Opinião

Bolsonaristas atacam Motta mas não há clima para a anistia na Câmara - Por Nonato Guedes

Hugo Motta
Foto: Reprodução/Câmara dos Deputados


O alvo preferencial dos bolsonaristas no ato promovido ontem em São Paulo a pretexto de reclamar anistia para os envolvidos no 8 de janeiro em Brasília foi o presidente da Câmara, o deputado paraibano Hugo Motta, do Republicanos, pressionado a pautar o projeto de autoria do deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), que beneficia o próprio ex-presidente Jair Bolsonaro, atualmente inelegível para concorrer às eleições de 2026. Hugo Motta tem evitado antecipar o que fará com o projeto de anistia e, diante do bombardeio bolsonarista, fez uma articulação nos bastidores para que os líderes partidários não assinassem o requerimento de urgência para o tema. Com isso, o PL está tendo que coletar no varejo as assinaturas e todo o processo torna-se mais lento. “Se ele (Hugo Motta) segurar o projeto, a gente faz o próximo ato em João Pessoa”, declarou Sóstenes, ontem, em tom de bravata, referindo-se à capital do Estado onde o parlamentar nasceu.
Ao mesmo tempo, o líder do PL na Câmara assegurou que 182 deputados já manifestaram apoio ao projeto e que a marca de 257 assinaturas está próxima de ser alcançada, podendo passar de 300. Esse prognóstico não confere com a opinião de outros líderes na Câmara, que, “em off”, revelaram à “Folha de São Paulo” ainda não ver clima para o avanço do projeto de anistia, não obstante a carga contra Motta, que teve apoios de deputados bolsonaristas para se eleger à sucessão de Arthur Lira (PP-AL). Lideranças de esquerda avaliam que a estratégia pode ser um tiro no pé e isolar ainda mais o PL no Parlamento. O líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), que é natural da Paraíba, afirmou: “É uma tática de desespero. Se acham que Hugo vai pautar alguma coisa esta semana depois de tentarem emparedar ele, estão errados”. Por sua vez, Mário Heringer (MG), líder do PDT, falou em desserviço institucional. “Atacar Hugo Motta é um desserviço institucional, mantém a atitude transgressora contra as instituições e a Constituição. O movimento do encontro é legítimo, mas mais uma vez errático”, acrescentou.
Na manifestação de ontem em São Paulo, ficou claro que Hugo Motta passou a ser o alvo principal de deputados de direita e apoiadores de Bolsonaro. O pastor Silas Malafaia, escalado para fazer o ataque a Motta, poupando os demais parlamentares presentes de desgaste com o presidente da Câmara, mandou ver: “O senhor presidente da Câmara, Hugo Motta, disse: “eu sou árbitro, juiz”. Só se for juiz iníquo, porque ele pediu para os líderes partidários para não assinar urgência do projeto de anistia. Espero, Bolsonaro, se Hugo Motta estiver assistindo isso aqui, que ele mude, porque você, Hugo Motta, está envergonhando o honrado povo da Paraíba”. Depois da última reunião de líderes na quinta-feira, o líder do PL informou que Motta, ao pedir aos líderes para não assinar o requerimento de urgência, forçou o partido a ter que conseguir no varejo as assinaturas necessárias para que o projeto vá direto para o plenário. No carro de som, o líder do PL não mencionou diretamente o nome de Motta, mas deu o sinal para que apoiadores aumentassem a pressão sobre deputados que ainda não tenham se posicionado, ao prometer um placar de indecisos.
Conforme a “Folha”, Sóstenes anunciou que nesta segunda-feira, 7, serão publicados os nomes e fotos dos que apoiam a anistia para que os bolsonaristas agradeçam aos deputados. Mas que serão divulgados, também, nomes e fotos dos que ainda estão indecisos. E prometeu: “Até quarta (9), presidente Bolsonaro, vamos ter, sim, as 257 assinaturas, com a ajuda dos governadores Ronaldo Caiado, Romeu Zema, Tarcísio de Freitas e Wilson Lima. E aí será pautado, querendo ou não a Câmara dos Deputados”. A decisão final da pauta do plenário é do presidente Hugo Motta, mas com o número de assinaturas, o requerimento de urgência já deve ir direto para lá”. No mesmo tom adotado pelo líder do PL, o vice-presidente da Casa, Altineu Côrtes (PL-RJ), declarou que Motta será pautado pela maioria do Poder Legislativo. Em seguida, chamou um a um dos sete governadores no carro de som para perguntar se os seus partidos apoiavam a pauta, ao que todos responderam “sim”. Líderes partidários aliados de Moitta negam ter havido um pedido para que não fosse assinado o requerimento, mas compartilham do entendimento de que não é o momento político para discutir a proposta. Dizem que é preciso apoiar o presidente da Casa e dividir com ele essa pressão, que agora está redobrada.
Por isso, até nos partidos de governadores que estiveram presentes no carro de som de Bolsonaro na Avenida Paulista (Republicanos, União Brasil, PP e PSD), os líderes não assinaram o documento. O ato teria reunido 55 mil pessoas, conforme levantamento do Datafolha e, para aliados de Motta, reforça a pressão na Casa como um todo, sobretudo a um ano da eleição, mas consideram que isso não será suficiente para provocar uma mudança de chave por parte do paraibano e argumentam que este é o ônus de presidir a Casa. Entre membros do governo Lula, a ministra Gleisi Hoffmann, das Relações Institucionais, disse que os ataques a Motta e a ministros do STF no ato endossam o acerto do Judiciário no caso da tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro. Gleisi expressou: “Na boca dos golpistas, a palavra anistia se reduz a uma farsa, um projeto de lei que visa a impunidade de réus que nem foram julgados ainda. Querem apagar os fatos que aterrorizaram o país, mas não são capazes de esconder a violência e o ódio que continuam guiando suas ações”. O ministro Jorge Messias, da AGU, classificou o ato em São Paulo como de “extrema direita” e apontou para um fracasso da manifestação, “que não teve nenhuma bandeira em defesa da soberania nacional, dos trabalhadores e empresários ou de projetos fundamentais ao povo”.