Os leitores, a seca e os deputados

Rubens Nóbrega

Prezado Jornalista, gostaria de abordar alguns assuntos que são ou foram manchetes recentes, começando pela Caravana do Deserto.

Muito embora prefira o filme “Ratos do Deserto”, confesso que fiquei comovido com a atitude dos nossos deputados, partindo para o ultra-árido para ver de perto o-quié-quia-seca-fez-e-faz. Demonstram, assim, boa intenção de resolver grave problema dos nossos conterrâneos, pois é muito triste ver crianças morrendo de fome e gado morrendo de sede.

No Alto-Sertão devem ter sentido na pele (literalmente) os efeitos da pior estiagem dos últimos 45 anos. Você já passeou dentro de uma terrina cheia de sopa? Eis a sensação térmica de quem habita por lá!

Pois bem, para ajudar os nossos legisladores fiz alguns cálculos (dizem que só engenheiros, matemáticos e urologistas são verdadeiros especialistas na matéria, mas também aprecio o exercício) que podem levá-los a uma atitude mais prática. Corrijam-me se eu estiver errado. Acompanhem-me.

O homem adulto necessita em torno de 3 litros de água/dia, para beber. Somando 9 para asseio pessoal e uns 3 litros para cocção de alimentos, isso dá uma necessidade diária de uns 15 litros/dia. Ou 450 litros/mês. Um carro-pipa transporta cerca de 5 mil litros d’água, que dão para 11 adultos beberem durante um mês. Dizem que cobram em torno de R$ 150 por viagem.

O salário de um deputado é de R$ 20.020,00, fora os babados. Deixemos os 12 salários. Os 13º, 14º e 15º salários somam, então, R$ 60.060,00. Ora, isso daria para cada deputado pagar em torno de 400 viagens de carros-pipa, o que garantiria aproximadamente 2.000.000 litros d’água, que sustentariam 4.444 pessoas por mês.

Considerando 36 o número de deputados estaduais, a Assembleia poderia, portanto, garantir a sobrevivência de 159.984 pessoas sedentas durante um mês, possibilitando que elas aguentassem até a chegada das chuvas anunciadas para janeiro.

Pronto. Está resolvido o problema da seca! Se quiserem.

Um forte abraço do amigo Ari Quintella.

 

Despreparo para a transposição

(Do Professor e Engenheiro Agrônomo Antônio Carlos Ferreira de Melo)

Prezado Rubens, tenho acompanhado e me preocupado com o desenrolar da polêmica em torno da chegada das águas do são Francisco aqui na Paraíba e em estados vizinhos, ação capaz de minimizar a sede do homem e dos animais, que estão sendo dizimados, em prejuízo cada vez maior da nossa combalida economia rural, que piorou e muito neste Governo.

Mas, Rubens, o que mais me preocupa mesmo é se as tão faladas águas chegarão no novo prazo (2015) anunciado pela Ministra Miriam Belchior (Planejamento). Se acontecer, poderemos ter situações bem mais calamitosas do que a própria seca, pelo simples fato de até o presente não ser vista uma só ação do governo estadual no sentido de preparar o povo e especialmente aqueles que irão fazer uso da irrigação.

Esse preparo não existe em nenhuma região a ser contemplada e em pouco tempo, com o uso indiscriminado da água, através de sistemas ineficientes teremos com certeza o desastre da lavagem e salinização dos poucos solos que nos restam para tal finalidade. E aí, autoridades, vamos ficar de braços cruzados assistindo à degradação do que nos resta? A esta altura do campeonato, já deveríamos ter nosso pessoal selecionado e treinado para tal fim. Isso não se faz da noite para o dia.
A mesma seca, outra assistência

(Do Professor e jornalista Arael Costa)

Caríssimo, li na coluna do Ancelmo Gois, em O Globo, que vamos doar 25 mil toneladas de arroz a Cuba. Abstraindo qualquer viés político e considerando apenas o aspecto humanitário, lamento, principalmente como nordestino, que tal procedimento não se dirija, primeiro, aos nossos conterrâneos que passam fome e sede, perdem gado, lavoura, outros poucos pertences e recebem uma assistência de merda (perdoe a inconveniência). Em outras eras o procedimento era outro.

Lembro bem que no Governo do Ministro José Américo tivemos uma seca semelhante, mas a assistência foi diferente. O governo federal logo mandou um carregamento de arroz e feijão para nosso Estado, que foi trazido para Cabedelo em navio transporte da Marinha. A carga, não sei se por deficiência do transporte ou por já estar armazenada em condições inadequadas por muito tempo lá pelo Rio de Janeiro, apresentou parte deteriorada, fato imediatamente denunciada pelo professor e médico Oscar de Castro, então diretor do Departamento Estadual de Serviço Social, órgão que coordenava a assistência aos flagelados. Ele se recusou a receber a doação.

A recusa repercutiu no sul do País, a partir de notícia que meu pai, José Ramalho, então correspondente local da agência de notícias Asapress, divulgou e gerou uma ameaça do então superintendente da Sunab, Benjamin Cabello, de processar Doutor Oscar e meu pai, por calúnia e por detratar um órgão governamental.

Tal ameaça não se tornou realidade, todavia, graças ao então deputado federal Carlos Lacerda e ao seu jornal, já às turras com o Presidente Getúlio Vargas, que assumiu a briga e a ampliou sensivelmente, gerando, para alguns analistas da época, fatos que terminaram por fazer com que Getúlio convocasse o Governador José Américo para ocupar o Ministério da Viação, então, órgão supervisor de todas as ações de combate às secas, notadamente através do Dnocs.