Seca estava prevista há um ano

Rubens Nóbrega

Não dá pra entender como algo tão ciclíco quanto seca prolongada no Nordeste não ponha na cabeça dos homens públicos em geral e governantes em particular a adoção de medidas preventivas em larga escala, com a necessária antecedência, enquanto não finalizam e botam pra funcionar obras pretensamente definitivas como a transposição das águas do São Francisco.
Digo isso porque nesta semana recém finda tive a certeza de uma coisa da qual já desconfiava há bastante tempo: a seca de agora já estava prevista desde o ano passado. Prevista pelo Instituto Nacional de Meteorologia, conforme declarações que peguei na Internet do cientista potiguar Luiz Cavalcanti, um dos técnicos mais conhecidos e respeitados do Inmet.
Em entrevista ao blog Barra Pesada de Paulino Filho, de Jardim do Seridó (RN), publicada no dia 4 de junho deste ano, Luizinho, como é mais conhecido entre seus conterrâneos, disse que “em novembro de 2011 as previsões eram de um inverno regular, mas em dezembro houve uma mudança radical e o aquecimento das águas do oceano nos mostrava que não teríamos inverno no Nordeste”.
Evidente que essa previsão chegou ao conhecimento de todo o Brasil, especialmente das autoridades federais, sobretudo as nordestinas e, principalmente, das paraibanas. E o que fizeram para ajudar a população do semi-árido a se preparar para enfrentar mais um período longo de estiagem? Pelo que sei, nada, absolutamente nada. Deixaram acontecer e só então, tardia e porcamente, começaram a choradeira, cada um mais chorão que o outro querendo botar toda a culpa, exclusiva culpa, no Governo Dilma.
Aqui mesmo na Paraíba só lembro de ver o governo estadual se bulindo do final do primeiro semestre pra cá, depois da seca consolidada e espalhada por brejos, cariris e sertões da gloriosa e castigada Pequenina. Graças ao absenteísmo governamental, que parece ter a imprevidência como regra e a indiferença como prática no trato de problemas do povo mais pobre, por falta d’água milhares de paraibanos perderam gado, cavalos, jumentos, galinhas e não raro a esperança de que um dia isso vai mudar.


Seca pode esticar até 2013
Luizinho, natural de Jardim de Piranhas, esteve no Seridó no primeiro final de semana de junho, depois de ter participado de um evento em Campina Grande sobre desertificação, oportunidade em que defendeu a tese segundo a qual esse processo não tem a ver com o clima do Nordeste, mas com a devastação do meio ambiente.
E atenção: na entrevista que concedeu ao blogueiro do seu lugar, o meteorologista revelou ainda que não existe qualquer previsão de inverno para o próximo ano. “Não existem previsões para mais de três meses posteriores, pois qualquer previsão acima de três meses é pura adivinhação”, garantiu o Homem do Tempo.
E aí, diante dessa revelação, será que as bacanas e bacanas atualmente no poder vão tomar providências sérias, antecipadas, para socorrer, sobretudo, os agricultores e excluídos que habitam as periferias urbanas, dependentes eternos do assistencialismo, do oportunismo e até do sadismo político que faz carreira em cima de tão deprimente e deplorável dependência?
De minha parte, não duvido que ano que vem, se as chuvas não vierem, bem antes de novembro estaremos assistindo às mesmas cenas de agora: no interior, gente desesperada, passando fome e sede; na cidade grande, oradores inflamados pedindo mais dinheiro ao Governo Federal, cujo socorro às vítimas da seca – do seguro-safra à bolsa estiagem – é o único que chega com alguma regularidade e efetividade a quem mais precisa.
Carro-pipa em João Pessoa
Amigo que mora no Altiplano do Cabo Branco perguntou-me anteontem se eu sabia dizer se o programa de abastecimento através de carros-pipas vai chegar na Capital. A princípio, pensei tratar-se de brincadeira, mas logo percebi, pelo tom irritado e indignado do meu interlocutor, que o caso é sério.
Disse-me que na sua rua a água da Cagepa só dá o ar da graça no final da tarde e vai embora ligeirinho, se a clientela não cuidar logo de resolver a louça acumulada, o banho vencido ou de encher caixa d’água, baldes e caçarolas. “Aqui em casa e, quero crer, em milhares de outras residências da cidade, o racionamento virou regra e a água regular, a exceção”, lamentou.
De fato, este ano o pau que mais se vê é a Cagepa cuidando menos de fornecer e mais de interromper, comumente alegando serviços de ‘melhoria do sistema’. Pela constância da falta d’água encanada nos últimos tempos, dá pra suspeitar que esses serviços seriam disfarce de racionamento, medida que se admitida publicamente pegaria mal para a imagem do governo.
Mas isso, sendo verdade, é uma grande bobagem. O povo não é bobo, Cagepa, e fica tão indignado com a falta d’água quanto com a falta de verdade. Sem contar que muitos se sentem verdadeiramente insultados na sua inteligência.
Sendo assim, trate de agilizar a conclusão e funcionamento da Translitorânea e seja mais previdente ou competente no manejo das águas de seus reservatórios. E se precisar racionar de verdade, abertamente, aposto como uma campanha fina, elegante e sincera convencerá a população a colaborar.