Duas doses da vacina de vírus inativado Coronavac induzem a produção de anticorpos neutralizantes no organismo contra a forma original do coronavírus e outras variantes de preocupação (VOCs, na sigla em inglês) que surgiram, como a delta.
Mas, quando a ômicron entra no jogo, vacinados com a Coronavac possuem uma capacidade muito reduzida, quase nula, de neutralização desta variante, se comparados com os vacinados com duas doses de vacinas de mRNA.
Quando aqueles que foram imunizados com a vacina de vírus inativado recebem uma dose de reforço da Pfizer, essa proteção conferida por anticorpos aumenta, embora ainda seja ligeiramente menor do que a observada com os imunizantes de RNA mensageiro, o que pode sugerir a necessidade de uma dose de reforço extra.
Esses são os resultados de um estudo conduzido por Akiko Iwasaki, pesquisadora do Laboratório de Imunologia da Universidade de Yale.
O pré-print descrevendo o estudo, ainda sem revisão por pares, foi publicado no último dia 29 de dezembro na plataforma medRxiv, e por isso merece cautela na análise dos resultados, mas o laboratório de Iwasaki é renomado e reconhecido internacionalmente como referência em estudos de imunologia.
A pesquisa investigou a capacidade de neutralização das vacinas contra a variante, que é atualmente dominante em quase todos os países onde ela se alastrou, e demais formas do vírus ancestrais.
A neutralização é a proteção conferida por anticorpos neutralizantes, responsáveis por bloquear a entrada do vírus nas células, mas as vacinas induzem também outras respostas imunes, como a proteção celular, ofertada por células de defesa do tipo linfócitos T, e a produção de anticorpos contra outras partes do vírus.
Para avaliar a proteção contra a ômicron, os pesquisadores buscaram a taxa de anticorpos neutralizantes, que se ligam à proteína S do Spike do vírus, e do tipo IgG, específicos contra a região do Sars-CoV-2 conhecida como RBD (domínio de ligação com o receptor) em amostras de sangue de 101 indivíduos na República Dominicana.
Como grupo controle, os pesquisadores compararam os valores encontrados na população dominicana com aquela observada em amostras de sangue de trabalhadores da saúde da Universidade de Yale que receberam duas doses de vacinas de mRNA (Pfizer ou Moderna).
Depois de coletado o sangue, os cientistas testaram o plasma sanguíneo – porção do sangue que contém os anticorpos – em laboratório contra as diferentes cepas virais.
Os pesquisadores confirmaram que algumas variantes, como esperado e já demonstrado, levam a uma queda na proteção conferida pelas vacinas passado um certo tempo (quatro meses). Uma dose de reforço de Pfizer em vacinados com Coronavac elevou os níveis de anticorpos protetores contra a cepa original e contra a delta em dez e seis vezes, respectivamente.
Mesmo os vacinados com duas doses da Pfizer ou da Moderna apresentaram uma redução na taxa de anticorpos neutralizantes contra a ômicron de até 12 vezes menor do que a observada contra o vírus ancestral.
Já no caso da Coronavac, os vacinados com duas doses praticamente não apresentaram anticorpos contra a ômicron. Com a dose de reforço da Pfizer, a quantidade de anticorpos no sangue aumentou consideravelmente.
Em sua conta no Twitter, Iwasaki afirmou que esses dados podem indicar a necessidade de duas doses de reforço nos indivíduos vacinados com Coronavac para proteger contra a ômicron.
Diferente de outros estudos, a pesquisa de Iwasaki não encontrou uma melhor proteção conferida por anticorpos produzidos pós-vacinação em pessoas que tiveram infecção prévia ao vírus.
Mesmo em pessoas que receberam duas doses de Coronavac e um reforço da Pfizer e já tiveram Covid, a taxa de anticorpos não foi suficiente para bloquear a ômicron.
Segundo a brasileira Carolina Lucas, que participou do estudo, os resultados devem ser interpretados com cautela. “Os dados sugerem que a ômicron está associada a uma menor eficácia das vacinas contra ômicron, mesmo após um reforço heterólogo, o que pode resultar nos chamados ‘escapes vacinais’. No entanto, as vacinas ainda se mostram extremamente eficientes na prevenção de um quadro clínico mais grave e óbitos”, diz.
As vacinas contra a Covid-19 foram desenvolvidas, em grande parte, para impedir o desenvolvimento da doença, mas os resultados de ensaios clínicos e do uso em massa em todo o mundo indicam uma capacidade limitada em impedir a infecção.
Por causa disso, países em todo o mundo correram para acelerar as doses de reforço da vacina contra Covid-19 e tentar barrar essa nova variante.
O resultado em todo o mundo, embora tenha sido um aumento exponencial de novos casos, parece ter surtido efeito no que diz respeito às hospitalizações e óbitos, com uma menor taxa de internados e mortos nessa nova onda da pandemia.
No início de dezembro, a Sinovac anunciou que desenvolve uma atualização da Coronavac que seja eficaz contra a ômicron e que a mesma deve estar disponível até março de 2022.
Um estudo publicado no último domingo (2) de pesquisadores da Universidade de Ciência e Tecnologia de Hong Kong em parceria com a Universidade de Melbourne mostra que as células T de defesa mantêm uma boa proteção contra a ômicron mesmo quando os anticorpos neutralizantes falham em bloquear a entrada do vírus.
As células T não impedem a infecção pelo coronavírus, mas atacam o vírus nas células, impedindo sua propagação e a ocorrência da chamada tempestade de citocinas, associada ao quadro mais agravado de Covid.
Alguns estudos sugerem que a ômicron também causa uma doença com menor gravidade por infectar menos os pulmões, o que pode também explicar parcialmente a menor taxa de hospitalizados com a doença grave.
Lucas, que é pesquisadora de pós-doutorado no laboratório de Iwasaki desde 2018, reforça a necessidade de doses de reforço. “Nossos dados fortalecem a ideia que a ômicron está associada a um escape imunológico maior do que outras variantes já descritas, não só frente às vacinas, mas também em relação à imunidade pós-infecção, destacando a necessidade global de doses de reforço para combater a pandemia”.
Fonte: UOL
Créditos: UOL