A vendedora Suely Diniz de Souza, de 42 anos, fica com “a cabeça confusa” quando o assunto é a eleição presidencial de outubro. Ela conta que gostaria de ter confiança em algum candidato, mas teme escolher alguém que se envolva em escândalos de corrupção.
A 42 dias da votação, Suely não tem um candidato para a disputa pelo Palácio do Planalto. É integrante de um universo que há 20 anos não era tão grande, o dos eleitores que pretendem votar branco, nulo ou estão indecisos. Eles somam 38%, segundo pesquisa do Ibope divulgada na segunda-feira. Há quatro anos, na mesma época, a soma do que os cientistas políticos chamam de alienação eleitoral era menos da metade, 15%.
— Gostaria de ter segurança para dizer: eu vou votar em fulano porque aquela pessoa é assim, mas infelizmente não tenho um nome — diz Suely, que mora em João Pessoa e é funcionária de uma loja de biquínis na Praia de Tambaú, onde ganha cerca de mil reais mensais.
Por mais que o número seja recorde, a aposta de cientistas políticos é que a TV e o rádio representarão um gatilho para despertar o interesse desse eleitorado. Segundo analistas, a parcela de indecisos e votos nulos e brancos aumenta entre os eleitores de baixa renda e menos escolarizados. Esse é o público que se informa principalmente pela TV e pelo rádio. Por isso, tende a se interessar mais e definir seu voto quando começar a propaganda eleitoral, avalia o cientista político Rubens Figueiredo:
— Segundo uma dessas pesquisas, 70% dos brasileiros acham que as eleições podem mudar a vida para melhor. A televisão no Brasil é poderosíssima, quase 80% dos brasileiros assistem à TV todos os dias. É monumental a capacidade de formar opinião. À medida que a campanha se desenvolve, o número de indecisos tende a diminuir. Historicamente, quando a TV entra no jogo, as pessoas começam a se sentir mais esclarecidas, seja por simpatia, rejeição ou voto útil.
ELEITORES INDECISOS EXPÕEM SUAS DÚVIDAS E INCERTEZAS SOBRE AS ELEIÇÕES
Eleida Von-Gripp, cuidadora, 50 anos. Paraense, estudou até o ensino médio e mora em Brasília há 30 anos para onde foi transferida pelo banco Bamerindus: “As eleições deste ano estão muito difíceis. Essa é a primeira vez em que eu fico indecisa. Sou mais da direita, mas já votei no PT. O Bolsonaro não me passa confiança, não gosto muito do modo que ele fala. Com relação ao Ciro e o Alckmin, eu não tenho nada contra, mas eles estão longe nas pesquisas. Tudo pode mudar. A propaganda eleitoral não vai me influenciar. Falta sinceridade nos candidatos, falta transparência. É importante olhar pelas mulheres, mas não é apenas isso”Foto: Jorge William / Agência O Globo
Alex Oliveira, 32 anos, engraxate na rodoviária de Brasília. Estudou até o ensino fundamental e se mudou de uma cidade no interior em busca de emprego: “Eu só voto no Lula, sempre votei no Lula. Vou votar mais em quem? Porque não tem outro candidato que presta. Ele trabalhou pelo povo. Se um presidente não puder ter uma casa, um sítio… Mesmo preso eu voto nele. O Alckmin parece que foi bom em São Paulo, eu poderia até votar nele. Se ele não puder participar, vou avaliar os outros. O Haddad eu conheço, mas vou analisar. Do Bolsonaro eu nunca ouvi falar. Eu não conheço nenhum deles a fundo”Foto: Jorge William / Agência O Globo
Joseane Brito, 37 anos, comerciante de João Pessoa que viu o seu faturamento cair nos últimos anos: “Trabalhava com recarga de cartucho de impressora, mas meu faturamento caiu. Agora vendo um monte de coisa na loja, até produto de limpeza, e ganho menos. Os políticos prometem tudo e não fazem nada. Não pagam um salário bom para professores e policiais. Estão falando do Bolsonaro, mas não sei . Fala que vai acabar com a corrupção, mas quando estiver lá, fica do mesmo jeito. Tem um do Rio,o Radad (Haddad), mas esse é para o lado de Lula, então eu não voto”.Foto: JOAO MEDEIROS [83]99675.5555 / JOAO MEDEIROS/ Agência O Globo
Manoel Ribeiro, 53 anos, aluga imóveis em favela de Salvador e não completou o fundamental: “Ainda não sei em quem vou votar. Tem que pensar bem. Vou deixar para decidir quando estiver faltando uma semana, 15 dias. Votaria no Lula se ele fosse solto. Em preso, eu não voto. Se está preso, é porque tem alguma culpa. Coisas que eu não tinha consegui (comprar) no governo dele, como uma TV, que paguei parcelada. Cheguei a ter um mercado, mas hoje não vale a pena e alugo o terreno. Não conheço os outros (candidatos). Vou assistir aos jornais na TV para me informar.”Foto: Marcio Lima / Agência O Globo
Rute Souza, 50 anos, doméstica no Rio. Ela gasta até cinco horas em transporte e quer soluções para o setor: “Não voto nulo, nem em branco. Mas ainda não parei para olhar os candidatos. Não pretendo votar naqueles que vêm de antes. Na última eleição votei na Dilma. Na anterior, nem lembro em quem. Nunca votei no Lula. Já votei até no Enéas. Uma pena que ele morreu. Já votei no Fernando Henrique uma vez. Se o Lula disputasse, eu não votaria. A Dilma foi um erro, não adiantou nada. Não conheço esse Fernando (Haddad). Não adianta mudar o candidato se o partido é o mesmo.”Foto: Guito Moreto / Agência O Globo
Suely Diniz de Souza, 42 anos, vendedora na Paraíba. Vive com os pais, que são aposentados: “O problema de tudo é a corrupção. Quem é pobre sofre muito com a corrupção. Se não fosse a corrupção, a gente teria uma vida melhor. Já anulei o voto, mas não quero fazer isso de novo. Não devo fazer isso de novo porque as pessoas acabam decidindo por mim. Quero votar, mas estou em dúvida. Conheço os candidatos só de ouvir falar. Pretendo assistir aos debates para conhecer mais. O que a gente escuta é que quem é correto e tem caráter não entra em política.”Foto: João Medeiros / Agência O Globo
Carla da Silva Santos, 28 anos, Salvador. Vende loterias e ganha cerca de R$ 400 por mês: “Se não tiver o Lula, eu não vou votar em ninguém. Se ele está preso é porque fez alguma coisa errada. Mas era melhor com ele. Consegui comprar uma TV de plasma. Antes, pobre não tinha essas coisas. Agora está tudo muito ruim. Não tem emprego. A saúde está péssima. Fui acompanhar um tio meu que estava com dor de barriga e tivemos que passar por cinco UPAs para ele ser atendido. Conheço a Marina, mas minha mãe fala que tem uns problemas com ela. Os outros não conheço.”Foto: Márcio Lima / Agência O Globo
Cleide Martins, 55 anos, zeladora de cemitério em João Pessoa. Ganha menos de um salário mínimo: “Ainda vou decidir (em quem votar). Falta bastante tempo. Não conheço direito nenhum (candidato). Não sou muito interessada em política. Vou assistir às notícias na TV para saber mais. É muito roubo, muita coisa ruim neste país. Eles só trabalham para eles e para o pobre nada. Minha vida é difícil, não tiro nem um salário por mês. Trabalho cuidando de túmulo, e, nos últimos tempos, cada vez o pessoal quer pagar menos. Acho difícil o presidente fazer alguma coisa boa.”Foto: João Medeiros / Agência O Globo
Luciana Zitto, de 51 anos, Porto Alegre. Bancária aposentada que trabalhou mais de 20 anos no setor: “Estou totalmente incerta, não acredito em ninguém, por mais que pense que está nas nossas mãos escolher o presidente. Mas em quem votar? Chegamos a um ponto em que temos de escolher o menos pior. É uma desesperança muito grande com tudo que se ouve. Tenho tentado assistir aos debates, mas não dá, todos têm o ranço da velha política. Esse clima de descrédito me preocupa. Mas não vou anular o meu voto. Até a eleição decido por um.”Foto: João Mattos / Agência O Globo
Dayane Claudina dos Santos, 23 anos, garçonete na Paraíba. Votou em Dilma em 2014 e ganha R$ 800: “Não sei em quem votar. A gente não tem expectativa de que os políticos vão mudar alguma coisa. No tempo do Lula, eu era pequena, mas lembro que as coisas eram boas. Mas depois que a gente ficou sabendo desses roubos não dá mais para votar nele. Não conheço muito os candidatos. (A Marina Silva) eu conheço, mas não acho ela nada de mais porque não falou o que quer para o país. (Ciro Gomes) também conheço, mas não sei quais são as propostas dele”Foto: João Medeiros / Agência O Globo
Os entrevistados pelo GLOBO reforçam essa expectativa. Embora se digam desalentados, a maioria — sete dos dez eleitores — afirmou que vai buscar mais informações sobre os postulantes e as campanhas no noticiário e não desistiu de escolher um nome para presidente até 7 de outubro.
— As pessoas estão decepcionadas. Os sentimentos predominantes são indignação e ansiedade. Mas o eleitor indignado e o ansioso têm motivo para votar — explica o cientista político Antonio Lavareda.
É o que confirma a paraibana Suely:
— Já anulei o voto, mas não devo fazer isso de novo porque as pessoas acabam decidindo por mim.
“Ajackson é do Rio?”
Cientista político da Fundação Getúlio Vargas, Jairo Pimentel avalia que o cenário eleitoral corrente é diferente do de 2014 no mesmo período. Mas ele crê que o número de eleitores sem-voto este ano se aproximará da média histórica:
— Um ponto importante é que não há um candidato (claro) do governo. Mesmo quando ele é mal avaliado, costuma haver transferência de voto. Mas vivemos um governo (Temer) que foi colocado de uma maneira confusa, envolvido em corrupção. É uma situação atípica. O Lula é importante também. Há uma clientela muito grande que quer votar nele (37% dos eleitores, segundo o Ibope).
Sem saber a decisão final do PT sobre quem aparecerá na urna, eleitores ficam confusos, o que alimenta a indecisão. Vendedora de loterias em de Salvador, Carla da Silva Santos, de 28 anos, conta que nunca ouviu falar em Fernando Haddad, o candidato a vice na chapa encabeçada por Lula, que está preso. Haddad visitara Salvador na véspera.
— Esse Ajackson (Haddad) é do Rio? — perguntou Carla, que fatura cerca de R$ 400 por mês com a venda de loterias.
O Nordeste, onde vivem Suely e a maior parte dos eleitores de Lula, tem a maior fatia de indecisos ou que pretendem anular o voto (41%, segundo o Ibope). No país, 44% das mulheres se colocam nessa situação. Entre os eleitores com até a 4ª série, são 49%.
Os principais candidatos apostam no início do horário eleitoral na TV para conquistar o voto do eleitor ainda indefinido. Com maior tempo de propaganda, Geraldo Alckmin (PSDB) já testa peças de propaganda. Com menos tempo, Ciro Gomes (PDT) pretende investir em viagens.
Jair Bolsonaro (PSL) está mais preocupado em consolidar as próprias intenções de voto do que em conquistar indecisos, e o PT tentará vincular Haddad ao máximo a Lula. Marina Silva (Rede) deverá procurar reforçar sua identificação com o eleitorado órfão de Lula.