Por que importar médicos?

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Nonato Guedes

Acho um equívoco essa ideia do governo federal de importar médicos de outros países para atuarem no Brasil. O pretexto é o de que médicos brasileiros não querem trabalhar em Postos de Saúde da Família ou nas periferias das cidades, em programas de atenção básica. O que tenho visto é o contrário. Conheço médicos que fecharam seus consultórios na capital e se abalaram para longínquas cidades do interior paraibano na tentativa de sobreviver mais condignamente porque não são estimulados pelo poder público, enquanto seus consultórios viviam às moscas. Um deles, pediatra conhecido na roda de jornalistas, até parece que está residindo em cidades sertanejas, tão raras são as suas aparições na capital, o que motivou protestos da turma boêmia que com ele dividia as noites de lazer depois dos plantões exaustivos que era obrigado a cumprir para fazer jus a um adicional no bolso.

É lamentável que num governo de sensibilidade como o da presidente Dilma Rousseff (para ela, eu tiro o chapéu), prospere a visão de que profissionais da medicina formados por faculdades e universidades brasileiras não queiram se fixar nos postos de atendimento que funcionam como elefantes brancos, embora registrem um congestionamento de pacientes, alguns dos quais incluídos na chamada fila da morte, porque já se encontram em situação terminal e foram agendados para serem atendidos somente daqui a três, quatro, cinco meses. E o que dizer da infraestrutura dos hospitais da rede pública, em alguns casos da própria rede privada, em que falta tudo, em termos de equipamento, e falta, também, o incentivo traduzido em bons salários para quem se dedica a um sacerdócio?

A lógica dominante entre cabeças pensantes do governo Dilma de que importar é o que interessa fica enviesada se não for acompanhada de uma análise criteriosa das condições em que vive a saúde pública no Brasil. Quem pode dizer, de alto e bom som, que há investimentos concretos do governo federal e de governos estaduais e municipais, salvo honrosas exceções, na área da Saúde? Não sei, sinceramente, a quantas anda a qualidade do ensino que é ministrado nos cursos de medicina, mas constato que há profissionais do melhor nível e da mais absoluta competência, aqui mesmo em João Pessoa, sem falar em centros evoluídos que investem mais e melhor nos recursos indispensáveis a uma medicina prática, de resultados. Falou-se, inicialmente, na importação de médicos cubanos, a pretexto de que a medicina que se pratica na ilha é de excelência inequívoca. Uma inverdade, disseminada talvez para camuflar outros interesses, até escusos, não revelados.

A medicina em Cuba já foi padrão de referência mundial, nas primeiras décadas da revolução empalmada por Fidel Castro e que se perpetuou em ditadura, como foi denunciado no próprio Brasil pela blogueira Yoani Sánchez, vítima de hostilidades por parte de saudosistas empedernidos do castrismo em pleno território brasileiro. Lembro que, quando governador, o poeta Ronaldo Cunha Lima chegou a ir a Cuba e voltou animado com a perspectiva de adotar no Brasil a figura do “médico de família”. Uma figura que era bastante conhecida de nossos avós, porque já existiu no Brasil, e desapareceu, como costumam desaparecer as coisas boas, que dão resultados. Mas deixemos Cuba de lado.

Há avanços na medicina em outros países. Em 90, o meu amigo oftalmologista Astênio César Fernandes foi a Paris submeter-se a uma especialização, e de lá me escreveu correspondência, que mantenho arquivada, falando dos avanços da oftalmologia que pôde constatar. Como exemplo, citava que a oftalmologia do Hospital Hotel-Dieu, do professor Yves Pouliquen, era vanguarda dentro da Europa, principalmente no que se referia ao chamado segmento anterior do olho. Astênio teve a oportunidade de assistir um curso sobre a cirurgia refrativa, tendo por objetivo corrigir as ametropias. Mas o governo brasileiro não está interessado em importar médicos franceses porque eles custam caro e, afinal de contas, Paris é uma festa, não é mesmo?

Não há xenofobismo contra a presença de médicos estrangeiros no Brasil. O intercâmbio é fundamental para aprofundamento da formação dos nossos profissionais, para uma atualização sobre o que há de moderno na área. Mas, antes de trazê-los, vamos estimular os nossos médicos. Que o governo lhes proporcione condições e que invista na importação, aí sim, de tecnologias avançadas. Desvalorizar a prata de casa é um insulto a quem se esforçou para obter um canudo e não encontra vaga para exercer a profissão.