Rubens Nóbrega

Com o orgulho dos soberbos e a soberba dos poderosos, o governador Ricardo Coutinho cometeu no final de semana mais uma de suas deselegâncias (para não dizer grosseria) ao chamar o ex-governador José Maranhão de Matusalém.

Ao fazê-lo, contudo, não ofendeu apenas o adversário político, mas pelo menos 400 mil paraibanos que têm mais de 60 anos e, a julgar pelo que disse Sua Majestade, deveriam se recolher à inutilidade, à ociosidade, à senilidade, enfim.

A declaração desrespeitosa do governador merece firme repúdio. Não porque mirou em Maranhão, mas porque acertou em toda uma parcela cada vez mais significativa da população e frequentemente vítima de discriminações odiosas.

O que o governador disse não constitui propriamente uma novidade, todavia. Na campanha de 2010 ele e sua campanha já procuravam desqualificar o ex-aliado que virou adversário em razão da idade.

A fala agressiva durante convenção partidária de há pouco só veio a reforçar o estigma segundo o qual após certa idade a pessoa perde a faculdade para exercer seus direitos e está fadada à exclusão social, como se longevidade fosse castigo.

Ao chamar Maranhão de Matusalém, Ricardo ofendeu ainda a história de tantos outros expoentes políticos e intelectuais que contribuíram e ainda contribuem para o desenvolvimento social, político e cultural do nosso país.

Todos eles (citarei alguns a seguir) expõem pelo exemplo de vida e obra que o discurso do atrabiliário governante, além de politicamente incorreto, é perverso, injurioso e, sobretudo, ultrapassado. Envelhecido, portanto, no pior dos sentidos.
De Erundina a Niemeyer
Pra começar, esquece o governador, talvez, que uma das deputadas mais atuantes da Câmara Federal é a paraibana Luiza Erundina, coincidentemente estrela de primeira grandeza do partido de Ricardo Coutinho, o PSB.

Também ex-prefeita de São Paulo e ex-ministra da Administração, a mais famosa uiraunense do planeta vive a plenitude de sua capacidade e vigor políticos. Aos 78 anos. Alguns anos a mais que José Maranhão, registre-se.

E o que dizer de Oscar Niemeyer, hoje com 101 anos, que perto de completar um século de existência foi contratado pelo Ricardo então prefeito da Capital para fazer o projeto arquitetônico da Estação Ciência?

Nunca é demais lembrar, em acréscimo, que o advogado, jornalista, político e historiador Barbosa Lima Sobrinho aos 103 anos exercia o último e quarto mandato de presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI).

Não dá para não mencionar também o exemplo de Tancredo Neves, que aos 75 anos de idade elegeu-se de forma indireta Presidente para encerrar uma ditadura e restabelecer a democracia que repôs o direito ao voto livre e direto.


Tragédias eleitorais

Por essas e outras, a gente percebe que ultimamente o direito ao voto tem sido exercido de forma tão equivocada, mercê do dom de iludir de certos candidatos, talvez, que acabamos por eleger verdadeiras tragédias para nos governar.

Elegemos, inclusive, governos que em campanha se apresentaram como o novo e diferente, mas na prática, no curso do mandato, mostram-se tão anacrônicos e repulsivos quanto os conceitos que adota e os preconceitos que prometia combater.

Por todos esses motivos, devemos deplorar o ato ou a palavra de quem, em vez de criar, propor e apoiar políticas de defesa e promoção do idoso, publicamente deprecia o destino inevitável de todos nós.

Pra fechar: como ensina a sabedoria popular, “o idoso é uma ponte entre o passado e o presente, como o jovem é uma ponte entre o presente e o futuro. E é no presente que os dois se encontram”.
Preservando a autoria
O texto que vocês acabaram de ler (assim espero) não é meu. Dei apenas uns retoques. A base, estrutura, ideias e ideais nele contidos pertencem à excelente escrita e acendrada consciência cidadã de uma amiga e colega jornalista da mais alta qualidade.

Gostaria imensamente, mas não devo explicitar a autoria. A uma porque seguramente ela seria agredida pelos bajuladores do governador e injustamente acusada de estar a serviço de José Maranhão ou coisa parecida.

A duas porque o próprio Ricardo parece ter perdido por completo o respeito à crítica e a tolerância para com o diferente, o divergente.

Quando acontece isso a alguém que usa o poder da forma como ele vem usando, é um risco expor pessoas eventualmente impedidas de bater de frente com o poderoso por conta do emprego ou função que exercem.
Sugestão ao governador
Peça desculpas, Majestade, ou, então, com todo respeito, lembre-se de Dona Natércia antes de se referir de forma pejorativa aos mais velhos.