“Órfãos” de Agra podem embolar sucessão em JP

Nonato Guedes

Uma fatia expressiva do eleitorado de João Pessoa cogitava votar no atual prefeito Luciano Agra (PSB) para a reeleição este ano. Não vai dar, por razões conhecidas: Agra se retirou do páreo reclamando do jogo bruto da política, depois se arrependeu, estimulou movimentos para seu retorno, mas a vaga já tinha dona: Estelizabel Bezerra, que teve aval direto do governador Ricardo Coutinho. Independente de estar pontuando bem ou não em pesquisas de intenção de voto, é com Estela que o governador vai. Confia no impacto do “novo” e no seu próprio carisma para viabilizar esse projeto, que no frigir dos ovos seria de continuidade administrativa. Que ninguém ouse falar em substituição de Estelizabel. Será tido como desertor da cartilha ricardista, espécie de ímpio da crença na dinâmica política, na mutação das conjunturas. Qualquer percentual que Estela obtenha em pesquisas é lucro. Mas o governador não é fanático por pesquisas. Na sua lógica, números ínfimos devem ser lidos ao contrário, porque projetam crescimento.

Como o governador é dono da sua verdade, não da verdade dos outros, o que equivaleria a unanimidade, troféu que ele não persegue, há quem se sinta liberado, no próprio agrupamento que RC comanda, a fazer suas leituras individuais, apontar exegese diferente, ainda que ela tenha que ficar confinada entre quatro paredes para não despertar represálias. Pois o que se comenta, em algumas rodas, é que a retirada de Agra do páreo pode acabar favorecendo ao ex-governador José Maranhão (PMDB), que teoricamente estaria melhor posicionado do que o senador Cícero Lucena, do PSDB. Ou seja, já estaria havendo uma migração de votos na seara socialista para a alternativa Maranhão, mesmo que ele esteja sub judice porque precisa acertar as contas com a Justiça Eleitoral referentes à campanha ao governo em 2010, desaprovadas pelo Tribunal Regional Eleitoral. Por que Maranhão, e não Cícero, seria o donatário dos votos que estariam reservados para Agra? Porque encarna a oposição frontal a Ricardo, especialmente na área do funcionalismo público, muito sensível a maus humores palacianos. Cícero pode vir a pescar votos migratórios, mas já foi prefeito duas vezes, e também enfrenta pendências derivadas da Operação Confraria.
O jornalista Nonato Bandeira, ex-secretário de Comunicação do governador, poderia, dentro do PPS, galvanizar votos tangidos do projeto “Estelizabel”. Bandeira, contudo, não tem estrutura, segundo ele mesmo argumenta. Nem tem carisma popular para decidir uma parada acirrada como a que se avizinha. Por último, não assume, e nem poderia, uma linha de contestação a Ricardo, que lhe deu régua e compasso no serviço público. Se for para protestar e cristianizar Estelizabel, a opção é Maranhão. Poderia ser Luciano Cartaxo, pré-candidato pelo PT, mas é grande o contingente de antipetistas, e Cartaxo não tem garantia de apoios influentes no partido a que pertence. Maranhão aparece, então, como solução para a vindita contra o governo, até porque já enfrentou Ricardo em disputa eleitoral e perdeu. Cícero nunca se confrontou diretamente com Coutinho e preside um partido onde o senador Cássio Cunha Lima é aliado do governador. No PMDB pode haver resistência a Maranhão, mas em favor de outro peemedebista, diferentemente do PSDB e do PT.
Essa avaliação empírica não significa que JM possa ir dormir hoje à noite sonhando com um céu de brigadeiro, por não divisar ameaça alguma no horizonte que sobrevoa. Há a rejeição, e se for densa, pode anular o favoritismo. Uma das artimanhas que a política costuma pregar a candidatos que se julgam favoritos. Mas, levando-se em conta que o ricardismo não absorveu Estelizabel nem morre de amores por Bandeira, Maranhão passa a ser repositório do voto de reação. Precisaria, apenas, aprofundar o quanto antes o desfecho do “imbróglio” com a Justiça para pegar o manche com tranquilidade. Porque, se isto demorar, ele estará fadado a um acidente de percurso, tão fulminante que implodirá suas chances e a própria candidatura. As sinalizações projetadas deveriam ser motivos para gerar uma bolha de ruga inquietadora para o governador. Mas Ricardo é cabeça dura. Vai insistir no discurso da paciência para regar os girassóis. Pode acabar pagando caro para ver, mas está no seu direito de ser teimoso, até de brigar com os fatos ou de se considerar estrategista iluminado dotado de votos que se transferem por osmose. Este pode ser o seu planejamento. Que, por enquanto, não bate com o termômetro das ruas. O cidadão comum, que assiste bestificado ao espetáculo, tem uma saída apenas: aguardar a evolução dos fatos. Porque depende dele o processo que passa a ser desencadeado a partir de agora.