Risco n’água - Rubens Nóbrega

O governador Ricardo Coutinho contraiu a Cruz Vermelha, quer dizer, contratou a Cruz Vermelha para administrar o Hospital de Trauma de João Pessoa e passou recibo de que o seu governo não tem quadros ou competência para dar conta do HT.

Para encobrir o atestado público de incompetência que significa essa terceirização, anunciou que essa Cruz não vai pesar tanto nas costas do erário porque com ela o Trauma vai custar menos aos cofres públicos e trabalhar mais e melhor.

No curso das explicações e justificativas, RC dourou ainda mais a pílula ao garantir que a tal gestão pactuada (sinônimo de terceirização em ricardês) não traria risco ao emprego das pessoas que trabalham no Trauma ou para o Trauma.

Ontem, com a descoberta de que dezenas de comissionados ou prestadores de serviço estariam sendo demitidos no HT, o povo viu mais uma vez que as idéias (ou falas) do governador “não correspondem aos fatos”.

Bem, se continuar desse jeito, mais do que se encaixar no verso de Cazuza, Sua Excelência corre o risco de entrar para a galeria dos governantes que desmerecem a palavra dada e fazem dela um ‘risco n’água’.

A expressão, cunhada pelo filósofo Tarcísio Burity, se não me falha a memória fraca e pouca, define magistralmente a consistência ou credibilidade de determinados anúncios e promessas governamentais.

‘Alguns’ que são ‘muitos’

O governo tentou ainda esconder, abafar ou minimizar as demissões no correr do dia de ontem, mas no começo da noite acabou confirmando a notícia através de nota de sua Secretaria de Comunicação Social (Secom).

Para que não haja dúvidas, vejam só o trecho que tirei da nota publicada às 18h33 dessa quinta (21) no portal do Governo do Estado na Internet, sob o título “Trauma inicia processo de regularização de servidores”:

– Segundo o secretário de Saúde, Waldson Souza, o desligamento de alguns funcionários está ocorrendo porque muitos não se enquadram no perfil profissional do novo modelo da direção do Hospital.

Por essa declaração, dá pra ver, inclusive, que o Doutor Waldson tenta mostrar que o número de demissões é reduzido, pois se refere ao “desligamento de alguns”, mas logo em seguida se trai e admite que “muitos não se enquadram no perfil”.

O certo é que dificilmente alguém saberá ao certo quantos foram ou ainda serão demitidos do Trauma por não se enquadrarem no ‘perfil’. Afinal, transparência não é o forte desse governo, como sobejamente demonstrado.

O que diz não se escreve

Cá pra nós: a gestão girassolaica está mesmo é vivendo e praticando intensamente aquilo que no popular alguém resumiria assim: “O que esse governo diz não se escreve e o que ele escreve não se diz”.

Quem quiser tirar a prova, é só conferir ou lembrar que o governador também disse que com a terceirização o HT passaria a custar cerca de R$ 6 milhõesmês e não os R$ 10 milhões que estaria consumindo antes de chegar a Cruz.

Anteontem, o deputado Manoel Júnior exibiu documento no qual se constata que o custeio do HT gira em torno dos R$ 4,5 milhões por mês e não os R$ 10 milhões informados pelo governador.

Significa, então, que em vez de economizar, na verdade o governo terá que desembolsar de 1,5 a 2 milhões de reais a mais, por mês, para honrar o contrato com uma Cruz Vermelha que ninguém sabe ao certo, até hoje, que Cruz é essa.

Ela só não é a Cruz Vermelha Internacional nem a Cruz Vermelha Brasileira do Rio Grande do Sul, como declarou o secretário Waldson ao apresentar há duas semanas o Doutor Edmon Gomes como novo gestor do HT.

A propósito do novo gestor

Só lembrando: se o gestor importado por RC for o mesmo Doutor Edmon de Duque de Caxias (RJ), aí é o caso de a gente se preocupar ainda mais com o futuro do HT.

Isso porque esse cidadão seria o mesmo que se encontrava presidente da Unimed Caxias quando essa empresa foi a pique e sofreu intervenção da Agência Nacional de Saúde, em 2008, para depois ser incorporada pela Unimed-RJ (do Rio de Janeiro, capital).

Vamos e venhamos, caríssimas e caríssimos leitores: não é todo mundo que consegue o feito de ver quebrar sob sua direção uma Unimed, que em quase todo canto é referência de sucesso comercial.

Por essa e outras, fico preocupado em saber que um equipamento fundamental para a saúde coletiva da Paraíba está entregue a alguém com esse ‘perfil’, para usar termo do agrado do nosso secretário estadual de Saúde.

“Esperava tudo, menos…”

De um colaborador do qual devo preservar a identidade, em razão das perseguições e retaliações a que estão expostos aqueles que ousam criticar o governo do Doutor Ricardo Coutinho:

– Terceirização de serviço público = “racionalização dos custos” = demissão. É algo tão previsível quanto um cálculo matemático. E isso deve ser só o começo. Vamos observar os cortes no que diz respeito aos custos do atendimento, que certamente também ocorrerão. Enfim, meu caro, a terceirização do HT é mais um ato de desumanidade que comete RC. Eu esperava tudo, menos que o atual governo, em nome da economia de gastos, possa atentar contra a saúde pública, especialmente num hospital tão vital aos paraibanos, ricos e pobres.

O povo quer saber

Por que a Justiça da Paraíba submete-se a tamanha humilhação e permite tamanha subtração de seus recursos, que já somaria mais de R$ 20 milhões?