O governo enfrentará dificuldades para aprovar no Congresso o pacote de medidas de ajuste fiscal, anunciado anteontem junto com a ampliação do rombo nas contas públicas de 2017 a 2020, na avaliação de líderes governistas e dos partidos da base. As medidas já enfrentam também forte resistência dos servidores públicos. E praticamente todo o conjunto de propostas está nas mãos do Legislativo: das 11 medidas, nove delas — com impacto estimado em R$ 18 bilhões no orçamento da União do próximo ano — terão de ser aprovadas pela Casa, na forma de projetos ou medidas provisórias (MPs). São propostas que visam a aumentar receitas e reduzir gastos, sobretudo com o funcionalismo, para ajudar no fechamento das contas públicas.
Além disso, a própria revisão das metas, de déficit primário de R$ 139 bilhões e R$ 129 bilhões neste e no próximo ano, respectivamente, para R$ 159 bilhões, já enfrenta um clima de animosidade na Comissão Mista de Orçamento — primeiro campo de batalha. Os vetos à Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), num total de 67, irritaram os integrantes do colegiado, que agora exigem explicações do governo. São assuntos autônomos, mas, sem resolver essa questão política, nada avançará na comissão, disse o relator da LDO, deputado Marcus Pestana (PSDB-MG).
DÉFICIT DE MEIO TRILHÃO DE REAIS ATÉ 2020
Até 2020, segundo a proposta de revisão de metas fiscais anunciadas nesta terça-feira, o governo federal acumulará déficit de R$ 522 bilhões. O aumento do rombo fiscal previsto para este ano abre espaço à liberação de R$ 1 bilhão extra em emendas parlamentares, segundo cálculos da consultoria de Orçamento da Câmara.
O vice-líder do PRB, deputado Beto Mansur (SP), admitiu que será preciso muita negociação para convencer os partidos da base de apoio a aprovar as medidas de ajuste fiscal. Segundo ele, haverá resistência dos parlamentares especialmente em relação aos dois itens que afetam os servidores públicos: o adiamento dos reajustes salariais e a elevação da contribuição previdenciária de 11% para 14%:
— O pessoal ainda está lendo as medidas. Mas aumento de alíquota e retenção nos reajustes sempre dão ruído na base. Vamos ter que conversar e convencer.
O líder do PP na Câmara dos Deputados, Arthur Lira (AL), disse que há uma enorme insatisfação na base de apoio ao governo, que está perdendo todas as batalhas no Congresso. Ele lembrou que nem medidas provisórias o Executivo consegue aprovar como quer, casos do Programa Especial de Regularização Tributária (Refis) e da reoneração da folha de pagamento, além das dificuldades à vista em relação à nova Taxa de Longo Prazo (TLP), que vai corrigir os empréstimos do BNDES.
— Está faltando articulação política, e as coisas vão piorar. As metas fiscais deverão ser aprovadas, até porque o governo não tem caixa. Mas vai ser um terror para aprovar as outras medidas — disse o deputado.
— Vamos enfrentar resistências da oposição e de um ou outro da base. É natural ter posição contrária numa base grande como a nossa — disse o líder do governo no Congresso, Andre Moura (PSC-SE).
Os servidores públicos federais prometem greves, manifestações e pressão no Congresso Nacional contra as medidas. Todas as ações do pacote de ajuste fiscal que atingem os servidores públicos precisam passar pelo Legislativo.
— Não concordamos com essa política que concentra a renda e alarga a faixa de empobrecimento no país. Vamos lutar com todos os trabalhadores e categorias unidos. A nossa pressão é no Congresso, nas ruas, e vamos fazer greve dentro dos órgãos públicos contra as medidas. O que couber ação na Justiça, também vamos fazer — disse o diretor da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condserf), Valter Cezar Dias.
TEXTO SERÁ ENVIADO ESTA SEMANA
Mesmo diante de tanta pressão, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, afirmou ontem que confia na aprovação do pacote de medidas de ajuste fiscal pelo Congresso. Ele espera enviar o texto ainda esta semana à Câmara:
— Estive lá com o comando da Câmara (Rodrigo Maia, presidente da Casa) e com os principais líderes, e discutimos um pouco a situação fiscal, a possível mudança da meta (antes do anúncio) e as medidas necessárias para que essa revisão não fosse muito maior. Agora, evidentemente, o Congresso é soberano. Vivemos numa democracia, e compete ao Congresso dar a última palavra. Eu espero aprovação sim.
Em evento em São Paulo, o presidente Michel Temer comentou que a revisão da meta vai contribuir para que o governo não aumente impostos. Ele defendeu as reformas, disse que seu governo está fazendo em “15 meses o que não foi feito em 20 anos” e criticou a oposição que, em suas palavras, “não discute conteúdo nem o mérito” de suas medidas:
— Agora o Brasil tem rumo. E é essa pressa que move governo de apenas 15 meses, com mais 15, 16 pela frente. Estamos fazendo em 17 meses o que em 20 anos não se fez.
Fonte: O Globo