Não subestimemos o golpe no Brasil. Ele é sofisticado. Aliás, devíamos ter orgulho disso. Países atrasados como a Turquia ainda sofrem golpes militares, conceitualmente toscos e por isso mesmo relativamente fáceis de serem vencidos. Nôs, não. Nós somos um país avançado!
Não creio que o governo da Turquia tenha armado um golpe contra si mesmo, porque neste caso seria absurdo ele reprimir os golpistas que, em tese, seriam seus aliados. Mas ele pode ter estimulado os golpistas a tentarem a sorte, já imaginando a oportunidade de dar a volta por cima e se livrar de seus inimigos.
Por outro lado, como ele poderia prever que a população iria às ruas defendê-lo, e que mesmo os partidos de oposição cerrariam fileiras a seu lado, contra o golpe?
Enfim, o golpe na Turquia usou técnicas ultrapassadas. Um golpe moderno precisa seguir o modelo brasileiro: ser construído paulatinamente, para que se consolide de maneira hegemônica, antes, na opinião pública.
O golpe no Brasil simboliza uma nova era de golpes no mundo. Governantes que não forem palatáveis ao grande capital, serão destituídos por qualquer conspiraçãozinha vagabunda que consigam apoio dos parlamentos. E o apoio dos parlamentos, consegue-se com relativa facilidade quando se constrói uma boa campanha midiática.
Os parlamentares, à diferença de um presidente, não tem força individual para enfrentar a mídia.
Entretanto, o golpe no Brasil, mesmo sofisticado, tem seus defeitos e contradições. Ele precisa da mídia, por exemplo. Durante os primeiros dias de governo, a imprensa até tentou disfarçar, fazendo algumas críticas, derrubando alguns ministros. Era uma espécie de lua-de-mel às avessas.
Com Temer, a lua-de-mel não veio nos primeiros dias de governo e sim depois. De umas semanas para cá, temos testemunhado uma guinada impressionante da imprensa nacional.
A crise econômica acabou. Os jornalões agora estampam manchetes positivas e os colunistas econômicos destacam o retorno das boas expectativas.
A Lava Jato parece ter ameaçado o governo, nos primeiros dias, apenas porque ela notou que este alimentava a ilusão de impor um pouco de ordem ao golpismo judicial. Foi uma escaramuça entre golpistas. Já passou.
É um golpe sofisticado, mas depois de dois anos de Lava Jato, tudo se tornou bem previsível. Para amarrar a narrativa, as delações que envolvem tucanos são vazadas antes mesmo de acontecerem, num contexto bastante controlado. Assim a imprensa dá algumas manchetes: “fulano delatará Serra”, “sicrano delatará Aloysio Nunes”, “beltrano delatará Alckmin”. É divertido ver a imprensa sair do futuro do pretérito, quando abusava dos “fulano teria dito”, “sicrano teria relatado que viu um petista roubando uma velhinha cega”, para o uso do verbo no futuro. Com certeza, é uma evolução! Ela está mais confiante!
As delações da Lava Jato são como vírus contagiosos, que devem ser manipulados por uma equipe especializada, usando trajes especiais.
Hoje a equipe da Lava Jato comunicou à imprensa que tentará indiciar Lula por tentativa de obstrução da Lava Jato. A obsessão por Lula é algo impressionante. A Lava Jato vai atrás do sítio de Lula, fica durante semanas vazando intimidades do ex-presidente, pratica todo o tipo de brutalidade contra ele e sua família, expondo telefonemas íntimos na grande imprensa, e quando o presidente tenta se defender, a Lava Jato tenta indiciá-lo por “obstrução de justiça”!
Que justiça, é importante se perguntar?
Não é preciso ser vidente que as próximas semanas serão decisivas para Michel Temer.
A Lava Jato deve voltar a produzir conteúdo pró-golpe.
A tortura imposta à Marcelo Odebrecht, há mais de um ano preso na masmorra de Sergio Moro, e ao casal Santana (João e Mônica), deve ter sido intensificada para que possa subsidiar um ataque final antes da votação do impeachment.
Gilmar Mendes também deve estar se movimentando, para oferecer também alguma carne às feras.
A Globo, enquanto isso, faz dobradinha com o ministro da Justiça sobre a prisão de “suspeito de terrorismo”, em que meia dúzia de paspalhões cujo único crime foi acessar sites do Estado Islâmico, são oferecidos à mídia como bandidos perigosos.
Pior: o ministro da Justiça cita a deportação do professor de física da UFRJ e cientista Adlène Hicheur, um caso ridículo de falsa acusação, para afirmar à imprensa:
“Com a prisão deles e a deportação [do professor] nós afastamos os dois únicos focos, que já estavam sendo rastreados, de possibilidade ainda que remota de terrorismo das Olimpíadas”
Fonte: http://www.ocafezinho.com/
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