A nova lei de Drogas do Brasil entrou em vigor na quinta-feira, 06, e mexeu com as estruturas de famílias e profissionais que lidam com dependentes químicos, em todo o País. A Lei sancionada nesta semana pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) modifica a antiga Lei de Drogas editada em 2006. Entre as mudanças, está a previsão de internação compulsória para dependentes químicos, desde que tenha autorização de parentes ou responsáveis e, em caso de não ter família ou amigos, o serviço público pode decidir pelo paciente.
Em conversa com a Coordenadora de Saúde Mental da Paraíba, Iaciara Mendes, foi possível traçar um panorama do que pode ser o modelo de tratamento de pessoas Brasil a fora. Para Ionara, a autorização para internar um dependente químico de forma involuntária não ajuda e pode gerar segregação, “a gente não acredita num tratamento em que segrega o outro e retira ele do direito de conviver em sociedade com sua família e amigos, a gente acredita num serviço que funcione próximo à residência dele e que a família possa participar do tratamento porque depois o paciente volta para a vida normal depois”, disse a Coordenadora.
Ela seguiu dizendo “o suposto período de internação, que pode ser de 90 dias, nunca é de 90 dias, sempre é prorrogado, e tem casos de pessoas que passam até um ano nessas clínicas e sem contato com a família e proibidas de irem para casa ou de receberem visitas, geralmente só consegue sair quando fogem e se retornarem sofrem represália ou tortura, a gente já observou esse tipo de prática em algumas comunidades terapêuticas aqui na Paraíba, que a gente tem um trabalho junto com o Ministério Público Estadual que fiscaliza esse tipo de comunidade terapêutica e, em todas elas, percebemos esse tipo de ambiente para tortura, cárcere privado e até trabalho escravo de pacientes que estão lá dentro, desde jovens até idosos, estamos fazendo um trabalho nesses ambientes”.
Ionara demonstrou grande preocupação com as pessoas que vivem em situação de rua, “é uma questão social, muitas pessoas que vivem nesses espaços chamados de cracolândia tem problemas sociais, não só de saúde pública”, disse a especialista.
A Coordenadora disse que uma pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz provou que “não existe epidemia de drogas no Brasil como o Presidente coloca, a gente tem um problema com drogas, mas existe um problema muito maior com o álcool e ele não permitiu que os pesquisadores mostrassem essa realidade que tem no país com base científica e os políticos aprovaram o projeto com base no que eles acham que deve ser”, denunciou.
Na Paraíba, a política pública de saúde mental não inclui, hoje, a internação compulsória, que só acontecia, até a publicação da Lei, através de ordem judicial, assim o paciente era levado para o Complexo Psiquiátrico Juliano Moreira, em João Pessoa.
A aversão ao modelo de internação é explicado com exemplos, Ionara conta que há clínicas sendo investigadas aqui na Paraíba e em Pernambuco por tortura, “um paciente precisa ficar 90 dias e se sair antes disso, a clínica não vai receber, e a internação é muito cara e sem garantias porque se paga R$ 30 mil, R$ 40 mil ou R$ 50 mil, que é o que encontramos nas fiscalizações e ainda há familiares sendo forçados a pagar mais dinheiro ou fornecer cesta básica e produtos de higiene e, se não for feito, o paciente pode ser punido com mais medicação que vai deixa-lo dormindo por muito tempo”.
Ionara disse ainda que parte da sociedade só se preocupa com o usuário de drogas quando ele está ocupando as ruas e, por isso, defendem que ele seja internado sem se preocupar com o local onde ficarão e a forma como serão tratados, “o que importa é que as pessoas não vejam os usuários na rua”, disse.
“Nós estávamos com uma política de fechar os espaços de internação aqui na Paraíba e agora retrocedeu, a gente não tem mais como fechar esses espaços, está bem difícil de conseguir trabalhar na forma adequada”, ressaltou.
Ionara finalizou dizendo que o tratamento de dependentes químicos é constante, já que precisa de acompanhamento para evitar recaídas e não precisa tirar a pessoa do seu ambiente porque ela tem que continuar vivendo em sociedade, “na nova lei eles acreditam na abstinência e não funciona porque não é possível manter as pessoas numa bolha, temos que oferecer mais que a droga, a campanha precisa focar nas pessoas, tem que ter saúde. Educação e outras condições de vida para essas pessoas”.
Fonte: Polêmica Paraíba
Créditos: Polêmica Paraíba