Gilvan Freire
Para que se possa explicar porque um certo governante tem mais poderes que outro, quando a instituição governamental é a mesma, é preciso compreender a natureza humana das pessoas. Ora, o governo é uma instituição milenar, e no correr dos tempos foi se aperfeiçoando de tal forma que na atualidade todo o mundo sabe o que pode ou não pode fazer um governante. É lógico que pode fazer tudo que a lei autoriza, e nada contra a literal disposição da lei. Ao que parece, só os governantes não sabem disso.
Quando o gestor público não tem apego à lei, ou porque desconhece a legislação, ou porque faz questão de ignorá-la, ou ainda porque se julga acima dela, os conflitos administrativos ficam inevitáveis. E os prejuízos já começam logo a partir do próprio ato de afronta à legislação cuja proteção é do superior interesse coletivo, além de outros danos materiais e imateriais que a prática ilegal quase sempre acarreta. No final, até o próprio administrador também paga, pois só raramente não responde por processos ou condenações judiciais.
Nos lugares mais civilizados do planeta, um administrador não briga com as leis que sabe ter de obedecer. Mas, mesmo assim, nações civilizadas como a Grécia, Itália, Espanha e Portugal, e civilizações milenares do Oriente, constituíram governos despóticos que não respeitavam as leis e ainda governavam impondo a todos a sua vontade como se fossem as leis gerais. No Oriente, em países mais velhos e culturalmente mais pobres, um ditador só é a lei e o juiz de todos. Esse é um risco histórico muito grande para qualquer povo em lugar qualquer da humanidade.
A ilha da fantasia pública
Na Paraíba de RC, dividida entre súditos bem-intencionados, outros subservientes, vários remunerados e muitos independentes e preparados para a resistência, se não houver cuidado a lei vai virar molambo e o governador será o juiz das instituições e do povo. E haverá até gente que achará tudo normal, contanto que leve vantagem. Sobre a ilegalidade e imoralidade da troca de feira do terreno público e o shopping assombração, faremos na terça-feira um questionário acusador para o qual não haverá respostas. É o fim moral do caráter público da administração e da demagógica, falsa e apelativa ‘prática republicana’. E haverá mais artigos.
Um exemplo de moralidade distante
Em São Paulo, Capital, a 2.727 quilômetros de João Pessoa, Capital da Paraíba, o prefeito Gilberto Kassab encaminhou à Câmara, mês passado, um Projeto de Lei, para alienar bem pertencente ao município, sem o disfarce da permuta. Veja-se, com especial atenção, a parte que está em negrito:
“PUBLICADO DOC 02/06/2011, PÁG 73
PROJETO DE LEI 01-00271/2011 do Executivo
(Encaminhado à Câmara pelo Sr. Prefeito com o ofício ATL 36/11).
“Dispõe sobre desafetação de área municipal e autoriza o Executivo a alienar, mediante licitação, na modalidade concorrência, imóvel situado entre a Avenida Horácio Lafer, a Rua Salvado Cardoso, a Rua Cojuba e a Rua Lopes Neto, Distrito do Itaim Bibi, Subprefeitura da Pinheiros. A Câmara Municipal de São Paulo DECRETA:
Art. 1o. Fica desincorporada da classe dos bens de uso especial e transferida para a classe dos bens dominiais a área municipal localizada na Avenida Horácio Lafer, a Rua Salvador Cardoso, a Rua Cojuba e a Rua Lopes Neto, Distrito do Itaim Bibi, Subprefeitura de Pinheiros.
Art. 2o. A área referida no artigo 1o, configurada no croqui 300608, do arquivo do Departamento de Gestão do Patrimônio Imobiliário, rubricado pelo Presidente da Câmara e pelo Prefeito como parte integrante desta lei, assim se descreve: área 1M, de formato irregular, com frente para a Avenida Horácio Lafer, confrontando, para quem de frente olha para o imóvel, pelo lado esquerdo, com a Rua Salvador Cardoso e, pelo lado direito, com a Rua Lopes Neto; deflete à direita em linha reta, confrontando com os lotes 27 e 33, e deflete à esquerda até a Rua Horácio Lafer, confrontando com o lote 33, e, pelos fundos, com a Rua Cojuba, delimitada pelo perímetro 1-2-3-4-5-6-8-10-12-14-13-16-17-18-19-20-24-25-29-30-33-34-38-39- 43-44-45-46-1, com aproximadamente 20.016,00m2.
Art. 3o. Fica o Poder Executivo autorizado a alienar, mediante licitação, na modalidade concorrência, a área de propriedade municipal de que trata esta lei.
Art. 4o. A área, cujo valor venal de referência calculado pela Secretaria Municipal de Finanças é R$ 38.018.442,00 (trinta e oito milhões, dezoito mil e quatrocentos e quarenta e dois reais) em maio de 2011, deverá ser avaliada pelo órgão competente da Prefeitura, à época da licitação, levando-se em conta as condições de mercado vigentes na ocasião.
Parágrafo único. No julgamento das propostas, deverá ser considerado o critério de maior vantagem econômica.
Art. 5o. As despesas decorrentes da execução desta lei correrão por conta das dotações orçamentárias próprias.
Art. 6o. Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação. Às Comissões competentes.”
Quanto valem certos homens?
Não há uma pessoa sequer na Paraíba, especialmente em João Pessoa, que não queira a construção de um shopping em Mangabeira, o bairro mais volumoso e o que mais cresce na Capital. Mas Ricardo Coutinho está insuflando a população, através de líderes comunitários de sua confiança e outros mediante recompensa do Erário, para atacar os que se põem contra a transação escusa entre o governo e Roberto Santiago, o RS. E o jogo é dizer que quem é contra a negociata, é contra Mangabeira. Enquanto isso, a corrupção vai se alastrando e enriquecendo todos os cúmplices e os complacentes, até que se esclareça tudo quanto está escorrendo pelos esgotos desse submundo. Não tardará e os coniventes terão vergonha do que disseram ou fizeram em defesa de um conluio explícito e escancarado que só não diminui aqueles que o contestaram. O tempo é padrasto para os que emprestam, vendem, alugam ou permutam a própria dignidade. Até terça-feira, pela manhã.