Ao cravar uma faca no abdômen do candidato à Presidência da República do PSL, Jair Bolsonaro, o agressor Adélio Bispo de Oliveira expôs a fragilidade na segurança da campanha de sucessão ao Palácio do Planalto de 2018 – uma das mais conturbadas da história da República – e pôs as autoridades federais em alerta máximo.
Temendo uma intensificação de conflitos nas ruas do país entre grupos opositores após o atentado ao líder das intenções de voto na corrida presidencial, além de novos ataques aos concorrentes, o governo federal realizou ainda nessa quinta-feira (6/9) duas reuniões emergenciais para tratar do reforço da proteção a candidatos e eleitores. Nas redes sociais, a tensão aumentou e pode transbordar para o mundo real, adverte especialista.
O presidente Michel Temer (MDB) se reuniu com o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, e determinou o aumento do efetivo da Polícia Federal que atua na escolta dos presidenciáveis. O número de agentes nessa função não é revelado, por motivo de segurança, mas desde a edição do Decreto nº 6.381/2008, assinado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), os postulantes podem requerer a proteção extra e contar, inclusive, com o apoio de carros blindados durante todo o período eleitoral. Temer também determinou que as causas do episódio sejam apuradas a fundo. A investigação está a cargo da PF, que já instaurou inquérito policial e prendeu, além de Adélio Bispo de Oliveira, outro suspeito.
O atentado a Bolsonaro também dominou a pauta da reunião agendada previamente e realizada na noite dessa quinta (6) pelo Comando do Exército Brasileiro e do Ministério da Defesa. A pasta deve anunciar medidas extras de segurança em torno da campanha eleitoral e nos dias de votação (7 de outubro no primeiro turno e 28 no segundo). O objetivo é proteger tanto candidatos quanto eleitores, bem como evitar embates entre grupos opositores e assegurar ao brasileiro o direito de ir às urnas e registrar o voto com tranquilidade. Algumas unidades da Federação solicitaram à Justiça Federal anteriormente apoio de tropas federais durante o pleito.
A democracia está sob risco para todos os candidatos nesta eleição”Fernando Francischini (PSL-PR), deputado federal e delegado da Polícia Federal, após visitar Bolsonaro na madrugada desta sexta-feira (7)
Delegado Francischini defende a intensificação da escolta federal dos presidenciáveis. Ele lembrou que o apoio dos colegas de corporação a candidatos no período eleitoral foi bastante criticado, mas destacou: a presença dos agentes da PF na atividade de campanha de Bolsonaro nessa quinta (6) foi fundamental para salvar a vida de seu correligionário.
“A PF agiu firme no primeiro momento. Tenho ouvido muita gente falando da equipe de segurança [da corporação], o que é um absurdo. Foi a equipe de segurança que evitou que ele [Bolsonaro] estivesse morto hoje”, disse Francischini. “Numa velocidade imensa, fizeram todos os procedimentos no caminho. Muitos médicos comentaram que o atendimento rápido da Polícia Federal, o procedimento correto no deslocamento, foi o que garantiu com que ele pudesse chegar com mais chances [de vida ao hospital]”, acrescentou.
Todo o custeio e a organização das viagens dos policiais envolvidos na segurança dos presidenciáveis, inclusive os gastos com reservas de hotel, é bancado pela própria corporação. Inicialmente, cada candidato teria uma equipe com 21 agentes, com previsão de aumento do efetivo a depender do local ou risco do evento.
A PF pretendia limitar a segurança dos representantes de partidos nanicos – com menos de cinco parlamentares na Câmara dos Deputados – a ocasiões específicas e previamente avisadas à corporação. Assim, nem todos os candidatos teriam policiais à disposição 24 horas por dia. Mas não foi confirmado se o plano está em prática. Além de Jair Bolsonaro, outros quatro presidenciáveis solicitaram a escolta, mas a corporação não informou o nome dos candidatos hoje protegidos pelos agentes federais.
Segundo a PF, o alto número de postulantes ao Planalto – 13 no total – e a disseminação de eventos espontâneos, como recepções nos aeroportos, são considerados os maiores desafios à proteção dos presidenciáveis.
Nível 1 de risco
Bolsonaro vinha sendo acompanhado por policiais federais em sua agenda há pelo menos um mês. O nome do PSL ao Planalto também fez uso de colete à prova de balas em vários atos públicos (foto em destaque), o que não ocorreu em Juiz de Fora (MG). Na véspera do ataque no município mineiro, o presidenciável participou de carreata no Distrito Federal, nas cidades de Taguatinga e Ceilândia, e também não vestiu o dispositivo de proteção.
Ao portal UOL, em agosto, o presidente do PSL, Gustavo Bebianno, afirmou que o candidato era de “nível 1 [máximo] de risco”, muito em função de suas posições polêmicas e por estar à frente das pesquisas eleitorais, o que justificaria medidas extras de segurança. No entanto, se o presidenciável com o maior aparato de proteção ao seu redor sofreu um atentado, os demais postulantes tampouco estão imunes – e isso disparou o sinal de alerta das autoridades federais para a necessidade de reforçar os mecanismos de segurança em torno dos candidatos.
As presidentes do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, e do Tribunal Superior Eleitoral, ministra Rosa Weber, expressaram preocupação com a violência durante a campanha – as duas Cortes estão no centro do processo eleitoral. Cármen Lúcia manifestou receio “com a garantia das liberdades dos candidatos e dos eleitores, qualquer que seja a posição ou a ideologia adotada por quem quer que seja e ainda que contrárias, como expressão de um processo eleitoral democrático, devendo ser renegada qualquer forma de violência ou de desrespeito aos direitos”.
“O Tribunal Superior Eleitoral repudia toda e qualquer manifestação de violência, seja contra eleitores, seja candidatos ou em virtude do pleito. As eleições são uma manifestação de cidadania por meio da qual o povo expressa sua vontade. Inaceitável que atitudes extremadas maculem conquista tão importante quanto é a democracia”, afirmou Rosa Weber.
À flor da pele
O clima belicoso da campanha eleitoral tomou conta das redes sociais e se intensificou com o atentado contra o candidato mais polêmico da corrida presidencial. Reações baseadas em emoções negativas tomaram de assalto o Facebook, Twitter, Instagram e outras plataformas virtuais após Bolsonaro ser esfaqueado. É o que mostra uma análise feita pelo diretor de Big Data da AP/Exata, Sérgio Denicoli, professor com pós-doutorado em comunicação digital pela Universidade do Minho, em Portugal.
Segundo ele, o atentado a Bolsonaro fez com que sentimentos negativos dessem a tônica aos embates entre os internautas. Tristeza, medo e raiva são as emoções mais à flor da pele. A confiança está numa curva decrescente e a alegria praticamente inexiste: está próxima do zero. Veja o gráfico:
A “análise de emoções” feita por Denicoli é baseada na teoria do professor norte-americano Robert Plutchik, a “Roda das Emoções”, que considera a existência de oito emoções básicas em todo sentimento humano: raiva, medo, tristeza, nojo, surpresa, curiosidade, aceitação e alegria.
“É difícil prever o reflexo dos acontecimentos de hoje [quinta-feira]. Mas temo que as emoções negativas possam transpor o mundo virtual e atingir o mundo real”. (Sérgio Denicoli, diretor da AP/Exata).
Quase setes horas após o atentado contra Bolsonaro, o cenário das emoções nas redes sociais mostrava-se pessimista, com tristeza, medo e raiva oscilando no primeiro lugar. “É um momento muito passional”, destacou Denicoli. “O sentimento de raiva pode estimular outros atos de violência. Há agressões muito fortes por parte dos internautas. Muitos podem querer vingar o ocorrido”, ressaltou.
A partir das análises gráficas feitas ao longo da quinta-feira (6), Denicoli viu que, a princípio, houve um sentimento entre os adversários de Bolsonaro de que tudo não passava de “armação”. Confirmado o atentado, as insinuações de que o PT estava por trás das agressões ganharam volume. “Ou seja: a dicotomia entre direta e esquerda ficou ainda maior”, observou o especialista.
Outro fator poderá ser resultado do carrossel de emoções visto no mundo virtual ao longo do dia. E ele será positivo para o candidato do PSL, segundo Denicoli. A tristeza pode resultar em empatia por Bolsonaro. “Tristeza é um sentimento que pode virar afeto, e é o que geralmente ocorre com quem é vítima. Isso certamente o beneficiaria”, concluiu.
Fonte: Metrópoles
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