A despeito das reformas e medidas que estão sendo tocadas pelo Congresso Nacional, como a Previdência, em um ritmo mais acelerado do que o previsto pelo próprio mercado, a forma beligerante como o presidente da República, Jair Bolsonaro, tem conduzido os primeiros meses de sua gestão poderá ter reflexos na economia, com riscos de comprometer ainda mais o baixo crescimento previsto para o País.
A avaliação é do cientista político Rafael Cortez, da Tendências Consultoria, que, em entrevista à TV Estadão e ao Broadcast Político, falou sobre o risco das ações do mandatário que interferem na autonomia de órgãos como a Receita Federal, a Polícia Federal e o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), rebatizado de Unidade de Inteligência Financeira, agora vinculado ao Banco Central.
Além dos impactos econômicos, Cortez destaca que o presidente não conseguiu fazer de seu partido, o PSL, uma força política capaz de frear o surgimento de nomes – alguns ‘outsiders’ – com potencial para disputar a sua sucessão presidencial. Com isso, o bloco da campanha presidencial de 2022 já começa a se colocar no cenário, antecipando a discussão ainda no primeiro ano de mandato.
“Na prática, deve haver novamente um risco de fragmentação dentro da centro-direita, uma bolsonarista, e outra mais tradicional”. Para ele, o conflito entre Bolsonaro e o governador de São Paulo, o tucano João Doria, é o que mais sintetiza esse momento, mas ainda há espaço para alguém de fora do sistema político, como o apresentador de TV Luciano Huck, que recentemente fez críticas ao governo de Bolsonaro e o dissociou da chamada renovação política.
“O Brasil enfrenta um quadro de crise política, de polarização, e estamos na fronteira entre escolhas políticas e perda de autonomia de algumas organizações. Esse ponto tem uma implicação econômica”, diz o analista, citando o chamado “custo Bolsonaro” e destacando que esse risco vem via incerteza política muito elevada.
“A maneira de o presidente enxergar o exercício da política é muito personalista e me parece que não contribui para a qualidade da política pública, para uma organização de poderes mais plural, e deve ter implicações negativas, inclusive na política externa”, afirmou, exemplificando com a indicação do filho do presidente, deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), para assumir o posto de embaixador em Washington, nos EUA. Para Rafael Cortez, uma eventual derrota na proposta, que terá de passar pelo crivo do Senado Federal, será debitada na conta pessoal de Bolsonaro.
Oposição
No campo da oposição, Rafael Cortez diz que a dependência da figura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) por parte da esquerda dificulta a ascensão e o protagonismo do grupo. Segundo ele, a esquerda deve ser mais do que a contraposição ao governo e precisa ser capaz de propor soluções e alternativas viáveis em um contexto de crise econômica.
“A oposição não consegue muito mais do que fazer barulho. A esquerda tem dificuldade de organizar o campo, o que sugere dificuldades eleitorais relevantes para o pleito municipal de 2020 e o presidencial de 2022”.
Meio ambiente
Sobre a retórica ambiental do governo, que já foi criticada publicamente por dois ex-ministros da Agricultura – Kátia Abreu e Blairo Maggi -, Rafael Cortez diz que as declarações e ações em relação ao meio ambiente vêm prejudicando a imagem do Brasil no exterior. “O chefe do Executivo, de uma nação como o Brasil, precisa ter diálogo amplo com diferentes forças políticas do exterior. Essa retórica exacerbada acaba deslegitimando a própria agenda do governo, não só na questão ambiental, e é muito negativa”.
Fonte: Terra
Créditos: Terra