Salvem, não matem o Centro

Rubens Nóbrega

Em quase todos os cantos do chamado mundo civilizado, o governo faz por sua conta, associa-se a empresas ou a entidades sem fins lucrativos para recuperar, reocupar, repovoar e revitalizar a parte mais antiga de suas cidades mais importantes.

Em João Pessoa, lamentavelmente vem acontecendo injustamente o contrário. Pior: o esvaziamento e a consequente degradação do Centro, sobretudo do Centro Histórico, têm no próprio poder público um grande e decisivo parceiro.

Por sua vez, no mesmo processo o governo invariavelmente conta com a inestimável ajuda da notória abulia e notável indiferença da nossa sociedade civil crescentemente desorganizada e desmobilizada.

Por essas e outras, sem um mínimo de resistência e quase nenhum protesto, instituições como o Ministério Público Estadual e poderes como o Legislativo ensaiam ou formalizam projetos de transferência de suas sedes para lugares distantes do Centro. Com isso, sem querer – ou querendo – distanciam-se física, administrativa e politicamente dos próprios usuários dos seus serviços e beneficiários de suas iniciativas.

Há pouco o Ministério Público pediu e a Assembleia deu autorização ao Governo do Estado para contrair empréstimo de R$ 80 milhões destinados à construção de uma super, hiper sede em alguma margem da BR-230. Quando poderia, com esse mesmo dinheiro, comprar todo o quarteirão onde estão instaladas as duas sedes de que já dispõe, uma delas inaugurada há menos de três anos e construída a um custo pouco superior a R$ 4 milhões.

Engenheiro propõe alternativa

“Com 20 milhões de reais, dá pra comprar, e por um preço já superestimado, todos os imóveis que atualmente ocupam aquele quarteirão que se projeta na esquina da Pedro II com a Rodrigues de Aquino, vis-à-vis com a Praça João Pessoa. E o melhor de tudo: depois de comprar todos os vizinhos, sobram R$ 60 milhões para expandir magistralmente o que já existe ou construir a mais suntuosa sede que o Ministério Público quiser”, disse-me ontem experiente engenheiro acostumado a grandes obras.

O meu ‘consultor’ não está interessado em questionar os valores envolvidos no mega, ultra projeto do MPPB. O que ele quer mesmo – e defende isso com muita firmeza e convicção – é chamar a atenção para a contribuição que o Ministério Público dará à deterioração do Centro, caso venha a concretizar a saída da área onde se encontra instalado, positivo e operante.

Da mesma forma, o profissional consultado pelo colunista considera ainda mais inusitada, estranha e preocupante a possível mudança da Assembleia para a praia de Jacarapé, no finado Polo Turístico. “Se a saída do Ministério Público já representaria uma enorme perda para a área central da cidade, a da Assembleia, então, pode ser um tiro de misericórdia de quem parece só ter mira e pontaria em outros interesses, bem distintos e distantes do verdadeiro interesse público”, indigna-se o engenheiro.

Mas, mesmo indignado, ele não deixa de oferecer ao presidente do Legislativo Estadual, deputado Ricardo Marcelo, a mesma alternativa que pretende encaminhar por escrito ao Doutor Oswaldo Filho, procurador geral de Justiça e chefe do MPPB.

Como a Assembleia pode fazer

“No quarteirão da Assembleia, da sede atual até o Hotel Tropicana, a ser preservado, tudo lá é passível de aquisições e desapropriações que, mais uma vez, viabilizam ampliação ou reforma das instalações do Poder por valores bem menores que os projetados para a construção de uma nova sede distante de tudo e de todos, principalmente do povo que os deputados dizem representar”, avalia.

A proposta do engenheiro encontra a melhor guarida e o mais sólido argumento de sustentação em dois princípios basilares da administração pública: economicidade e eficiência. Mas, para além desses princípios, o fundamental seria manter e melhorar as repartições públicas e suas serventias onde já funcionam. Se elas estão no Centro, que lá permaneçam para acesso mais fácil e mais rápido dos contribuintes.

E se ainda é pouco para convencer dirigentes obcecados por obras públicas faraônicas e relocalizações discutíveis, devemos lembrar que estão mexendo – e querendo remover – um patrimônio que é público. Deveriam, portanto, no mínimo discutir o assunto transparentemente e aprofundadamente com a população.

Afinal, é à população que os senhores deputados, procuradores de Justiça, prefeito, governador e secretários devem satisfação. Inclusive porque (embora pareçam esquecidos desse detalhe importantíssimo) o que está em jogo é o dinheiro do povo e não da Assembleia ou do Ministério Público.

Varadouro também esvaziado

Nos quase vinte anos decorridos entre o Burity II e o Cássio I, o sítio histórico da Capital passou por recuperações pontuais que deram algum resultado no Conjunto São Francisco, na Cidade Alta, e na Praça Antenor Navarro e no Largo de

São Pedro Gonçalves (incluindo Hotel Globo), na Cidade Baixa. Parou por aí, pelo visto.
Autoridades estaduais e municipais sequer à promoção de eventos no Varadouro deram continuidade, embora algo me diga que a revitalização do nosso Centro Histórico voltará à pauta das promessas de campanha eleitoral em mais duas ou três eleições. Daqui pra lá, pode ser que não sobre mais nada.