O barulho de Anitta está ensurdecedor. Desde que se tornou uma das maiores celebridades do país, tudo o que faz vira notícia, até mesmo o seu silêncio. Depois de ser criticada por evitar discussões políticas importantes, ela viu durante a pandemia uma chance de expandir seus horizontes.
“Justo porque estou tão desesperada e desesperançosa com a situação política, resolvi falar de política”, ela diz. “É entender de que maneira a gente consegue mudar as coisas.”
Além da música, Anitta costuma ser notícia pelos possíveis namorados, porque usou um short curto demais ou por brigar com alguma celebridade. Nos últimos dias, contudo, foi manchete negando ter vontade de concorrer ao Alvorada e defendendo artistas de uma medida provisória que pode ser prejudicial ao setor. Também perguntou à advogada Gabriela Prioli sobre o governo.
Da mesma forma como quando se calava, Anitta foi atacada. De um lado, pelos fãs que acreditam que política não se mistura com entretenimento. De outro, por uma ala mais intelectualizada que a chamou de ignorante quando perguntou se os ministérios faziam parte do Judiciário.
“Recebi mensagens de amigos famosos, estudados me agradecendo, porque também não faziam a menor ideia”, diz. “Quem critica vive numa bolha e acha que todo mundo tem o mesmo acesso à informação.”
A polêmica pergunta saiu de uma das lives que ela anda fazendo, desta vez com a comentarista da CNN que ganhou fama no programa “O Grande Debate”. Elas conversaram sobre política nacional.
O objetivo, ela diz, é levar essas discussões a jovens, que em geral não se interessam por política. “Sempre falam num linguajar difícil para confundir a nossa cabeça e a gente nem querer saber”, diz. “E quanto menos a gente souber, menos a gente vai conseguir questionar as decisões deles.”
“Estou cagando para essas pessoas que criticam, estou fazendo o que acho importante. E nada melhor do que eu mostrar que também não entendo. Zombar de quem não sabe faz com que as pessoas se escondam, não queiram aprender.”
Anitta também fez uma live questionando o deputado Felipe Carreras sobre uma medida provisória que previa a isenção de pagamentos de direitos autorais a compositores. Depois da exposição aos 46,8 milhões de seguidores dela no Instagram, ele recuou.
Nesta semana, a cantora também promoveu a conscientização em outra área, a do meio ambiente. Ela fez uma live com outro deputado federal, Alessandro Molon, neste caso para aumentar a pressão contra a medida apelidada de MP da grilagem, que facilita a regularização fundiária no país e tem apoio da bancada ruralista. Ela chegou a comemorar no Instagram o adiamento da votação da medida na Câmara dos Deputados.
Na live com Molon, ela disse que a discussão era “independente de partido”. “Estou começando a entender agora o que é direita e esquerda, o que são os partidos. Então, não estou aqui para promover ninguém. Quero que as pessoas, principalmente a minha geração, sinta interesse na política e entenda de maneira fácil.”
Anitta diz que, depois da transmissão, ela foi bloqueada por deputados, que chegaram a trancar os comentários nas redes sociais para não serem atacados. De certa forma, a atuação da artista tem sido prática, já que sua formação política, ela diz, é nenhuma.
“Não sabia nada, absolutamente nada. Se aprendi na escola, não lembro. Me passaram muito rapidamente.”
Anitta estudou em escola pública e levava duas horas para ir de casa, em Honório Gurgel, onde foi criada na zona norte carioca, até a Tijuca, onde estudava. É daí que vem sua única memória ligada a política.
Isso porque, quando tinha uns 15 anos, participou de manifestações que fecharam ruas contra o corte do passe livre no transporte para estudantes. “Eu passei no concurso, era uma boa escola. Eu não tinha dinheiro para pagar as conduções. Sem esse cartão, não conseguiria chegar ao colégio.”
Sua madrinha política se tornou Gabriela Prioli. Elas se conheceram por causa do marido da advogada, o DJ Thiago Mansur, do duo eletrônico JetLag.
“Ela foi ao camarim, e eu a adorei de cara”, lembra Anitta. Desde então, elas viajam juntas, falam por telefone e vão à casa uma da outra. “Ela foi quem me ensinou tudo até eu decidir me posicionar.”
Quando Prioli estreou na TV, foi Anitta quem a ajudou. “Dei um conselho a ela, porque ela era tímida”, diz a cantora. “Quando você está com vergonha, finge que é outra pessoa. Finjo que sou a Mariah Carey, a Beyoncé, a Rihanna. Depois do primeiro programa, ela falou ‘arrasei, fingi que eu era a Anitta’.” Semana que vem, elas discutem fascismo e comunismo numa live.
Enquanto isso, Anitta toca em outro assunto na quarentena —não só no seu Instagram, onde também sabe ser “baixo calão, de biquíni, dançando e falando besteira”, mas na televisão. Ela é a estrela de “Anitta Dentro da Casinha”, que estreia agora no Multishow.
Produzido e gravado a distância, o programa está sendo feito num andar da casa da cantora, e o canal de TV até contratou uma amiga dela —que está com Anitta— para ajudar. Anitta vai responder a perguntas enquanto corre na esteira, brincar sobre como se vestir na quarentena, dançar e cantar, além de cozinhar.
É mais um jeito de se manter relevante, já que nunca foi tão difícil ter um hit dançante nas atuais condições —sem festas, baladas e shows. Quem não conseguir engajar seu público de diferentes maneiras, diz Anitta, terá dificuldades de sobreviver como artista.
“Precisamos de entretenimento leve também”, ela diz. “É importante se atualizar sobre notícias, mas se a gente ficar só olhando isso, vamos ficar muito tristes. Eu estava amando ficar sem fazer nada. Mas acho que as pessoas estão precisando de algo para relaxar, espairecer a cabeça.”
Fonte: Folha de São Paulo
Créditos: Folha de São Paulo