Ruído de comunicação entre Cássio e Ricardo

Nonato Guedes

As relações entre o senador Cássio Cunha Lima (PSDB) e o governador Ricardo Coutinho (PSB), se não estão estremecidas, estão desencontradas. Um exemplo sintomático foi o quiproquó ocorrido, ontem, em Brasília. Cássio encontrava-se na ante-sala do gabinete do ministro Fernando Bezerra, da Integração Nacional para uma audiência previamente marcada sobre problemas de interesse da Paraíba e do Nordeste. De repente, o governador socialista irrompe no gabinete, acompanhado apenas de secretários. Cássio postou um “tweet” dando a entender que considerara a atitude do governador uma descortesia.
Finda a audiência, Ricardo apresentou um pedido público de desculpas ao senador e disse ter pensado que a pauta de Cássio com o ministro fosse de caráter pessoal. Terminou assim: Cássio registrou o pedido de desculpas e deu por superado o desaguisado.
Políticos em geral costumam dizer que jornalistas adoram ver chifre de cavalo em qualquer mal entendido. É uma boa desculpa para esconder sentimentos pessoais que não podem ser exteriorizados. Mas brigar com fatos é querer insultar a inteligência alheia. Até porque certos políticos adoram usar jornalistas para mandar recados. Alguns até desmentem o que repassaram a profissionais de imprensa. Esse jogo está manjado demais para ser repetido à exaustão como se não fosse produto requentado.
De concreto, há fios desencapados – para usar uma expressão de Paulo Soares – entre os dois políticos que ousaram se aliar em 2010, contrariando tucanos de fina plumagem e remanescentes do extinto Coletivo Ricardo Coutinho. Cássio é governo na Paraíba mas não está no governo. Eventuais discípulos seus nomeados pelo governador para a equipe são secretários faz de conta. Dispõem do status, porém, não gozam da autonomia. Igual à Universidade Estadual da Paraíba, bloqueada no gerenciamento de recursos para seu funcionamento, uma conquista que havia sido obtida no governo Cássio e que RC podou. Ainda hoje o filho do poeta Ronaldo está com o espinho atravessado na garganta.
Há Senas acumuladas entre Ricardo e Cássio, não adianta tapar o sol com a peneira. A posse de Cássio no Senado e a desenvoltura que ele sabe imprimir à atuação pública geram ciúmes até entre parceiros. E ciúme de homem é fogo, diz um bordão do tempo da minha avó. Ricardo, talvez por vezo de formação, tem umas atitudes que soam estranhas. Quando Cássio foi cassado como governador pelo TSE, Ricardo prefeito de João Pessoa, o então alcaide pessoense abordou-me numa confraternização com a imprensa, no Bessa e, comentando o resultado, disse algo em tom de desapontamento. Ele já intuía que o poder iria escorregar para as mãos de José Maranhão. E Ricardo já ensaiava namoro com Cássio. Desse ponto de vista, a cassação foi uma ducha de água fria. Atrapalhou os planos. Melhor dizendo: adiou-os, até 2010, quando Coutinho e Cunha Lima destronaram Maranhão do poder pelas urnas. Não adianta perguntar ao governador se Cássio influenciou decisivamente na sua eleição. O governador não gosta dessa pergunta. Cássio é, hoje, um concorrente de Ricardo. Não um adversário, que fique claro. É concorrente porque tem voo próprio, legenda própria, e sagacidade política. É êmulo cordial do governador consagrado nas urnas em 2010. Pode ser que estejamos, jornalistas, enxergando chifre em cabeça de cavalo. Afinal, mal entendidos existem. E pedidos de desculpas estão aí para serem feitos. Dê-se um desconto no quesito humor. O governador poderia ter ficado irritado com os novos revezes na Assembleia e “intoxicado” por intrigas de toda ordem. Mas, até onde se conhece Cássio, ele não gosta de instabilidades emocionais. Quer jogo aberto, sim, sim, não, não. O moído de Brasília pode ser relevado. Mas está anotado na caderneta do senador. Se vierem outros mal entendidos, não há vacina anti-intriga que dê jeito na relação entre os dois líderes.