O rei da conversa mole

Rubens Nóbrega

Para livrar a própria cara e disfarçar a parte que lhe cabe no esvaziamento da Fundação de Ação Comunitária (FAC) e desmantelamento do Programa do Leite, o governador Ricardo Coutinho saiu-se com tremenda conversa fiada.

O monarca disse semana passada e repetiu ontem que mandou apurar desde 2011 o que voltou à pauta da mídia em 2012, mas por obra e graça de uma operação da Polícia Federal com o auxílio luxuoso da Controladoria Geral da União (CGU). Nada a ver com algum súbito ataque de republicanismo em pleno reino girassolaico.

Digo isso porque entre uma fala e outra do soberano, o Governo do Estado fez publicar nota oficial informando que instaurou em novembro do ano passado um inquérito para apurar desvios no Programa do Leite. Mas essa informação merece alguns reparos. Vejamos.

Em primeiro lugar, o tal inquérito, pelo que se deduz da leitura da nota do governo, foi na verdade solicitado pela Controladoria-Geral do Estado em 7 de novembro de 2011. Não foi uma determinação pessoal do absolutíssimo, portanto.

Além disso, ao procurar mostrar-se zeloso e diligente com a coisa pública fazendo menção ao inquérito, o nosso excelso deveria ter sido informado de que todo inquérito tem prazo para terminar e quem o preside, prazo para relatar conclusões e pedir as medidas judiciais cabíveis.

Assim, considerando que o inquérito em questão é policial, pela lei o delegado encarregado deveria tê-lo concluído em 30 dias, ou seja, em 7 de dezembro de 2011 ou, no máximo, admitindo-se que tenha pedido prorrogação, em 7 de janeiro deste ano ou outra data determinada por algum juiz.

Assim, ó, Imperador, não basta dizer que mandou apurar. Tem que prestar contas do apurado e das providências que tomou para além do que concluiu a autoridade policial. Do contrário, e a persistir nessa linha, mais um pouco e o rei da Paraíba também será conhecido como o rei da conversa mole.

O que muitos já sabem

Boa parte das pessoas de bem, bem informadas e conscientes da Pequenina já sabe que foi o atual governador quem esvaziou a Fac, a gestora do Programa do Leite, cortando-lhe drasticamente o custeio. De algo em torno de R$ 1 milhão que recebia por mês para se manter, de corte em corte a Fundação acabou em R$ 200 mil. O resto foi para o Empreender-PB, por determinação do supremo.

Pior ele fez com a fiscalização do programa, ao suspender o pagamento dos agentes sociais que trabalhavam na recepção e verificação da quantidade e qualidade do leite entregue pelos laticínios. Conforme revelou esta coluna nas edições de sexta e sábado últimos, após a entronização do Ricardus I o pessoal que fiscalizava o leite da Fac passou quatro meses sem receber uma ruela.

Desde o Cássio II, passando pelo Maranhão III, aqueles agentes sociais recebiam cerca de um salário mínimo pelo trabalho. Penalizados sob a ‘Nova Paraíba’, só voltaram a ver a cor do dinheiro em maio de 2011. Mesmo assim, em vez dos mais de 500 reais, passaram a receber apenas R$ 150. Com isso, o controle dançou e o leite da Fac azedou de vez, prejudicando milhares de pessoas carentes.

Pequeno produtor ao léu

Qualificadíssimo consultor da coluna para assuntos agropecuários mostrou ontem o quanto o desmonte do Programa do Leite prejudica os pequenos produtores. Se para quem recebe e consome o leite da Fac a questão é de segurança alimentar e nutricional, para quem produz e fornece leite de vaca ou de cabra para o programa a questão é de sobrevivência mesmo.

“São inúmeras famílias que insistem em permanecer no campo, todas pobres ou muito pobres habitando o semi-árido quase deserto, assim mesmo mantendo o potencial genético dos seus animais, um verdadeiro patrimônio conquistado heroicamente pelos nossos técnicos. O desmantelamento desse programa somado ao castigo da seca e à praga da cochonilha do carmim deverá provocar uma catástrofe de consequências imprevisíveis caso não se adote uma solução eficiente”, adverte o técnico.

Ele explica que a palma, vítima da praga da cochonilha, é a base da alimentação animal de todo o Cariri e Curimataú. A seguir, revela que “graças ao programa da Fac, a Paraíba é hoje o maior produtor de leite de cabra do Brasil, um dos poucos títulos positivos do Estado a nível nacional, talvez o único”. Mas, apesar de tudo isso, até agora não se ouviu o Ricardus I falar em socorro aos pequenos produtores de leite. Não há nada nesse sentido em qualquer plano de governo para suportar os efeitos da estiagem.

Nosso consultor lembra ainda que as denúncias atualmente em apuração foram feitas desde 2009 por Ruy Bezerra, secretário de Agricultura do Maranhão III. Os problemas foram levados à PF, CGU, Ministério Público Federal e ao Ministério do Desenvolvimento Agropecuário (MDA), que financia o Programa do Leite.

A todos esses órgãos o Doutor Ruy pediu providências para proteger o Programa do Leite, que nos cálculos do nosso precioso colaborador seria o responsável pela terceira maior fonte de renda de pelo menos 111 municípios paraibanos. Segundo estima, o leite só perderia para o Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e os proventos dos aposentados.