O direito à saúde e a presença dos médicos estrangeiros

Marcos Pestana

Qualquer pesquisa de opinião pública demonstra que o acesso à saúde de qualidade é o principal problema do país na visão da maioria dos brasileiros.  A pesquisa Datafolha, feita nos dias 27 e 28 de junho, confirmou essa realidade. Em resposta espontânea e única, 48% dos brasileiros elegeram a saúde como prioridade número um. Léguas à distância vieram educação (13%), corrupção (11%) e violência e segurança pública (10%).

O Brasil fez uma aposta ousada e generosa em 1988.  O SUS deveria oferecer acesso universal e integral de qualidade como direito de cidadania.

Muitos anos se passaram. Vinte e cinco anos depois o SUS entra em seu período de maturidade exibindo avanços inegáveis, sucessos relativos, gargalos visíveis, demandas crescentes e insatisfações represadas.

Vivemos nesta abertura de século XXI uma combinação explosiva: direitos amplos, recursos escassos, judicialização extrema, custos crescentes, gestão ainda insuficiente.

Não há como negar, o problema central é o subfinanciamento da saúde pública. Investimos, no Brasil, menos que países latino-americanos e muito menos que os países avançados e que a própria saúde complementar do Brasil.

Diante dos protestos de rua, o governo Dilma sacou uma suposta solução mágica para os males do SUS: importar médicos. A polêmica se instalou. O déficit de médicos é real. Temos 1,8 profissionais para cada mil habitantes. Enquanto isso, México tem 2, Reino Unido 2,7, Argentina 3,2, Portugal 3,9, Espanha 4 e Cuba 6,7.

A entrada de médicos estrangeiros tem que ser abordada sem corporativismo, sem xenofobia, sem açodamento ou viés ideológico.

Muitas vezes, os vazios assistenciais em regiões pobres e distantes se devem à precarização do trabalho médico, à falta de carreiras estruturadas e de condições dignas de trabalho. É preciso formar mais profissionais, descentralizar as escolas de medicina, estruturar uma carreira nacional do SUS, introduzir incentivos para a interiorização, apostar nas estratégias de telemedicina e educação permanente à distância.

Enquanto as medidas estruturantes de longo prazo não são tomadas ou não surtem efeito, não há mal em contarmos com apoio de médicos estrangeiros. Tendo claro que esta questão não é mais importante do que a do subfinanciamento. O mesmo governo que derrotou os 10% das receitas federais para a saúde é quem alardeia a importação de médicos como medida salvadora para todos os males do SUS.

Defendo a necessidade obrigatória da revalidação dos diplomas, como garantia da qualidade no atendimento, e a preferência para os médicos brasileiros. E em contraposição a medidas improvisadas, demagógicas e paliativas, como a surpreendente proposta de extensão por mais dois anos do curso de medicina, creio que temos que apostar em soluções definitivas, como a estruturação da carreira nacional do SUS, a organização de verdadeiras redes assistenciais integradas e a aprovação imediata dos 10% dos recursos federais para a saúde.