A aproximação entre Bolsonaro e o economista Paulo Guedes (na foto acima) foi decisiva ainda na fase de pré-candidatura. Foi a partir dali que ele começou a ser levado a sério pelo chamado “mercado” e a ser considerado um candidato viável.
Bolsonaro passou a tratar Guedes como seu “guru”, o “posto Ipiranga” da campanha, em referência à propaganda da rede de postos de combustíveis. Era uma sinalização ao empresariado de que o militar reformado, conhecido por defender uma agenda estatizante, estava disposto a trocá-la por um projeto de cunho liberal.
“Apesar de Paulo Guedes ter falado publicamente muita besteira do ponto de vista eleitoral, a exemplo da tarifa única do Imposto de Renda, a presença dele atraía um apoio importante de parte do empresariado”, afirmou o cientista político Rudá Ricci.
“Por outro lado, a chegada do general [Hamilton] Mourão como vice na chapa consolidou um outro lado. Para um setor mais conservador de direita, essa junção de militar linha-dura com uma concepção ultraliberal econômica começou a parecer muito vantajosa”, segundo Ricci.
Eventual superministro da Fazenda, Guedes defende um programa radical de privatizações, que não encontra apoio nem no próprio Bolsonaro, que defendeu manter “estatais estratégicas”.
Apesar da recessão, economia ficou de fora
Pouco se falou, porém, de outras propostas do candidato ou de seu guru –por exemplo, para reduzir o desemprego no país (que atualmente atinge 12,7 milhões de pessoas) e ajudar na retomada do crescimento econômico. O fato indica uma contradição: na eleição que ocorre após a maior recessão da história do país, pouco se falou de economia.
“Em 2014, o debate econômico dominou as eleições”, afirmou o economista Armando Castelar, coordenador do setor de economia aplicada do Ibre-FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas). “Déficit fiscal ou não, independência do Banco Central e outros temas econômicos ocuparam a maior parte da campanha. Em 1994, a campanha foi sobre o Plano Real. Em 1998, sobre a desvalorização do real. Em 2002, tivemos o compromisso do Lula com o mercado. Em 2006, estavam no centro da polêmica as privatizações. E por aí vai”, afirmou.
Um “outsider” (mesmo no sétimo mandato)
De maneira difusa, a recessão influenciou o humor do eleitor, que se voltou contra atores políticos tradicionais –a exemplo dos maiores partidos, como PT, MDB e PSDB, que comandaram ou tiveram participação nos rumos econômicos do país durante a crise, mais acentuada a partir de 2014.
Mesmo ocupando seu sétimo mandato como deputado federal, Bolsonaro obteve sucesso ao se vender como “outsider”, alguém de fora do sistema.
“Bolsonaro foi muito beneficiado sem a entrada de alguém de fora da política na eleição. Chegaram a aparecer ‘outsiders’, como Joaquim Barbosa e Luciano Huck, que acabaram não entrando no jogo político“, disse o cientista político Malco Camargos. “Sobrou ele de ‘novidade’, já que era um nome do baixo clero meio à margem do sistema político tradicional.”
Contra o PT e contra “todos que estão aí”
“Não temos como entender a onda conservadora sem entender o antipetismo, e vice-versa”, avalia Camargos.
“Nas eleições passadas, em 2016, você teve a eleição do antipetismo. Naquelas eleições, o partido era o culpado por tudo: crise e corrupção. O resultado foi desastroso para a sigla, que perdeu muitas cadeiras nas câmaras municipais e prefeituras. E tudo indicava que o mesmo ia acontecer com os governos estaduais e no Congresso em 2018.”
“Mas aí continuou a Operação Lava Jato. O novo governo, que envolvia uma coalizão de MDB, PSDB e DEM, principalmente, não conseguiu dar a resposta que se esperava para a crise econômica, e a frustração tornou-se suprapartidária”, afirma o cientista político.
Os escândalos atingiram praticamente todos os políticos de projeção nacional, todos os partidos importantes, e o eleitor começou a não ver muita diferença entre o PT, que já estava marcado para morrer, e as outras siglas e seus representantes.