMDB.”
Segundo Janot, ‘a capacidade demonstrada por Eduardo Cunha de fazer negócios ilícitos de volumes expressivos e de movimentar um número cada vez maior de parlamentares na direção por ele indicada, cacifou-o perante às lideranças’ do “PMDB da Câmara”, especialmente depois das eleições de 2006, quando conseguiu arrecadar valores relevantes para as campanhas do partido’.
“O projeto de poder de Eduardo Cunha estava intimamente ligado à sua capacidade de se articular com à cúpula do seu partido, há anos composta por Michel Temer, Geddel Vieira Lima, Eliseu Padilha, Henrique Eduardo Alves e Moreira Franco, especialmente para práticas espúrias. Destes, os mais importantes e influentes eram Michel Temer e
Henrique Eduardo Alves, tendo aquele uma posição ainda mais proeminente que este.”
ELISEU PADILHA
“Em um primeiro momento, Eliseu Padilha foi o negociador em nome do “PMDB da Câmara” com grupos econômicos interessados na modificação de atos legislativos”. A partir de 2006, com o ingresso de Eduardo Cunha nos quadros do Partido, este passou a ser um grande articulador na venda de legislação tributária, especialmente à medida que conseguiu formar, a partir da distribuição dos valores arrecadados com propina, uma grande massa de aliados. O negócio espúrio em torno da venda de legislação passava também por uma articulação no âmbito do Senado Federal e do Poder Executivo, já que a propina só era paga quando sancionada a medida legislativa.”
“O esquema montado dentro do Congresso Nacional para venda de medidas legislativas funcionava (e, possivelmente, ainda funcione) da seguinte forma: quando um projeto de lei ou medida provisória eram feitos, havia uma articulação por parte dos integrantes do núcleo político do PMDB da organização criminosa para que os setores do empresariado impactados com as propostas legislativas fossem contatados para que fosse feita a negociação do pagamento de propina em troca da aprovação ou não da medida. Essa articulação, no âmbito da Câmara dos Deputados, era feita por Eliseu Padilha e, posteriormente, também por Eduardo Cunha.”
Janot aponta que Moreira Franco indicou Eliseu Padilha para receber dinheiro pago ‘com recursos não contabilizados e operacionalizados pelo Setor de Operações Estruturadas da Odebrecht’ sobre a concessão do Aeroporto do Galeão. O codinome de Padilha, segundo a denúncia, era ‘Primo’.
MOREIRA FRANCO
“Michel Temer negociou a vice-presidência de Fundos de Governo e Loterias da Caixa (VIFUG), para a qual foi nomeado, em 2008, Moreira Franco, onde ficou até julho de 2010. O primeiro integrante do núcleo político do “PMDB da Câmara” da organização criminosa a tomar posse numa vice-presidência da CEF foi Moreira Franco, em 2008. Durante sua gestão, houve uma grande concentração dos recursos disponibilizados aos projetos de empresas do grupo Odebrecht, em especial da Odebrecht Ambiental e da Odebrecht Transport. Na época, o seu filho, Pedro Moreira Franco, era executivo do grupo’. O consórcio da Hidrelétrica Santo Antônio, formado, entre outras empresas, pela Odebrecht, obteve, em 2008, a aprovação de um financiamento de mais de R$ 3,2 bilhões. Esse foi o segundo maior valor aprovado pelas instâncias deliberativas do FI-FGTS naquele ano. Houve ainda a aprovação de US$ 200 milhões para a Embraport, subsidiária da Odebrecht Transport. Em 2009, a UHE Santo Antônio foi beneficiada com mais R$ 155 milhões e a empresa Foz do Brasil, subsidiária da Odebrecht Ambiental, teve aprovado um financiamento de R$ 650 milhões. Em 2010, a Odebrecht Infraestrutura Logística logrou R$ 1,3 bilhão em financiamento do FTFGTS. Mas não apenas a Odebrecht foi beneficiada indevidamente na gestão de Moreira Franco, o Grupo Bertin também o foi, com a ajuda de Eduardo Cunha e Lúcio Futuro.”
Janot aponta que Moreira Franco foi nomeado para Secretaria de Aviação Civil em 16 de março de 2013, permanecendo no cargo até 1 de janeiro de 2015, quando foi sucedido por Eliseu Padilha, que ficou na Pasta até 1 de dezembro de 2015.
O procurador identificou uma ‘relação promiscua entre o público e o privado, revelando um verdadeiro escambo por
parte de Moreira Franco com a coisa pública’. “De um lado ele recebia os representantes da empresa em seu gabinete, demonstrando todo seu poderio em beneficiá-la em razão do cargo que ocupava e, de outro vértice, solicitava vantagem indevida a pretexto de contribuição de campanha eleitoral”, afirma Janot.
GEDDEL VIEIRA LIMA
Geddel Vieira Lima assumiu, em março de 2007, o Ministério da Integração Nacional, por indicação de Michel Temer e Henrique Alves, à época líder da bancada peemedebista na Câmara. Em 16 de março de 2007, Geddel Vieira Lima assumiu o Ministério, onde permaneceu até 31 de março de 2010. Geddel ingressou na vice-presidência da Caixa em março de 2011.
“A principio, Eduardo Cunha e Geddel não tinham relacionamento próximo, porque disputavam espaço dentro do próprio “PMDB da Câmara”. Contudo, na medida em que Lúcio Funaro identificou uma gama de negócios escusos que poderiam ser feitos a partir da Vice-Presidência de Geddel , os três passaram a operar esse nicho de arrecadação de propina. Lúcio Funaro fazia a interlocução com os empresários e Eduardo Cunha fazia a ponte com Geddel Vieira Lima, que por sua vez repassa a Eduardo Cunha a informações sigilosas que propiciavam o acerto dos projetos submetidos à aprovação.”
“A primeira operação realizada com o apoio de Lúcio Funaro e Eduardo Cunha na Vice-Presidência de Geddel Vieira Lima foi a liberação de R$ 300 milhões em favor da J&F. O percentual de propina acertado foi novamente de 3%. A
parte correspondente a Geddel, 65%, foi entregue por Lúcio Funaro em dinheiro no hangar da Aero Star, no aeroporto de Salvador, em diversas datas. Nas ocasiões subsequentes em que necessitou entregar recursos de propina a GEDDEL, Lúcio Funaro se valeu do mesmo hangar no aeroporto de Salvador, inclusive em uma delas usou o avião de Júlio Camargo para fazer a entrega, outras vezes, entregou o dinheiro no hotel Renaissance, na Alameda Santos e outra vez no hotel Pestana em Salvador.”
HENRIQUE ALVES
Janot aponta temas negociados por Temer e Henrique Alves, ‘na qualidade de presidente e líder do PMDB, que concordaram com ingresso do “PMDB da Câmara” na base do governo em troca de cargos chaves, tais como a Presidência de Furnas, a Vice-presidência da VIFUG/CEF (Vice-Presidência de Fundos de Governo e Loterias na Caixa Econômica), o Ministério da Integração Nacional, a Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), a Diretoria Internacional da Petrobras, entre outros’.
“Michel Temer, Henrique Alves e Eduardo Cunha eram os responsáveis pela obtenção de espaços para o seu grupo político junto ao governo do PT. O seu poderio advinha da influência que detinham sobre a bancada do PMDB na Câmara dos Deputados, instrumentalizando-a para criar as condições necessárias ao bom posicionamento da organização criminosa.”
RODRIGO ROCHA LOURES
“Michel Temer nomeou ainda Osmar Serraglio para o cargo de Ministro da Justiça (em 7/03/17), abrindo espaço na Câmara dos Deputados ao suplente Rodrigo Loures, pessoa da sua estrita confiança. Embora não se tenha elementos probatórios da atuação de Rodrigo Loures na organização criminosa antes de 2016, ele sempre esteve muito próximo a Michel Temer. Com o envolvimento do nome de Geddel Vieira Lima e Eliseu Padilha nas investigações sobre crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, Rodrigo Loures passou a ser a pessoa de confiança de Michel Temer para tratar dos seus interesses escusos. Nesse sentido, em conversa mantida com Joesley Batista indicou expressamente o nome de Rodrigo como sendo o seu novo interlocutor em substituição a Geddel e Padilha.”
COM A PALAVRA, CEZAR BITENCOURT, QUE DEFENDE RODRIGO ROCHA LOURES
“Rodrigo Rocha Loures não participou de nenhum acordo de pagamento ou recebimento de propinas atribuído ao PMDB da Câmara.Rodrigo era apenas um assessor pessoal do Presidente e não tinha nenhuma intervenção em atividades financeiras, ao contrário da recente denúncia contra o PMDB da Câmara. A defesa repudia veemente mais uma denúncia leviana de Rodrigo Janot!!!”
COM A PALAVRA, DANIEL GERBER, QUE DEFENDE ELISEU PADILHA
Sobre a denúncia por organização criminosa feita pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot ao Supremo Tribunal Federal, contra o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, o advogado Daniel Gerber que defende o ministro afirma: “Entendo como equivocada o oferecimento de uma denúncia com base em delações que estão sob suspeita, mas iremos demonstrar nos autos a inexistência da hipótese acusatória”.
COM A PALAVRA, O ADVOGADO DELIO LINS E SILVA JÚNIOR, QUE DEFENDE EDUARDO CUNHA
Sobre a nova denúncia oferecida pela PGR, a defesa de Eduardo Cunha tem a dizer que provará no processo o absurdo das acusações postas, as quais se sustentam basicamente nas palavras de um reincidente em delações que, diferentemente dele, se propôs a falar tudo o que o Ministério Público queria ouvir para fechar o acordo de colaboração.
CONEXÃO PP – AGUINALDO RIBEIRO
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ofereceu uma denúncia ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra políticos do PP por formação de uma organização criminosa para atuar no esquema de corrupção na Petrobras. O PP é hoje a quarta maior bancada da Câmara dos Deputados.
Esta é a primeira denúncia oferecida pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra políticos no ramo de investigação conhecido como “quadrilhão” – que apurou a organização entre políticos e operadores para atuar na petrolífera. A denúncia contra políticos do PP será mantida em sigilo no STF pois foram usadas informações da delação do ex-deputado Pedro Corrêa (PP-PE), que ainda protegida por segredo de justiça.
O inquérito relativo ao PP tem 30 alvos – entre eles o ex-ministro Aguinaldo Ribeiro e o presidente da legenda, senador Ciro Nogueira (PI). No oferecimento de denúncia, há casos que foram arquivados, quando no entendimento dos procuradores, não praticaram crimes.
A reportagem apurou, no entanto, que o presidente da sigla é um dos denunciados. A investigação foi aberta na primeira leva de inquéritos pedidos por Janot ao STF na Lava Jato, em março de 2015. No meio do caminho, contudo, a própria PGR pediu para fatiar a investigação em 4 ramos: PP, PMDB do Senado, PMDB da Câmara e PT.
Informações prestadas pelos primeiros delatores – Alberto Youssef e Paulo Roberto Costa – deram origem à investigação, que foi enriquecida com as novas colaborações premiadas firmadas de lá pra cá, como a da Odebrecht.
Fonte: ESTADÃO