Coincidências
Luiz Fernando Veríssimo
Coincidências são apenas coincidências, mas são elas que alimentam as crenças e os mitos. O fato da morte do Eduardo Campos acontecer na mesma data em que
morreu seu avô e mentor político Miguel Arraes significa nada, mas acrescenta
uma pungência a mais à tragédia. Com outra cara e outro estilo, Eduardo Campos
continuou a legenda de Arraes, cuja popularidade e coerência ideológica se
mantiveram as mesmas através dos tempos – e que tempos. Talvez, dos políticos da
sua geração, só o Brizola rivalizasse com Arraes em termos de carisma
ininterrupto, fosse no poder ou no exílio, perto ou longe do seu eleitorado. Eduardo
Campos era o político mais querido da sua terra desde Arraes. Isto apesar de, com
sua simpatia e facilidade de expressão, ser quase um anti-Arraes, de quem se dizia
que mantinha seu prestígio porque ninguém entendia o que ele falava, dada a sua
péssima dicção. Morrendo no mesmo 13 de agosto, Eduardo Campos se
incorporou, eternamente, na legenda do avô.
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A coincidência de Eduardo Campos morrer quase que simultaneamente com os
atores Robin Williams e Lauren Bacall também não significa nada – salvo uma
oportunidade de se refletir sobre a versatilidade da morte, e as suas muitas razões.
Eduardo Campos morreu por acidente, Robin Williams por depressão e Lauren
Bacall por velhice. Só o que une as suas mortes é que os três eram conhecidos e
seus necrológios ocuparam os noticiários com poucos dias de diferença. A morte
não discrimina: cada um morreu de um jeito. Eduardo Campos e Robin Williams
tiveram mortes dramáticas, Lauren Bacall teve o que se chama de “morte
natural”, o que quer dizer uma morte sem surpresa. Uma morte camarada. Toda
morte é incompreensível, mas algumas são mais canalhas do que as outras.
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É difícil imaginar o Robin Williams depressivo, quanto mais se matando. Ele era
um grande ator e um grande comediante, que nem sempre são a mesma coisa. Fez
alguns filmes memoráveis, mas a melhor maneira de vê-lo era em programas de
entrevista, onde, longe de qualquer script, improvisava com um brilhantismo meio
demente. Quando não estava sendo ele mesmo, o que já era engraçado, inventava
tipos na hora, produtos de uma mente borbulhante que nunca parava de criar.
Teve problemas com drogas e bebida, mas o que finalmente derrotou a sua mente
hiperativa foi a depressão, que é quando a vida perde toda a graça. Robin Williams
enforcou-se. Escolheu a morte de um condenado, julgado por ele mesmo.
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O primeiro filme da Lauren Bacall, Uma Aventura na Martinica, foi com o
Humphrey Bogart. Ela tinha 19 anos, um olhar velado e meio irônico e uma voz
de levar pra cama. Levou o Bogart, que não a largou mais. Os dois se casaram.
Depois de ficar viúva duas vezes e envelhecer ela continuou a fazer filmes,
esporadicamente, substituindo a sensualidade dos 19 anos por uma elegância
matronal, mas mantendo o olhar irônico e a voz. Uma frase do seu primeiro filme
ficou célebre. Ela para Bogart: “Quando você me quiser, apenas assovie”. É bom
pensar que a última coisa que ela ouviu antes da sua morte tranquila foi o assovio
do Bogart, chamando.