MP tenta botar ordem na carteira de estudante

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Rubens Nóbrega

Pela primeira vez na história do polêmico e milionário comércio de carteiras estudantis na Capital é possível que tenhamos este ano, enfim, uma intervenção efetiva do Ministério Público e dos Procons que proporcione regras claras e valores aceitáveis em favor dos consumidores e pagantes do documento.

Quem reacende a esperança de dias melhores nessa relação de consumo é a Doutora Priscylla Maroja. Promotora de Justiça da Defesa do Consumidor, ela deve chamar o feito à ordem quando se reunir hoje à tarde, em João Pessoa, com dirigentes de entidades estudantis que confeccionam e emitem as cobiçadas carteirinhas e amanhã com os Procons do Estado e do Município.

As reuniões estão marcadas para 14h30 na Sede das Curadorias, conforme qualificado colaborador da coluna que acompanha essa questão de perto há muito tempo e até hoje não concebe o fato de a carteira de estudante ser emitida por número tão elevado de entidades e a preços flagrantemente abusivos.

“Em maio do ano passado, o Ministério Público abriu um inquérito civil público (de nº 1969/2012) e já então constatava que o custo de impressão do documento variava de R$ 2,50 a R$ 4,93, mas algumas entidades chegavam e ainda chegam a cobrar no mínimo três vezes mais aos estudantes por uma carteira”, informou.

Mas essa balbúrdia lesiva ao bolso do consumidor não é culpa apenas das entidades estudantis. O poder público contribuiu fortemente para a multiplicidade de fornecedores e de valores das carteiras desde 2004, quando a Câmara dos Vereadores da Capital aprovou e o então prefeito Cícero Lucena sancionou a Lei nº 10.416, de 30 de dezembro daquele ano.

Empoderando as empresas

De texto tão confuso quanto recheado de erros de português, talvez por ter sido feita às pressas (saiu no último dia do último mandato de Cícero na PMJP), a tal lei credenciou seis entidades e deixou a porteira aberta para um número indeterminado de outras que se apresentarem como Diretório Central de Estudantes (DCE).

Mais: onde não houver um DCE, assegura a lei, podem ser credenciados Diretórios Acadêmicos ou Centros Acadêmicos (DAs ou CAs). Detalhe: é um pra cada curso ou faculdade que venha a se constituir como tal. Com a expansão do ensino superior em escala geométrica, tanto na esfera pública quanto na particular, não há como saber onde isso vai parar.

Outro dado curioso: mesmo previsto em lei, o credenciamento não basta para que entidades como a velha União Nacional dos Estudantes (UNE) de guerra confeccionem e emitam carteiras válidas dentro dos ônibus da Capital. Elas têm que requerer uma certidão de habilitação à Associação das Empresas de Transporte Coletivo de João Pessoa – AETC-JP.

Não é só. Além de transferir para uma entidade privada prerrogativa de ente público, a lei assinada por Cícero também conferiu às concessionárias do transporte de massa em João Pessoa o mesmo poder de fiscalização do processo de confecção de carteiras que tem o Ministério Público, os Procons e as Secretarias de Educação do Município e do Estado.

Consenso que virou obstáculo

Se a Lei 10.416/2004 não for revogada ou adequadamente corrigida através de emendas criadas por outra, a impressão e venda das carteiras de estudante vai continuar uma bagunça, pelo menos em João Pessoa, cidade que possui o maior número de estudantes e escolas na Paraíba.

Sobretudo porque, já dizia Promotor de Justiça Raniere da Silva Dantas no Inquérito Civil 1969/2012, “na forma como a lei está escrita verifica-se que se criou um obstáculo, já que previu um ato somente possível mediante consenso”.

Ele se refere a um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) que deveria ser firmado pelas entidades estudantis perante o Ministério Público e Procons após todas as partes envolvidas definirem, consensualmente, não apenas o valor da carteirinha (com base em planilha de custos) como também os prazos de validade e condições de entrega do documento, entre outros critérios.

É muito fácil melar esse jogo

Responda rapidinho: você acha que as entidades estudantis, todas elas, têm interesse no consenso exigido pela lei? Particularmente, acredito que não. Afinal, se qualquer credenciada quiser melar o jogo é suficiente discordar, bater o pé e esconder a mão nos bolsos para não assinar o acordo, não viabilizar o TAC. Com isso, permanece tudo como está e sempre esteve, ou seja, do jeito que o diabo gosta.

Segundo a fonte da coluna, não houve TAC em 2012 e se for mantida a redação original da tal lei nenhuma conduta será ajustada este ano. Inclusive porque não cabe ao MP participar da definição de preço algum, outra incongruência contida na Lei 10.416/2004, que deve ter sua constitucionalidade questionada judicialmente pela Promotoria de Defesa do Consumidor. Afinal, essa lei deve ter sido e estar sendo muito boa para alguém, menos para o estudante.