O Mensalão Digital

Por Rubens Nóbrega

Se não houver mudança radical no Supremo Tribunal Federal (STF) quanto à teoria do domínio do fato, que a maioria de seus ministros usou de forma controversa para condenar o ex-ministro José Dirceu, é quase certa a condenação do governador Ricardo Coutinho naquela Corte se, por conta do Jampa Digital, o monarca da Paraíba vier a ser julgado por Joaquim Barbosa e grande elenco.

Essa possibilidade ganhou muita força ontem, após anunciada a decisão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região de mandar para o Supremo o inquérito do Jampa, em razão do suposto envolvimento de Agnaldo Ribeiro no esquema que teria desviado recursos da Prefeitura de João Pessoa para financiar a campanha de Ricardo a governador.
Como Agnaldo é ministro de Estado e tem foro privilegiado, só pode ser julgado no STF. Com isso, lá serão julgados também todos aqueles enredados, enrolados ou enroscados nas conexões da Ideia Digital com a campanha majoritária do PSB da Paraíba em 2010, levantadas pela Polícia Federal e Controladoria Geral da União (CGU), posteriormente acatadas e reforçadas pelo Ministério Público Federal.

E foi graças a um pedido do MPF, formulado pelo brilhante Procurador Regional da República Domingos Sávio Tenório de Amorim, que o TRF-5 decidiu nessa quinta-feira remeter o já nacionalmente famoso escândalo paraibano às atenções e apreciações do Supremo, que no correr do processo muito provavelmente será coadjuvado por diligências complementares da Procuradoria Geral da República.
De modo que, caso aceitem julgar o atual Ministro das Cidades e, por arrasto, o governador Ricardo Coutinho, as togas mais reluzentes do Brasil dificilmente fugirão ao enquadramento do nosso monarca nos mesmos argumentos, ilações e inferências que serviram para enterrar a carreira política de Zé Dirceu.

Como todo mundo sabe ou recorda, o ex-todo poderoso chefe da Casa Civil no Lula I está na iminência do cárcere porque a maioria do STF entendeu que ele teria o domínio de todos os fatos relacionados à pretensa mesada que o governo do PT estaria pagando a diversos congressistas da própria base governista – incluindo petistas – para aprovarem matérias de interesse do Planalto.

Assim, tanto quanto Dirceu, por sua posição de comando e mando nessa história, Ricardo também teria o domínio de todos os fatos relacionados ao Jampa. Começando pelo fato de ele, então prefeito da Capital, concentrar o poder de nomear e definir as condutas dos idealizadores do projeto e operadores da respectiva licitação da PMJP que, segundo PF e CGU, foi toda dirigida para beneficiar a Ideia Digital.

 

O que diz o Procurador

Ao requerer a remessa do inquérito do Jampa ao STF, o Procurador Domingos Sávio antecipou muito claramente suas impressões de que o governador Ricardo Coutinho tinha, realmente, o domínio dos fatos. Vejam adiante como isso está evidente, de forma incisiva e clarividente, no pedido do MPF aprovado pelo TRF.
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Como se percebe dos autos, o Sr. RICARDO COUTINHO era o Prefeito Municipal da época, do mesmo modo como terminou como o grande beneficiário da maior parte dos recursos desviados, utilizados que foram na sua vitoriosa campanha ao cargo de Governador do Estado da Paraíba.

A propósito, dificilmente um Secretário Municipal tomaria a decisão de desviar um quantitativo de recursos no valor daquele ocorrido no caso concreto, para fins de campanha eleitoral, sem o sinal verde daquele que o nomeou, sendo mais fácil, inclusive, imaginar que o próprio detentor do cargo hierarquicamente inferior foi instado à sua obtenção por quem o nomeou, pois é o que comumente ocorre.
Reforça a grande possibilidade da participação do Prefeito Municipal, hoje Governador, no caso, o fato de que o atual Vice-Governador, RÔMULO GOUVEIA, negou qualquer ingerência sua na contratação do publicitário DUDA MENDONÇA, o que significa dizer que foi uma decisão de RICARDO COUTINHO.

Por outro lado, não dá para imaginar que o candidato não tenha noção de onde vêm os recursos para sua campanha, mesmo porque ninguém se aventura em uma candidatura dessa natureza sem que tenha um respaldo financeiro certo. Por outro lado, não dá para imaginar que alguém controle o pessoal da política, pois, e isso é o que normalmente acontece, o máximo que junto a ele se exerce é uma função de assessoria. Não há dúvidas de que controlam, ainda que algumas vezes queiram passar a ideia de que cometeram atos compatíveis com alguém que pode ser adjetivado de imbecil.
Mensalão no Jampa?

Algum leitor pode perfeitamente questionar porque usei a palavra mensalão no título. Digo-lhe que vai além da irrecusável analogia ou similitude que se estabelece entre os fundamentos jurídicos da sentença que mandou Zé Dirceu pra cadeia e aqueles que podem impor o mesmo triste destino a Ricardo Coutinho.
Mensalão, no Jampa, tem a ver com as tratativas – colhidas pela PF – entre dois envolvidos no esquema. Está lá, no relatório do Delegado: por i-meio, um assessor do vice Rômulo Gouveia pergunta a um dos sócios da Ideia Digital se a ‘parceria’ entre eles foi interrompida. Como quem reclama de corte não programado da propina regular que viria recebendo pelos relevantes serviços prestados à causa.