Bastidor: Temer reúne peedebistas e Adams, da AGU, depois de carta-bomba

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Encontro no Palácio do Jaburu entrou pela madrugada e começou depois da divulgação da correspondência em que o vice escancara o lado B da relação entre PMDB e Planalto
Por volta das 23h45 da segunda-feira (7), o vice-presidente Michel Temer recebeu na residência oficial, o Palácio do Jaburu, o ministro Luís Inácio Adams, da Advocacia Geral da União (AGU). Lá, o esperavam pelo menos outros dois pesos-pesados do PMDB – Moreira Franco e Eliseu Padilha, que se demitiu da Secretaria da Aviação Civil.

Teria cabido a Adams a tarefa de apaziguar o clima entre a presidente Dilma e o vice – uma espécie de missão impossível já que, horas antes, Temer detonou a já débil relação entre o PMDB e o PT ao expor em sua conta no Twitter, na noite da segunda-feira (7), parte do conteúdo de uma carta endereçada a presidente da República, que segundo ele teria sido vazada pelo Planalto.

Dois dos principais negociadores do Planalto – Jaques Wagner, da Casa Civil, e Edinho Silva, da Comunicação – ficaram de fora do encontro com o vice-presidente porque teriam armado nos últimos dias, logo depois de Eduardo Cunha (PMDB) aceitar o pedido de impeachment contra Dilma Rousseff, algumas situações para forçar um suposto apoio de Temer a Dilma.

A carta de Temer para Dilma teria sido publicada em primeira mão no Blog do Moreno, de Jorge Bastos Moreno, do jornal “O Globo” (que reproduzimos aqui). Mas horas antes o blogueiro RIcardo Noblat, também de “O Globo”, conhecido opositor do governo Dilma, já tuitava algumas mensagens cifradas sugerindo a Temer que mandasse uma carta a Dilma, o que reforça a possibilidade de o vazamento da correspondência entre os dois mandatários não ter partido do Planalto, como acusou horas depois Temer em uma rede social. Na carta, Temer lava a roupa suja de quase cinco anos de relacionamento com a presidente Dilma. Pontua os momentos em que se postou como fundamental para apaziguar os ânimos entre o Planalto e o Congresso, as vezes em que foi preterido para dar espaço a outros petistas e até mesmo a peemedebistas – Leonardo Picciani (RJ), líder do partido na Câmara, foi citado nominalmente.

Temer começa a carta repreendendo Dilma pela insistência nos últimos dias em mostrar a confiança e a fidelidade no vice-presidente.

O presidente do PMDB desmente a presidente no trecho seguinte ao dizer que ela nunca confiou nele ou no seu partido. Para sustentar a falta de confiança, o vice lista momentos em que conseguiu dobrar o PMDB a favor de Dilma.

Figura decorativa

Agência BrasilAdams, da AGU, se encontrou com Temer e outros peedebistas depois de o vice-presidente escancarar a crise com o Planalto
Com todas as letras, Temer escreveu “passei os quatro primeiros anos do governo como vice decorativo”, citando as vezes em que foi acionado pelo Planalto apenas para apagar incêndios. Ele também reclamou da forma como seus grandes aliados, Padilha e Moreira Franco, foram escanteados no governo.

Como numa espécie de DR (sigla para a conhecida discussão de relação entre os casais) em praça pública, Temer dá sinais de que desembarca com os dois pés do governo, deixa Dilma se afogar na crise política sozinha, tudo isso na esperança de, passado o julgamento do processo de impeachment contra Dilma no Congresso, levar os chinelos e a escova de dentes para o Palácio do Alvorada.

Leia na íntegra a correspondência enviada por Temer a presidente Dilma.

São Paulo, 07 de Dezembro de 2.015.

Senhora Presidente,

“Verba volant, scripta manent”.

Por isso lhe escrevo. Muito a propósito do intenso noticiário destes
últimos dias e de tudo que me chega aos ouvidos das conversas no Palácio. Esta é uma carta pessoal. É um desabafo que já deveria ter feito há muito tempo.

Desde logo lhe digo que não é preciso alardear publicamente a necessidade da minha lealdade. Tenho-a revelado ao longo destes cinco anos. Lealdade institucional pautada pelo art. 79 da Constituição Federal. Sei quais são as funções do Vice. À minha natural discrição conectei aquela derivada daquele dispositivo constitucional.

Luis Macedo/Câmara dos Deputados – 15.9.15Sobrou até para Picciani, líder do PMDB na Câmara, no desabafo de Temer
Entretanto, sempre tive ciência da absoluta desconfiança da senhora e do seu entorno em relação a mim e ao PMDB. Desconfiança incompatível com o que fizemos para manter o apoio pessoal e partidário ao seu governo. Basta ressaltar que na última convenção apenas 59,9% votaram pela aliança. E só o fizeram, ouso registrar, por que era eu o candidato à reeleição à Vice.

Tenho mantido a unidade do PMDB apoiando seu governo usando o prestígio político que tenho advindo da credibilidade e do respeito que granjeei no partido. Isso tudo não gerou confiança em mim, Gera desconfiança e menosprezo do governo.

Vamos aos fatos. Exemplifico alguns deles.

1. Passei os quatro primeiros anos de governo como vice decorativo. A Senhora sabe disso. Perdi todo protagonismo político que tivera no passado e que poderia ter sido usado pelo governo. Só era chamado para resolver as votações do PMDB e as crises políticas.

2. Jamais eu ou o PMDB fomos chamados para discutir formulações econômicas ou políticas do país; éramos meros acessórios, secundários, subsidiários.

3. A senhora, no segundo mandato, à última hora, não renovou o Ministério da Aviação Civil onde o Moreira Franco fez belíssimo trabalho elogiado durante a Copa do Mundo. Sabia que ele era uma indicação minha. Quis, portanto, desvalorizar-me. Cheguei a registrar este fato no dia seguinte, ao telefone.

4. No episódio Eliseu Padilha, mais recente, ele deixou o Ministério em razão de muitas “desfeitas”, culminando com o que o governo fez a ele, Ministro, retirando sem nenhum aviso prévio, nome com perfil técnico que ele, Ministro da área, indicara para a ANAC.
Alardeou-se a) que fora retaliação a mim; b) que ele saiu porque faz parte de uma suposta “conspiração”.

5. Quando a senhora fez um apelo para que eu assumisse a coordenação política, no momento em que o governo estava muito desprestigiado, atendi e fizemos, eu e o Padilha, aprovar o ajuste fiscal. Tema difícil porque dizia respeito aos trabalhadores e aos empresários. Não titubeamos. Estava em jogo o país. Quando se aprovou o ajuste,
nada mais do que fazíamos tinha sequencia no governo. Os acordos assumidos no Parlamento não foram cumpridos. Realizamos mais de 60 reuniões de lideres e bancadas ao longo do tempo solicitando apoio com a nossa credibilidade. Fomos obrigados a deixar aquela coordenação.

6. De qualquer forma, sou Presidente do PMDB e a senhora resolveu ignorar-me chamando o líder Picciani e seu pai para fazer um acordo sem nenhuma comunicação ao seu Vice e Presidente do Partido. Os dois ministros, sabe a senhora, foram nomeados por ele. E a senhora não teve a menor preocupação em eliminar do governo o Deputado Edinho Araújo, deputado de São Paulo e a mim ligado.

7. Democrata que sou, converso, sim, senhora Presidente, com a oposição. Sempre o fiz, pelos 24 anos que passei no Parlamento. Aliás, a primeira medida provisória do ajuste foi aprovada graças aos 8 (oito) votos do DEM, 6 (seis) do PSB e 3 do PV, recordando que foi aprovado por apenas 22 votos. Sou criticado por isso, numa visão
equivocada do nosso sistema. E não foi sem razão que em duas oportunidades ressaltei que deveríamos reunificar o país. O Palácio resolveu difundir e criticar.

8. Recordo, ainda, que a senhora, na posse, manteve reunião de duas horas com o Vice Presidente Joe Biden – com quem construí boa amizade – sem convidar-me o que gerou em seus assessores a pergunta: o que é que houve que numa reunião com o Vice Presidente dos Estados Unidos, o do Brasil não se faz presente? Antes, no episódio
da “espionagem” americana, quando as conversar começaram a ser retomadas, a senhora mandava o Ministro da Justiça, para conversar com o Vice Presidente dos Estados Unidos. Tudo isso tem significado absoluta falta de confiança;

9. Mais recentemente, conversa nossa (das duas maiores autoridades do país) foi divulgada e de maneira inverídica sem nenhuma conexão com o teor da conversa.

10. Até o programa “Uma Ponte para o Futuro”, aplaudido pela sociedade, cujas propostas poderiam ser utilizadas para recuperar a economia e resgatar a confiança foi tido como manobra desleal.

11. PMDB tem ciência de que o governo busca promover a sua divisão, o que já tentou no passado, sem sucesso. A senhora sabe que, como Presidente do PMDB, devo manter cauteloso silencio com o objetivo de procurar o que sempre fiz: a unidade
partidária.

Passados estes momentos críticos, tenho certeza de que o País terá tranquilidade para crescer e consolidar as conquistas sociais. Finalmente, sei que a senhora não tem confiança em mim e no PMDB, hoje, e não terá amanhã.

Lamento, mas esta é a minha convicção.

Respeitosamente, \ L TEMER
A Sua Excelência a Senhora
Doutora DILMA ROUSSEFF
DO. Presidente da República do Brasil
Palácio do Planalto
Brasília, D.F.

* Colaborou Paula Pacheco, de São Paulo