Notas fiscais e comprovantes bancários apreendidos em endereços do governador afastado do Rio, Wilson Witzel (PSC), mostram que ele e a primeira-dama Helena Witzel pagaram sistematicamente despesas em dinheiro vivo, segundo aponta a PGR (Procuradoria-Geral da República) no pedido de afastamento de Witzel autorizado pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça).
Para a PGR, essa seria uma forma de lavagem de dinheiro. Entre as compras listadas, está um cofre para oito armas de fogo adquirido pela internet e pago à vista, no valor de R$ 899. Helena ainda comprou R$ 4.200 em moeda estrangeira. As despesas incluem mensalidades escolares, cursos de idiomas, cartões de crédito e depósitos sem identificação em outras contas.
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De fevereiro a outubro de 2019, os comprovantes localizados pela PF somam quase R$ 25 mil.
A defesa de Witzel —denunciado por corrupção passiva a partir de contratos na saúde— nega ter recebido propina. O advogado Roberto Podval disse que os valores são baixos e que, “provavelmente”, houve saques da conta da primeira-dama, que repassava os valores a funcionários para fazer pagamentos rotineiros.
Especialistas em lavagem de capitais que analisaram o caso a pedido do UOL —a reportagem não revelou contudo a identidade dos envolvidos— apontaram que a prática pode ser caracterizada como lavagem.
“Durante a execução dos mandados de busca e apreensão foram encontrados dezenas de pagamentos de contas pessoais da família Witzel em espécie, conforme tabela a seguir, em tipologia de lavagem que já foi constatada em outros casos no Rio de Janeiro, como do ex-governador Sérgio Cabral, que fazia uso do expediente para saldar suas obrigações financeiras”, diz a PGR.
Valores baixos para driblar fiscalização
A presidente do Instituto de Prevenção à Lavagem de Dinheiro e Financiamento ao Terrorismo, Sandra Madza Buck, disse que é comum que pagamentos em valores aparentemente baixos sejam usados em operações de lavagem. Sem ser informada sobre o caso específico, ela concordou com os argumentos da PGR.
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“Às vezes, há esquemas em que, por mais baixo que sejam os valores, e estamos falando de corrupção, as pessoas fazem depósitos pequenos”, disse ela.
“As pessoas ainda dão contas para outras pessoas pagarem, sem sequer passar pelo sistema financeiro”, acrescentou. “Não importa se o valor é baixo, importa é o mecanismo.”
Sandra destacou que uma das técnicas para driblar mecanismos de detecção de crime é chamada de smurfing, em referência aos pequeninos personagens do desenho Os Smurfies. “As pessoas fazem um monte de depósitos em valores muito baixos”, explicou.
Pagamentos nas redondezas do Palácio Laranjeiras
Grande parte dos pagamentos foi feito na agência 0447 do Bradesco, que fica nas imediações do Palácio Laranjeiras, residência oficial do governador. Várias outras contas foram pagas na agência 0211 da Caixa Econômica Federal, também próxima do palácio em Laranjeiras, na zona sul. Há ainda comprovantes de pagamento em agência lotérica.
Segundo os recibos, os pagamentos foram iniciados em meados de fevereiro de 2019, poucas semanas após Witzel tomar posse —sendo frequentes até o início de março.
Após um hiato em março e abril, o casal retoma os gastos em espécie em 2 de maio, indo até 10 de junho. Após novo intervalo, os gastos foram retomados, mas se tornaram menos volumosos e frequentes.
No mesmo período, o escritório de advocacia de Helena Witzel fez duas transferências —de R$ 10 mil em agosto e R$ 15 mil em outubro— para a conta de Witzel, logo depois de receber pagamentos de empresas ligadas a Mário Peixoto —o empresário se encontra preso. Para a PGR, os pagamentos a Helena seriam propina. Witzel nega.
Os procuradores citam ainda um dos anexos da delação premiada do ex-secretário de Saúde Edmar Santos, no qual afirma que Witzel entregou R$ 15 mil em espécie ao Pastor Everaldo, presidente nacional do PSC —preso na sexta (28)— por medo de sofrer buscas no Palácio Laranjeiras.
Até o momento, não foram apresentados elementos que comprovem a suposta entrega do dinheiro.
Saques na conta de Helena explicarão despesas, diz defesa
Segundo a defesa de Witzel, uma análise da conta de Helena possivelmente explicará a razão dos pagamentos em dinheiro vivo. “Provavelmente você vai bater os saques da conta dela com os pagamentos que foram feitos”, disse Roberto Podval ao UOL.
Ele nega que a prática tenha a ver com lavagem de dinheiro. Podval disse que o ex-secretário de Saúde Edmar Santos é o dono da controversa apreensão de R$ 8 milhões e pontuou que, em vez de o MPF se dedicar a essa investigação, o órgão deu atenção a despesas da família do governador. O ex-secretário virou colaborador da PGR e admitiu ter dinheiro escondido em Portugal.
O defensor ironizou o fato de Witzel ser acusado por Edmar Santos de ter recebido R$ 15 mil em propina. “A parte dele foi R$ 15 mil? Isso é justificativa? E o outro pegou R$ 8 milhões?”. “Ele não foi capaz de dizer nada que levasse o governador a um ato de corrupção”, disse Podval.
Fonte: UOL
Créditos: UOL