Pedindo perdão gera

POR RUBENS NÓBREGA

Agora não adianta mais, absolutamente nada, mas penso que todos nós deveríamos pedir perdão, no mínimo desculpas, ao gerente de uma agência do Banco do Brasil em Mangabeira, Capital, assaltada ontem pela manhã. A ele, à sua mulher e aos seus dois filhos (muito provavelmente menores de idade) que passaram pelo trauma mais angustiante de se verem rendidos e aprisionados dentro da própria casa, passando intermináveis horas sob a mira, a frieza ou a crueldade de bandidos.
Já vi esse filme de horror umas tantas vezes nesta cidade onde nasci e escolhi para viver o que me resta, mas me atemorizo cada dia mais com que o se passa em João Pessoa e no resto da Paraíba. Tanto que a cada dia cogito ir embora daqui, levando junto a família para não deixa-la exposta a tanta insegurança, a tanta violência facilitada pela incompetência de quem tem os meios para dar proteção a todos nós, porque de todos nós sai o dinheiro que lhe paga não apenas as mordomias, mas também a omissão e indiferença diante dos problemas dos governados.

Por essa e outros, entendo que devamos pedir perdão também, no mínimo desculpas, a todas as demais vítimas do terror continuado e crescente em nosso Estado. Mas o pedido pode ser feito apenas àquelas vítimas que conseguiram sobreviver aos assaltos, às armas de fogo que lhes encostaram na cabeça ou à faca-peixeira com que os meliantes lhes pressionaram as costelas ou a barriga, cenas que parecem incorporadas à rotina de toda a população, não importando se a pessoa atacada é pobre, rica ou remediada, como diziam antigamente.
Supliquemos ainda o perdão, no mínimo desculpas, a milhares de famílias enlutadas que perderam seus filhos, jovens em sua imensa maioria, nos grotões e periferias onde em cada cadáver encontrado, em cada corpo estendido no chão, como diz a canção, policiais que fazem a ‘ocorrência’ botam um carimbo de atesto, antes mesmo de qualquer perícia ou investigação, de que os mortos o foram por ligações com o tráfico de drogas. Ou, como falavam até bem pouco tempo, “foi briga de gangues”. Resultado: temos aí mais do que um atestado, temos uma justificativa. Que explica em certo grau e dimensão a baixíssima resolutividade da investigação policial, refletida nos inquéritos sobre crimes de morte onde não houve flagrante delito nem confissão.
Não é pra menos. Temos uma Polícia Civil onde o contingente, a maioria cansada de guerra e prestes a se aposentar, não chega a 2 mil servidores. E, se juntarmos aos 8 mil policiais da ativa, veremos que não temos nenhum motivo ou direito de cobrar deles o que não podem nos dar. Eles ganham muito aquém do que mereceriam e o despreparo óbvio da maioria deles vai muito além do que a gente possa imaginar. E o que a imaginação alcançar não surpreende porque nossos policiais obedecem às ordens de um governo que passou um ano inteiro para gastar R$ 3 milna qualificação de sua força pública, conforme dados levantados por auditoria do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Isso mesmo: três mil reais para treinamentos, cursos de especialização etc. de mais de 10 mil servidores (juntando policiais civis e militares).
Sendo assim, na verdade, em vez de criticar os chamados ‘homens da lei’, talvez fosse o caso de pedirmos perdão, no mínimo desculpas, também a eles. Começando pelo fato de que são poucos, como já vimos, e trabalham acumulados e sacrificados em escalas extenuantes, desumanizantes. Nas contas de Marcos Henriques, Presidente do Sindicato dos Bancários da Paraíba, a Paraíba tem pelo menos 7 mil homens a menos do que a Polícia Militar precisaria ter.

 

Defasagem evidente

Pra vocês terem uma ideia do que representa a defasagem na força policial da Paraíba, temos um PM para cada 418 habitantes, quando um para cada grupo de 250 viventes ou sobreviventes é o máximo recomendado por instituições internacionais acreditadas em matéria de segurança pública tratada com ciência, seriedade e competência.
À Hora da Verdade

Ouvi o dirigente sindical falando essas e outras coisas ontem à noite ao radialista Antônio Malvino, comandante do programa Hora da Verdade (Arapuan FM, de João Pessoa). Ao competente repórter e apresentador, Marcos Henrique lembrou também que já vamos em 70 ataques a bancos somente este ano e, não sabia, os ataques do gênero não param, mesmo o nosso Estado dispondo de uma lei de monitoramento que obriga os bancos a fortalecerem seus equipamentos e métodos de vigilância, aí incluída a eletrônica, através de câmeras de vídeo, alarmes etc.
Pelo visto, os bancos parecem estar nem aí. Tanto que a tal lei, aprovada e sancionada em fevereiro do ano passado, somente começou a ser implementada cinco ou seis meses depois. Mas nem os bancos obedeceriam nem o governo fiscalizaria. Imaginem, então, se os bandidos vão respeitar. De qualquer modo, desse fato podemos tirar lições ou conclusões. Podemos dizer, tranquilamente, que o fato é típico de um Estado onde sua gerência executiva tenta derrubar a criminalidade a golpes de estatísticas. Estatísticas quase sempre expostas com indisfarçável viés de propaganda, para melhorar a imagem do governante.
Mas nada apaga nem esconde as consequências, em especial as lembranças, de episódios malignos como esse que começou anteontem à noitinha e somente acabou na manhã dessa sexta, com a soltura da mulher e dos meninos do gerente. Ironicamente, trágica ironia, pertinho de um posto da finada Operação Manzuá, outro meio de defesa social desativadopelo governo que aí está. Diante do exposto, acho melhor é todo mundo se pedir perdão, no mínimo desculpas. Porque todos somos culpados ou responsáveis pelo governo que temos. Uns porque o escolheram; outros, feito este colunista, porque foram incompetentes e não souberam alertar com mais firmeza e eficiência para o desastre que seria tal escolha.