O discurso de Carminha

Por Rubens Nóbrega

No final da tarde do dia 24 de outubro último, na Sala de Sessões do Pleno, o Tribunal de Justiça da Paraíba prestou justíssima homenagem a dois dos seus mais extraordinários colaboradores: Robson de Lima Cananéa, Diretor Especial, e Maria do Carmo Cândido Moura, Gerente de Controle Interno.
Os dois foram homenageados logo após a abertura de um ciclo de conferências sobre questões da infância e adolescência, evento incorporado às comemorações pelos 122 anos do TJ. A solenidade foi prestigiada por ninguém menos que o ministro Francisco Falcão Neto, que ano passado exibiu a Paraíba ao mundo como lócus da maior concentração de juízes TQQs, aqueles que só trabalhariam nas terças, quartas e quintas-feiras.
E foi perante aquela autoridade, atual Corregedor Nacional de Justiça, xerife do não menos temido Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que uma voz ergueu-se em meio à gravidade solene do ambiente para fazer aquela que considero a mais lúcida e incisiva defesa dos juízes paraibanos face ao estigma de malandragem com que o ministro Falcão, querendo ou não, carimbou nossa magistratura.
A voz a que me refiro pertence à Doutora Maria do Carmo, ou melhor, muito melhor, a Carminha Moura, economista, professora aposentada da UFPB e desde sempre padrão de eficiência na elaboração ou gestão de qualquer orçamento público que lhe seja confiada. Pois bem, ao discursar em agradecimento à Medalha por Bons Serviços Prestados à Justiça Estadual, Carminha prestou o melhor serviço que alguém poderia à imagem do Judiciário da Paraíba neste momento.
Serviço esse que, espero, faça efeito em especial junto à cúpula do CNJ, que volta e meia divulga avaliações nada positivas do desempenho do nosso TJ e, por extensão, dos nossos magistrados. Afinal, Carminha foi muito feliz ao questionar os conceitos daquele órgão com fundamentos tão relevantes quanto seguros, quase irrespondíveis, diria. E tudo isso sem perder a elegância ou – vá lá! – a ternura respeitosa com que se dirigiu à constelação de estrelas da toga mais reluzente que podemos ter.
Na sequência, vou brindar os leitores com excertos do discurso de Carminha, uma peça que merece transcrição nos anais do Poder e definitiva inscrição na lembrança e reconhecimento daqueles que têm a sorte ou o privilégio do convívio pessoal ou profissional com o talento dessa mulher extraordinária. Leiam um pouco do que ela disse e entendam porque ao final do seu pronunciamento todos se levantaram para aplaudi-la.

 

A gestão pública não vê riscos

“A gestão de riscos é muito apropriada ao controle das empresas de capital aberto, difícil de implementá-la na maioria das instituições de Estado, pela própria natureza desse tipo de organização. Ainda mais aquelas que passaram por um longo período de crescimento, caso do Tribunal de Justiça da Paraíba e por isso não habituadas, não preparadas para o exercício interno da auditoria, do controle e de reconhecer prontamente os riscos iminentes a que podem estar sujeitas no dia a dia”.
Avanços que merecem registro

“Os jovens servidores agora recém-chegados não percebem. Mas tudo aqui está muito diferente hoje. São visíveis todas as melhorias, espaços e ambientes de trabalho, os bens materiais instalados são outros, a informática foi implantada, os salários, seja pelo seu valor nominal seja pelo seu valor real, foram elevados. Destaquem-se este recém-instalado Tribunal Pleno, os novos Fóruns, Cível, Criminal, Mangabeira, Bayeux, Corregedoria e Escola Superior da Magistratura, e outros, em comarcas distantes (…) Nada disso foi tão fácil como se imagina nem tão irresponsável como se pretende dizer. Exigiu, além do dinheiro, vontade e decisão política, ação permanente e imediata de Presidentes com mandatos tão curtos. Exigiu agilidade administrativa e gerencial, superação de etapas, sem descurar da ordem legal instituída. Não há casos esquisitos a considerar, apenas alguns descuidos próprios desses momentos de avanços”.


Efeitos da crise no orçamento

“O Brasil parece adentrar a fase descendente de mais um ciclo econômico e esta Casa não ficará isenta desses reveses. O nosso orçamento já vem sendo afetado. A proposta orçamentária para 2014, em poder do Parlamento Estadual, compromete 89,3% dos recursos a serem transferidos pelo Tesouro do Estado com pessoal, somados salários e remunerações, auxílio alimentação e de saúde. Risco ou problema, o seu controle está fora desta Corte. Uma desordem externa afeta a geração da receita pública diretamente ligada ao comportamento da economia. A escassez de recursos vem comprometendo negativamente a atividade fim do Judiciário Paraibano, aquela que chega à sociedade”.


Produtividade x sobrecarga

“Relatório recente do CNJ aponta a baixa produtividade dos magistrados pela elevada taxa de congestionamento de processos. Medida de produtividade é muito útil para revelar problemas de produção de bens e mercadorias. Complica quando aplicada à produção intelectual. O relatório do CNJ é um documento genérico. Além de não se referir a essa natureza específica, não fala da sobrecarga de trabalho dos magistrados nem dos servidores diretamente envolvidos nessa atividade”.