Terceirização ampliada - Rubens Nóbrega

O deputado Luciano Cartaxo é farmacêutico por formação acadêmica, tanto quanto o é o governador Ricardo Coutinho.
Além do mesmo curso, os dois participaram ativamente do movimento estudantil na Universidade Federal da Paraíba no tempo em que o ME guiava-se pelas causas e bandeiras da esquerda, entre elas a defesa de um Estado provedor de serviços essenciais, como o são a saúde, a educação e a segurança pública.

Luciano é hoje deputado estadual pelo PT e Ricardo Coutinho, governador pelo PSB. Aparentemente, a filiação a partidos ditos de esquerda faria esses dois profissionais da saúde comungarem os mesmos princípios e idéias subjacentes ao conceito de que saúde é direito do cidadão e obrigação do Estado. Mas essa comunhão, na realidade presente, não passa de ilusão.

O que se vê agora: Luciano continua a defender os mesmos princípios e idéias que formaram a sua concepção de Estado, enquanto Ricardo moveu-se em surpreendente guinada para o centro e até para a direita, numa metamorfose política e pessoal que evoluiu radicalmente a cada degrau que ele subiu no poder público.

O resultado da mudança: há uma diferença abissal – de visibilidade solar – do Ricardo que assumiu a Prefeitura de João Pessoa em janeiro de 2005 para o Ricardo que assumiu o Governo do Estado em janeiro deste ano.

Escalei o deputado na posição de contraponto ao governador porque conversei ontem com o parlamentar sobre questões de saúde pública. E ao conversar senti do Doutor Luciano muita preocupação diante das evidências de que o Ricardo I resolveu expandir e diversificar um polêmico e super questionável esquema de terceirização dos serviços públicos de saúde sob responsabilidade do Estado.

O esquema não se limitaria à entrega de hospitais públicos – e de toda a sua capacidade instalada, dos recursos humanos aos equipamentos mais caros e sofisticados – à gerência privada, sob paga de alta lucratividade, a exemplo do que transparece do contrato com a Cruz Vermelha com o Estado para gerir o Hospital de Trauma da Capital.

Graças a esse contrato, o governo deve transferir ou já transferiu – cash, antecipadamente, segundo me informou outra fonte que não Luciano – nada menos que R$ 44 milhões para a CV. Dá cerca de R$ 7,2 milhões por mês.

Bem, considerando que a média histórica de custeio da máquina hospitalar (no HT) gira em torno de R$ 4,5 milhões/mês, presume-se que a CV receba livres, mensais, entre R$ 2,7 e 3 milhões de reais. Ou já faturou cerca de R$ 18 milhões, livres e antecipados.

Essa grana daria para construir até três hospitais de pequeno a médio porte (45 leitos) no interior, o que poderia aliviar enormemente a carga dos HTs da Capital e de Campina Grande. Daria também para construir uns dez postos de saúde equipados, umas trinta creches e vai por aí.

Além disso, se em vez de ir pra Baixada Fluminense esse dinheiro fosse para o interior da Paraíba em forma de hospital, seria o começo do fim da chamada ambulanciaterapia – transporte de pacientes das cidades menores para as cidades maiores do Estado.
Por vezes, tal serviço é realizado sem necessidade alguma, apenas para satisfazer a vontade de um ou outro eleitor que se sente desprestigiado se o cacique paroquial não lhe arranjar uma ambulância para ser atendido em algum hospital da cidade grande.

Por falar em ambulância…

Quando me referi à expansão e diversificação do processo de terceirização da saúde pelo governo estadual tinha em mente também um dado bastante ilustrativo de que isso está realmente acontecendo na Paraíba.

Esse dado me foi repassado ontem mesmo pelo deputado Luciano Cartaxo e diz respeito a mais um contrato milionário entre o Ricardo I e uma empresa que assume serviços que deveriam ser prestados diretamente pelo Estado.

Pois bem, a nova ‘parceira’ do governo atende pelo nome de Easy Life Emergências Médicas Ltda., uma empresa baseada em Sobral, no Ceará, à qual a Secretaria de Saúde do Estado está alugando 20 ambulâncias de suporte básico tipo B e 12 de suporte avançado tipo D. Valor total do contrato: R$ 5.073.513,32.
Um extrato desse contrato foi publicado na página 17 da edição do Diário Oficial do Estado da última terça-feira, 23. Esses R$ 5 milhões serão pagos à Easy Life entre 6 de julho último e 31 de dezembro deste ano, ou seja, pouco menos de seis meses.

Pois bem, pelo que pesquisei na Internet, com esse dinheiro que o Estado vai pagar pelo aluguel de 32 ambulâncias poderia comprar pelo menos 40 ambulâncias de suporte avançado (a R$ 125 mil, cada) ou 50 de suporte básico.

Devo lembrar, contudo, que quando se trata da aquisição de viaturas pelo Estado há quem prefira a locação porque assim o poder público livrar-se-ia de custos e encargos com manutenção, contratação de motoristas, socorristas etc., além de usos indevidos, desgastantes e deteriorantes de tais bens pelos servidores encarregados.

Mesmo assim, discordo. Até por que não entendo nem concebo o Estado sem operar ele mesmo os controles e sem providenciar os meios de manutenção e conservação de seu patrimônio.
Se não o faz, é por incompetência ou para beneficiar o particular que ganha dinheiro – e muito – graças a essas terceirizações.

Sem resposta do governo
Perguntei anteontem ao governador do Estado, por i-meio, se ele autorizara “o pagamento antecipado de R$ 44 milhões à OS que usa o nome da Cruz Vermelha e foi contratada por seu governo para administrar o Hospital de Trauma da Capital”. Ele não me respondeu. Ontem, mandei nova mensagem, dessa vez perguntando o seguinte:

– Senhor Governador, qual o sentido de gastar R$ 5.073.513,32 em apenas cinco meses com aluguel de 32 ambulâncias da Easy Life se com esse dinheiro daria para comprar pelo menos 40 ambulâncias de suporte avançado ou 50 de suporte básico? Qualquer dúvida, favor consultar na página 17 do DOE de terça, 23.8.2011, o Extrato do Contrato nº 0016/2001, da Secretaria de Estado da Saúde.

Respeitosamente, Rubens Nóbrega (Colunista do JP).
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As duas mensagens (mais duas não respondidas) foram enviadas com cópia para o secretário de Comunicação Social do Estado, jornalista Nonato Bandeira.