Governo federal reduz em 23% gastos para combater preconceito racial

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Entre 2014 e 2015, o governo federal reduziu em 23% os gastos da antiga Seppir (Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial), hoje incorporada ao Ministério das Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos. Lideranças do movimento negro criticam o governo pela diminuição dos recursos destinados a políticas voltadas à população negra. A redução dos gastos do governo federal com a Seppir foi apontada por um levantamento feito pelo UOL com base em dados do Siafi (Sistema Integrado de Administração Financeira) e do Portal da Transparência.

A Seppir foi criada em 2003 durante o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e tinha status de ministério até ser incorporada pelo atual Ministério das Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos, criado em outubro deste ano como parte da reforma ministerial anunciada pela presidente Dilma Rousseff (PT).

Entre 2014 e 2015, o orçamento da Seppir aumentou 24,7% (valor corrigido pela inflação registrada pelo IPCA em 2014, que foi de 6,41%). Saiu de R$ R$ 56 milhões em 2014 para R$ 75 milhões em 2015.

Segundo levantamento feito pelo UOL, mesmo tendo mais recursos disponíveis, a Seppir gastou menos que em 2014. Entre janeiro e outubro de 2014, a Seppir gastou R$ 26 milhões (valor já corrigido pela inflação). No mesmo período deste ano, a Seppir gastou apenas R$ 20 milhões.

Quando os dois gastos são comparados com os orçamentos disponíveis, a queda também é significativa. Em 2014, os R$ 26 milhões gastos pela Seppir equivaliam a 41% do previsto (valor já corrigido pela inflação). Em 2014, os R$ 20 milhões gastos até outubro equivalem a 26,7% do orçamento previsto no início do ano.

Entre os projetos tocados pela Seppir que sofreram redução nos gastos estão as chamadas ações de “fomento ao desenvolvimento local para comunidades remanescentes de quilombos”, que previam, entre outras coisas, a realização de capacitação técnica de moradores de comunidades quilombolas. Entre janeiro e outubro de 2014, o governo gastou R$ 4,1 milhões. Entre janeiro e outubro de 2015, porém, os gastos com esse conjunto de ações caíram para R$ 810 mil.

Mesmo com dinheiro previsto, o Disque Igualdade Racial, anunciado pelo governo em 2014, não saiu do papel. O número de telefone 138 deveria receber e encaminhar denúncias de racismo às autoridades, mas não está em funcionamento. Neste ano, o programa tinha um orçamento previsto de R$ 8 milhões, mas, segundo o Siafi, nenhum centavo havia sido gasto até o final de outubro deste ano. Nas últimas semanas, um novo episódio de racismo, desta vez contra a atriz Taís Araújo, mobilizou autoridades que passaram a investigar o caso.

Críticas
Para o coordenador da ONG (organização não governamental) Educafro, frei David dos Santos, a redução nos gastos da Seppir é “inapropriada”. “Desde o nascimento da Seppir até hoje, a gente tem sofrido muito para que os recursos destinados a ela sejam efetivamente gastos. A gente considera isso inapropriado. A gente entende que não para o povo negro pagar o pato pela crise econômica”, afirmou.

O presidente do bloco Ylê Aiyê, Antônio Carlos dos Santos, também critica a redução nos gastos da Seppir. Além do tradicional bloco de carnaval realizado pela entidade na Bahia, a entidade também organiza atividades culturais e cursos profissionalizantes voltados ao público negro de Salvador.

“A nossa briga tem sido para que o orçamento da Seppir aumente e, infelizmente, a gente vê que o governo está gastando menos que o previsto. É um absurdo. Você tem o dinheiro, mas não gasta. A Seppir, que agora virou ministério, tem que conversar com a sociedade civil”, criticou Antônio Carlos. “Não faz sentido a gente ficar brigando por mais recursos e a secretaria acabar devolvendo recursos porque não utilizou. A dívida com o povo negro é enorme e esses recursos poderiam ser usados para criar políticas para minimizar isso”, disse.

A reportagem do UOL entrou em contato por telefone e por e-mail com a assessoria de imprensa da Seppir para questionar a redução nos gastos, entretanto, até o fechamento desta reportagem, o órgão não respondeu às perguntas feitas.