Não, eu não vou falar de política. Juro. Que pra isso tem gente muito mais qualificada aqui. Dos dois lados, inclusive. A única coisa que eu vou pedir pra minha editora é pra ela colocar “Ele, não” lá em cima do texto. Como título. Só pra constar… Porque, né?, não custa repetir. Mantra budista. Mesmo que eu não vá desenvolver o tema. Mesmo que na verdade eu esteja falando de um simples rapaz. Não, não foi isso que eu quis dizer. Ninguém é simples. Todo mundo é complexo. Mas tem umas complexidades que a gente prefere fazer maratona de série, ou encarar uns russos. E eu tô num lance seríssimo aqui com o Fiódor. Dostoiévski. E depois vou passar uns dias com o Gogol. Que meu mestre Jorge Mautner mandou.
O boy. Bom, a gente já se conhecia há algum tempo. Algum, não, muito. A gente se conhecia do colégio. E eu tava jantando com meu filho mais velho num japa da Gávea. Aí, o rapaz, que eu não via há uns 20 anos, entrou no restaurante, puxou uma cadeira — o que já configura uma quebra da regra número um do “Estatuto de encontros casuais em restaurantes”, que é “nunca sente na mesa de uma dupla de mãe e filho — ou qualquer outra dupla — a não ser que você faça parte da primeira divisão de afetos dos comensais”. Por primeira divisão, entenda-se: minha mãe, meu outro filho e a Priscila Tossan — que eu só conheço de um dia em que a gente se esbarrou no metrô, mas que atualmente é a coisa mais emocionante da televisão, de modo que na minha existência 2018 ela tá com aquele crachá ultra vip mega plus de trânsito livre, leve e solto.
Pronto, já não sei do que eu tava falando. Começo um assunto especifico: Escolhas, E maiúsculo, Ele, Não, qualquer coisa menos Ele, e quando me dou conta tô lá no The Voice. Sim, eu sei. Tenho dificuldade de fechar os parênteses. Sou prolixa. Dispersa. Adepta de associações aleatórias altamente exóticas e particulares. O sol em Escorpião com um candidato, a lua em Libra com outro, e o ascendente, que agora eu esqueci qual é, com um terceiro, com menos chance. Esquece a última frase. Que eu não vou falar de política.
Que eu vou falar de amor. Eu sou uma mina apaixonada. Sei que isso não tem a menor relevância num ano tão decisivo pra nossa democracia, mas é que ando meio hippie, sabe? Achando que ter coragem de gostar é tão revolucionário quanto ser brasileira de forma incondicional, quanto me posicionar politicamente, quanto conversar com meu menino de oito anos sobre paciência, desigualdade e empatia.
Principalmente empatia. O meu amigo da escola que se sentou na mesa, onde eu — branca, privilegiada e com dinheiro pra jantar fora — me alimentava com o meu filho grande, chamou o garçom de “queridão”, e aquilo foi imenso. “Queridão, me vê uma Coca Zero com gelo e sem limão?” Sem o por favor, palavrinha magica que é só sucesso desde 1654 (inventei a data, tá, historiadores?). Foram dez minutos infinitos.
O “Ele, não” não diz respeito a um candidato, apenas. O “Ele, não” é contra gente que chama trabalhador de “queridão”, contra gente que desiste do amor da vida, contra gente que se fecha em condomínios e também em si e em seus iguais, contra gente que nunca ouviu Racionais, João Gilberto e Priscila Tossan.
Mas ó: ainda dá tempo.
Fonte: O Globo
Créditos: Maria Ribeiro