VENDILHÕES E TRÂNSFUGAS NAS ELEIÇÕES

Gilvan Freire

O significado não deixa duvidas. Vendilhão quer dizer quem negocia ou trafica coisas de valor moral; e Trânsfuga, que se aplica a soldado desertor que muda de fileira, também se aplica, por extensão, à pessoa que muda de partido político. Esses dois tipos humanos são comuns na História, mas não há registro de que alguém tenha morrido orgulhoso de ter sido em vida um tipo ou outro.

Vendilhões do Templo é uma expressão conhecida desde a época de Jesus. Jesus expulsou os Vendilhões do Templo de Jerusalém, ou Templo de Herodes. Chamou-os de ladrões, porque eles traficavam pombas para sacrifícios, pois outros animais os pobres não podiam comprar. Era um ludibrio. Mais de 300 mil peregrinos estavam sendo vítimas desses maus feitores. Hoje esses cambistas se vendem e vendem eleitores e votos no Brasil. As vítimas são milhões de pessoas – mais decentes do que eles. E mais carentes. Traem o povo, assim como fez Calabar, cuja história será contada depois.

Surpreende muito que, em nosso país, em tão pouco tempo, a atividade política tenha se degradado tanto, a ponto de assumir publicamente essa generalizada promiscuidade que envolve hoje a organização partidária, as relações entre partidos e o processo eleitoral. Em menor escala isso sempre existiu, mas ter-se transformado numa sodomia explicita, em coito anormal a céu aberto, não era de se esperar diante da redemocratização do Brasil. Quando tudo começou?

Começou com Tancredo Neves, que para garantir a transição pacifica entre o regime ditatorial e a nova ordem, teve que herdar os trânsfugas e vendilhões do regime findo – Sarney a tiracolo. Pior: morto Tancredo, Sarney ficou com tudo e, seduzido pelo mandato de cinco anos, comprou o Congresso, cujo preço conhecia bem. Era até mais barato naqueles tempos.

 

Depois,veio Fernandinho, o embusteiro fantasiado de moralista que, querendo roubar sozinho com sua gang alagoana, negou-se a comprar o Congresso pelo preço da ocasião. Naquele tempo o Congresso, majoritariamente conservador e cediço, só queria meter a boca na gamela e evitar Lula. Posteriormente, a economia interferiu e elegeu FHC, que foi equilibrado até o dia em que desejou ser reeleito. Conseguiu dobrar o Congresso e comprar os votos de que precisava para mudar a Constituição. Ainda era preciso evitar Lula e o PT a qualquer preço, mesmo que a preço elevado. A reeleição é o poço fundo de todas as safadezas na política brasileira – o preço que o povo é quem paga para não feliz.

 

Chegaram, finalmente, Lula e o PT. Dirceu teorizou que era preciso comprar políticos conservadores para ganhar a presidência e alimentá-los pela goela para governar em paz. Compraram os vendilhões e os colocaram no governo. Os ladrões mais notáveis vieram governar com Lula e ensinar ao PT a arte de se manter no poder a qualquer custo financeiro e moral. Em vez de salvarem o país, se salvaram todos, mas alguns já estão na cadeia, onde o sistema prisional adota os mesmos métodos pedagógicos.

 

É tudo pelo poder. Os cinco anos de Sarney e a implantação da reeleição desmoralizam a vida pública. Os políticos e os partidos transformaram a democracia brasileira numa muleta para ganhar dinheiro, montar uma rede de corrupção e estabelecer o fisiologismo como arte de sobrevivência.

 

Dia desses, dois pensadores políticos se encontraram e cruzaram opiniões – queriam achar dez nomes de políticos insuspeitos no Congresso Nacional. Acharam menos da metade. Fosse dois anos atrás, incluiriam na lista o nome de Demóstenes Torres, o rato de esgoto que nos subterrâneos pensava que não seria pilhado. Em quem confiar?

 

Isso é o que resta do Brasil desses novos tempos opacos. A desonestidade e o cinismo são agora predominantes. Todos querem sobreviver e se locupletar. Virou um mal costume padrão. Ninguém mais se esconde ou disfarça. O lamaçal agora é um mar – um mar de lama. É triste. Voltarei enfocando a Paraíba. É tão triste quanto. Misericórdia!