Gilvan Freire
A democracia, nos países pobres, tem muito a ver com uma moça bonita e muito rica que atrai a paixão dos homens sem que ninguém saiba ao certo se por causa somente da beleza, ou por conta de seus bens. É muito comum entre os homens os que glamourizam seu amor pelas mulheres ricas da sociedade, e depois que casam saqueiam a fortuna delas partindo do pressuposto de que o mais raro e precioso da cobiça não está na beleza, mas na fortuna.
Na democracia, a riqueza cobiçada é o poder. Ele garante mais prestígio que o dinheiro, com a vantagem de que com ele se pode ter os dois ao mesmo tempo. Dinheiro e poder constroem o paraíso dos humanos na terra. Contudo, o lado frágil da democracia, assim como o lado vulnerável das noivas ricas, é deixar-se seduzir pelas promessas fáceis e juras de amor eterno, sem uso de detectores de mentiras para se prevenir contra os galanteadores e os golpes.
Se no casamento da moça rica o homem via de regra toma-lhe os dotes e age como se a fortuna alheia tivesse sido sempre sua, na democracia os homens conquistam e usam o poder como se nunca antes ou depois tenha ele pertencido ou haja de pertencer a alguém. Já houve na história quem dissesse que o poder deriva diretamente da vontade de Deus, mas quando os filósofos mais antigos professaram essa asneira colossal, todos estavam debaixo das monarquias absolutistas onde os monarcas podiam tanto sobre o povo que não deviam se considerar menos que ‘autoridades divinas’, personalidades extremamente poderosas e perversas que podiam julgar, esfolar e matar qualquer um sob a presunção de que o faziam com o consentimento prévio de Deus. Ou, desconfia-se, porque se achavam o próprio Deus.
Tudo isso já foi varrido da terra como se fossem as pragas do Egito, mas o que ficou entre nós, que Deus não expurgou no todo, são os doidos varridos, que, ao contrário do que o adjetivo varrido sugere, não são os que são expulsos por vassouras, ventos ou Deus, mas os que perderam o juízo, segundo atesta o dicionarista Silveira Bueno. Mania de poder em certos indivíduos, quando associada à capacidade de conquistar e exercer sem limites o poder, pode, eventualmente, anular os limites humanos colocados entre a normalidade e a anormalidade psíquica, de tal modo que até mesmo o paciente nem sabe às vezes encontrar-se diante do duelo travado pelas duas personalidades confusas que possui.
QUEM CASA COM A DEMOCRACIA TEM QUE PRESTAR CONTAS
À rigor, as conceituações antes feitas são apenas para ilustrar de forma muito superficial certos elementos da história política de alguns tempos. E quando algo estiver se repetindo em qualquer outra época ou lugar do mundo, com menor ou maior grau de expectativa ou apreensão, como acontece ainda hoje no Oriente e na América Latina, é porque a história é como ondas do mar, que estão sempre em movimento, vão e voltam e não se sabe onde se encontram e nem quando são repetidas ou apenas renovadas.
No caso da democracia, na Paraíba, que há de ser a mesma doutrina praticada no país inteiro, nada existe ainda de perdido que não possa ser recuperado, apesar das manifestações de risco que estão pipocando do lado do governo e dos desvios de rumo da suposta e esperada gestão democrática inovadora.
Diferente da donzela rica que entrou no casamento com a beleza e o dinheiro que a fizeram conquistar um noivo ambicioso que gostava mais de riqueza do que de mulher bonita, a Paraíba, como noiva encantadora e cheia de posses, não pode dar seus dotes a ninguém. Simplesmente porque não pode casar em comunhão de bens, sequer casar pode, como não pode ter dono, já que seus bens são de domínio público e uso coletivo. No máximo, pode celebrar uma sociedade de fato de duração temporária, em que o noivo é mais candidato a gerente de patrimônio, obrigado ao regime de prestação permanente de contas, do que candidato a marido.
No governo de RC não se presta conta de nada e o povo perdeu com ele o direito de saber legitimamente como e com que cuidados está sendo administrado seu patrimônio. E quem quiser saber, ainda que sejam procuradores naturais do povo como os deputados, o governo recruta delinquentes para expô-los à execração pública, taxando-os de inimigos do bem comum. Mesmo que por bem comum deva-se entender o bem público comum aos que dele estão se locupletando criminosamente. E há até gente boa que defende a farra sem perceber que a população está desconfiando até do vento, quanto mais…