Na avaliação de Josias de Souza, blogueiro do UOL, o fato de o PT ter conseguido reeleger Lula e também Dilma Rousseff, a despeito da Lava Jato, fez o partido acreditar em sua própria invulnerabilidade.
Em 2018, um pedaço do eleitorado resolveu informar ao petismo que cansou de fazer papel de bobo. E o PT se deu conta de que o seu descaso criou a maior força política da temporada: o antipetismo.
No primeiro turno, continua Josias, tudo o que Haddad precisou fazer foi usar a máscara de Lula. Com isso, beneficiou-se da transferência de eleitores. “No segundo turno, para abrandar a rejeição ao PT e a Lula, Haddad precisaria ser Haddad. E o PT não permitiu. […] Ao transformar sua pseudocandidatura num cavalo de batalha, Lula obrigou o PT a segui-lo numa procissão que levou até a cadeia, não à urna”, afirma.
O cientista político Carlos Melo lembra que, em vários momentos, Haddad foi desautorizado pela própria direção do partido. “A Gleisi Hoffmann disse que o Haddad passaria por um estágio probatório. O sujeito é candidato à Presidência da República. Estágio probatório onde? No PT?”, questiona.
O PT levou a candidatura de Lula até onde pôde, muitas vezes afrontando a lógica, como define o blogueiro Leonardo Sakamoto, para que a população olhasse o ex-presidente e depois transferisse seus votos a Haddad.
Não contaram com o fato de que, a partir do momento em que Fernando Haddad ficasse mais conhecido e Jair Bolsonaro colasse nele os problemas do PT, a rejeição aumentaria muito”, afirma Sakamoto.
“O resultado é que Bolsonaro correu em raia livre, quase ganhou no primeiro turno”, complementa Melo.
“Faltou água, sabão e meio quilo de mea-culpa”
Em 2016, após perder a eleição para a Prefeitura de São Paulo no primeiro turno, Haddad decidiu que era preciso formar uma frente democrática para se contrapor à onda conservadora no país. A oportunidade surgiu na disputa com Bolsonaro, mas, a poucos dias do segundo turno, o candidato petista tinha apenas apoio de políticos menores, sem contar com nomes pesados da política.
Para Sakamoto, setores do PT se deram por satisfeitos com o resultado do primeiro turno e não se engajaram fortemente na campanha. “No segundo turno, isso significaria uma abertura para outros partidos, para outras lideranças, abertura da hegemonia. O PT preferiu resguardar o potencial de ser a liderança da oposição durante um governo Jair Bolsonaro do que jogar todas as fichas na mesa para garantir que Fernando Haddad vencesse, que era um tiro mais incerto.”
Melo vai na mesma linha: “Não basta procurar alguém para receber apoio, você tem que negociar esse apoio. Fazer concessões. Tem que negociar. Essa é a lógica do segundo turno”. O maior erro da campanha, segundo o cientista político, foi acreditar que no Brasil toda esquerda é petista, porque não é.
Eles poderiam aplicar para a esquerda não petista e chegar até um centro-esquerda, quase num centro. Para isso era preciso haver uma revisão das práticas, sobretudo do plano econômico que se deu a partir de Dilma Rousseff.
A história da eleição poderia ter sido outra, na opinião de Josias de Souza, se o PT tivesse apostado em um plano C: Ciro Gomes. “Com seu prestígio, Lula colocou Haddad no segundo turno. Com sua rejeição, Lula corre o risco de passar para a história como o grande cabo eleitoral da direita. […] A ideia de formar uma frente democrática anti-Bolsonaro pareceu como mais uma esperteza do PT. Uma tentativa do partido de enxaguar sua roupa suja. Ficou entendido que o PT quis salvar não a democracia, mas a si próprio. Faltou à proposta da frente pró-democracia do PT água, sabão e meio quilo de mea-culpa”, conclui.